Nova violência contra o direito à privacidade dos cidadãos
Por Darci Norte Rebelo (OAB-RS nº 2.437) e
João Guilherme Ness Braga (OAB-RS nº 29.520)
Após a revogação da Lei da CPMF, a União, por meio da Receita Federal, editou a Instrução Normativa RFB nº 802 pela qual iniciou um procedimento de regulamentação de legislação anterior acerca da obrigação de instituições financeiras prestarem informações semestrais da movimentação de pessoas físicas e jurídicas com valores mensais superiores a R$ 5.000,00 e R$ 10.000,00 - respectivamente.
O Conselho Federal da OAB, vendo nessa regulamentação um procedimento geral de quebra de sigilo, ajuizou ação direta de inconstitucionalidade em curso no Supremo Tribunal Federal, processada pelo rito sumário mas sem concessão de liminar. Após o ajuizamento da ação direta, a Receita Federal publicou nova Instrução Normativa RFB de nº 811, complementando a regulamentação anterior.
Nessa nova instrução normativa, a Receita instituiu a Declaração de Informações sobre Movimento Financeiro [DIMOF], estabelecendo que os dados de cada semestre de cada cidadão ou empresas que movimentem valores mensais superiores aos acima referidos, devem ser-lhe remetidos até o último dia útil do mês de agosto [período janeiro-julho] e os do segundo semestre, até o último dia útil do mês de fevereiro [período julho-dezembro].
Excepcionalmente, em relação ao primeiro semestre de 2008, a DIMOF poderá ser apresentada até 15 de dezembro de 2008.
Está em curso, portanto, um procedimento institucionalizado de quebra de sigilo bancário abertamente violador do devido processo legal [CF/88, art. 5º, LV] e do art. 5º , inc. X e XII, da Carta, normas que protegem a intimidade das pessoas e a privacidade dos dados relacionados à vida dos cidadãos. No caso da Advocacia, os montantes mensais da conta-corrente dos advogados nem sempre revelam a titularidade dos valores em circulação, muitos deles pertencentes a clientes e apenas em trânsito pela conta do profissional.
Com a DIMOF, a Receita pode instaurar processos investigatórios e auditorias, o que, no caso da Advocacia, poderá gerar problemas interferentes com o dever de sigilo profissional acerca da origem e destinação de valores, afetando a essência da profissão, sua independência e a confiança que está na base da contratação profissional.
Para o cidadão em geral é mais um procedimento autoritário que invade o seu direito à privacidade no qual se inserem a proteção aos dados financeiros de sua vida pessoal e profissional. Trata-se de uma devassa geral na vida privada, ofensiva de diversos valores constitucionais, entre eles o da dignidade das pessoas e até mesmo o devido processo legal [CF/88, art.5º, LIV].
A ADI proposta pelo Conselho Federal pode levar vários meses ou até anos para ser julgada, apesar do rito sumário que lhe foi atribuído, assim como outra, da Associação dos Profissionais Liberais do Brasil, ambas sem liminar. De outro lado, essas medidas foram ajuizadas antes da edição da Instrução Normativa nº 811 que instituiu a DIMOF através da qual o controle da vida dos cidadãos passará a ser efetivamente concretizada.
Essas circunstâncias aconselham que, paralelamente à oportuna ação do Conselho Federal, as demais entidades da sociedade civil se movimentem no mesmo sentido da condenação dessa nova violência contra o ´right of privacy´ dos cidadãos.
(*) E.mail: darci@norterebelo.com.br
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14.04.2008
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