Anúncios


Mostrando postagens com marcador Crimes contra a Administração da Justiça. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Crimes contra a Administração da Justiça. Mostrar todas as postagens

quarta-feira, maio 14, 2008

Íntegra da decisão do desembargador Caio Canguçu de Almeida que negou o pedido de habeas corpus apresentado pela defesa de Alexandre Nardoni e Anna Carolina Jatobá :: Jurid Publicações Eletrônicas ::

 

Íntegra da decisão do desembargador Caio Canguçu de Almeida que negou o pedido de habeas corpus apresentado pela defesa de Alexandre Nardoni e Anna Carolina Jatobá


PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
Habeas Corpus nº 1.222.269.3/9


Visto.


1 - Os bacharéis Marco Polo Levorin, Rogério Neres de Sousa e Ricardo Martins de São José Júnior, advogados inscritos, respectivamente, sob os números 120.158, 203.548 e 263.126, impetram a presente ordem de 'habeas corpus' em favor de Alexandre Alves Nardoni e Anna Carolina Trotta Peixoto Jatobá, visando pôr fim a constrangimento ilegal a ambos imposto pelo Meritíssimo Juiz de Direito da Segunda Vara do Júri da Capital, representado, no dizer deles, por inadequada e imerecida decretação da prisão preventiva dos pacientes, que estão denunciados como supostos autores de homicídio qualificado capitulado no art. 121, § 2º, incisos III, IV e V, do Código Penal, assim como de fraude processual tipificada no art. 347, § único, do mesmo diploma repressivo. Tudo porque, segundo a peça inicial acusatória, teriam matado a menor Isabella de Oliveira Nardoni, para o que se valeram de meio cruel, usando recurso que impossibilitou a defesa da vítima e para assegurar a ocultação ou impunidade de outro crime, ato ao qual se seguiu, por fim, alteração por eles promovida no lugar e de coisas para com isso induzir em erro aqueles que haveriam de investigar e elucidar a ocorrência.
Segundo os impetrantes, a autoridade judiciária coatora, sobre decretar a custódia em desacordo com as exigências impostas para sua viabilidade pelo art. 312, do Código de Processo Penal, eis que ausentes os pressupostos que poderiam legitimar a constrição - garantia da ordem pública, conveniência da instrução criminal e assegurar a aplicação da lei penal - fê-lo recebendo a denúncia mediante prematuro juízo e antecipado julgamento do mérito da causa, postura que impõe a anulação do ato de admissibilidade da ação penal. Postulam, então, que aquilo que pleiteiam seja deferido em julgamento liminar, eis que presentes o 'fumus boni iuris' e o 'periculum in mora', a par da evidente desnecessidade da medida ora hostilizada, porquanto os pacientes em nenhum instante dificultaram ou comprometeram a atividade da autoridade investigadora e muito menos o farão no curso da instrução processual, onde anseiam provar sua inocência sempre sustentada.


2 - Pesem, porém, as alentadas argumentações trazidas pelos impetrantes, e sem que a decisão aqui proferida implique em contradição com o que ficou assentado quando da medida liminar deferida para o fim de revogar a prisão temporária imposta aos então investigados, eis que naquela oportunidade faziam-se claramente ausentes os requisitos impostos pela lei nº 7.960/89 para legitimar a custódia, pese, não obstante tudo isso, por aqui não é caso de antecipado e liminar deferimento da ordem reclamada.
Em sede de 'habeas corpus', não tendo previsão legal a concessão de liminares, mas admitidas que estão elas, hoje, por definitiva e sensata construção pretoriana, para seu excepcional deferimento contra ato de autoridade competente, faz-se imperiosa, sem margem para dúvidas ou inquietações, a ausência dos pressupostos que autorizam, em tese, o constrangimento que se venha impor a qualquer pessoa. Faz-se necessário que, de forma cristalina e evidente, reconheça-se, por exemplo, que a liberdade do agente não implica em ofensa à ordem pública, em risco para a instrução processual ou para a garantia de aplicação da lei penal. Tal, aliás, como acontecia ao ensejo daquela decisão que deferiu liminar para a revogação da prisão temporária imposta aos mesmos pacientes, que aqui novamente se apresentam como tal, mas sem que se vislumbre, desta feita, ao menos até agora, induvidosa e ilegal afronta ao direito de ir e vir que desejam ver novamente restaurado.
A esse respeito, aliás, é muito firme a jurisprudência, inclusive dos tribunais superiores, onde sempre se reconheceu que "a concessão de liminar em 'habeas corpus' para sustar a marcha do processo criminal exige a visualização de pronto dos pressupostos autorizativos (relevância e periculum in mora) da medida, sob pena de indeferimento" (STJ - 6ª Turma - Ag Reg no HC 6068 - rel. Min. Fernando Gonçalves), ou que "a liminar em sede de 'habeas corpus' é medida excepcional, admitida tão somente pela doutrina e jurisprudência e sem dispensa da satisfação cumulativa dos requisitos do 'fumus boni iuris' e do 'periculum in mora' (STF - 6ª Turma - HC 22.059, rel. Min. Hamilton Carvalhido).
Vale dizer, pois, em face do caso concreto de que aqui se cuida, que a concessão de liminar, para o fim de restabelecer a liberdade dos pacientes presos preventivamente por força de decisão judicial largamente fundamentada e que diz respeito a crime gravíssimo praticado com características extremamente chocantes, e onde, após toda a prova colhida, sobressaem inequívoco reconhecimento de indícios de autoria e prova da materialidade da infração, tal concessão liminar, repita-se, apenas se justificaria se ao julgador fosse dado visualizar, de pronto, de forma clara, até gritante, que, hoje, não se fazem presentes os pressupostos autorizadores dela. Pressupostos que, por aqui, para desdita dos pacientes, com satisfatória evidência nos autos, receberam expressa e adequada invocação por parte do magistrado. Fazia-se mister, em suma, para atendimento liminar da pretensão deduzida, que dados sugestivos, muito precisos, quase incontestáveis, evidenciassem uma intolerável injustiça que estaria representando a constrição antecipadamente imposta aos acusados, o que não parece estar acontecendo, já que as circunstâncias indicam sintomático comprometimento dos pacientes com a autoria do inacreditável delito.
O que se reconhece, então, é que, se não prospera a alegação de prejulgamento que se disse conter o despacho de recebimento da denúncia, onde as observações feitas pelo magistrado, freqüentes e usuais em despacho de admissão da ação penal, não sugerem uma prematura afirmação de autoria ou de dolo, de outra parte as ilegalidades apontadas pelos impetrantes a propósito da inconveniência da decretação da prisão preventiva, reclamam estudo mais acurado do contexto probatório, o que não se mostra adequado ao âmbito restrito e de cognição sumária do remédio heróico. Especialmente em sede de medida liminar, se a decisão que decretou a prisão preventiva dos pacientes, como dito, está largamente fundamentada e se nela, reclamando por certo, cuidadosa investigação sobre sua realidade, o magistrado aludiu, fundado em detalhes razoavelmente sugeridos pelo processo investigatório, não só a possíveis tentativas, por parte dos pacientes, de descaracterização das provas, a eventual comprometimento da instrução e até a risco para a ordem pública, o que todo o alarme gerado pela ocorrência, em verdade está mostrando efetivamente possível.


3 - Denego, por tudo isso, a medida liminar pleiteada.


4 - Requisitem-se informações à autoridade coatora e, a seguir, dê-se vista à Procuradoria Geral da Justiça.


Int.
São Paulo, 13 de maio de 2008
Des. Canguçu de Almeida
Relator

:: Jurid Publicações Eletrônicas ::

 

 

sexta-feira, outubro 05, 2007

Segredo guardado

Fonte: Consultor Jurídico


Segredo guardado

Sigilo em delação premiada não pode ser quebrado

 

por Maria Fernanda Erdelyi

 

O sigilo em casos de delação premiada não pode ser quebrado, mesmo que os acusadores e autores do acordo sejam supostamente vítimas no mesmo processo. Mas a defesa pode saber o nome de quem participou dos acordos de delação. O entendimento começou a ser firmado, nesta terça-feira (18/9), na Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal. Por três votos a um, a Turma acompanhou o entendimento do ministro Ricardo Lewandowski. O julgamento não foi concluído porque o ministro Marco Aurélio pediu vista.

 

Os ministros apreciaram Habeas Corpus em favor do advogado e ex-conselheiro da estatal Itaipu Binacional, Roberto Bertholdo, condenado pelos crimes de interceptação telefônica ilegal e exploração de prestígio. Ele também é acusado de tráfico de influência junto à CPMI do Banestado e constrangimento ilegal.

 

Com o pedido, a defesa de Bertholdo pretendia ter acesso ao acordo de delação premiada que embasou quatro ações penais que ele responde na Justiça. A defesa argumenta que o acesso permitiria apurar eventual nulidade dos acordos, na medida em que foram pactuados com procuradores da República e um juiz federal que seriam ao mesmo tempo acusadores/julgadores e vítimas dos grampos telefônicos. Argumenta, ainda, que desconhece o teor dos acordos firmados entre o Ministério Público Federal e os delatores (o ex-deputado paranaense, Antônio Celso Garcia; o ex-sócio de Bertholdo, Sérgio Renato Costa Filho e Sérgio Rodrigues de Oliveira). Para a defesa, houve ofensa aos princípios do contraditório e da ampla defesa.

 

Segundo o ministro Lewandowski, relator do Habeas Corpus, tem fundamento a suspeita em relação à falta de isenção necessária dos procuradores nos acordos de delação premiada usados nas ações movidas contra Bertholdo. “Certo está que os Procuradores da República que subscreveram as denúncias também foram, em tese, vítimas do paciente, sendo razoável supor a hipótese de que eles também firmaram os tais acordos, em indesejável coincidência dos papéis de acusador e vítima”, reconheceu o ministro.

 

Mesmo assim, Lewandowski manteve o sigilo sobre os acordos de delação. “Não vislumbro, todavia, motivo para decretar a publicidade dos acordos de delação premiada, cujo sigilo lhe é ínsito, inclusive por força de lei”, afirmou.

 

Ele ressaltou que um procurador da República, vítima de um delito, não pode atuar no processo como acusador de seu algoz. Mas entendeu que a defesa pode saber quem participou da confecção e homologação dos acordos, sendo pública e notória a condição dos delatores. Ele determinou "à Secretaria da 2ª Vara Federal Criminal de Curitiba que certifique quais foram as autoridades, judiciárias e do Ministério Público Federal, responsáveis pela homologação e propositura dos acordos de delação premiada firmados pelos delatores".

 

Também votaram pela concessão da ordem os ministros Carlos Ayres Britto e Carmen Lúcia. O ministro Carlos Alberto Menezes Direito negou o pedido. Ele foi o único a divergir do relator. Para Direito, o acordo de delação premiada não é meio de prova, mas apenas um instrumento para que as pessoas possam colaborar com as investigações criminais. Dessa forma, impedir o acesso da defesa a esse acordo não pode ser considerado como violação aos princípios do contraditório e da ampla defesa.

 

Segundo o ministro, se a Justiça começar a abrir exceções quanto ao instituto da delação premiada, há o perigo de se inviabilizar o sistema. “Senão daqui a pouco ninguém mais vai querer participar deste tipo de acordo”, concluiu Menezes Direito.

 

Caso Banestado

Bertholdo foi denunciado pelo Ministério Público Federal pela prática de crime de interceptação telefônica, por 41 vezes. Em outra denúncia, o MP lhe atribuiu o crime de tráfico de influência, por duas vezes. Parte do conjunto de provas utilizadas pelo MP foi coletada pelo juiz federal Sérgio Moro, que autorizou diversas medidas de investigação na vida pessoal e nas empresas do acusado, como interceptações telefônicas, quebra do sigilo bancário, escutas ambientais em áudio e vídeo. Sérgio Moro seria uma das supostas vítimas de interceptação telefônica esquematizada por Bertholdo.

 

Condenado em uma das ações penais, teve a prisão preventiva decretada “para garantia da ordem pública”, em outubro de 2005. Seu pedido de liberdade foi negado pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Os magistrados discordaram do argumento da defesa de que o juiz federal estaria impedido de autorizar a investigação por ser suposta vítima do crime de interceptação telefônica.


Leia a íntegra do voto do ministro

HABEAS CORPUS 90.688-5 PARANÁ

RELATOR: MIN. RICARDO LEWANDOWSKI

PACIENTE(S): ROBERTO BERTHOLDO

IMPETRANTE(S): ANDREI ZENKNER SCHMIDT E OUTRO (A/S)

COATOR(A/S)(ES): SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

EMENTA: PENAL. PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. ACORDO DE COOPERAÇÃO. DELAÇÃO PREMIADA. DIREITO DE SABER QUAIS AS AUTORIDADES DE PARTICIPARAM DO ATO. ADMISSIBILIDADE. PARCIALIDADE DOS MEMBROS DO MINISTÉRIO PÚBLICO. SUSPEITAS FUNDADAS. ORDEM DEFERIDA NA PARTE CONHECIDA.

I – HC parcialmente conhecido por ventilar matéria não discutida no tribunal ad quem, sob pena de supressão de instância.

II – Sigilo do acordo de delação que, por definição legal, não pode ser quebrado.

III – Sendo fundadas as suspeitas de impedimento das autoridades que propuseram ou homologaram o acordo, razoável a expedição de certidão dando fé de seus nomes.

IV – Writ concedido em parte para esse efeito.

 

R E L A T Ó R I O

O Sr. Ministro RICARDO LEWANDOWSKI: - Trata-se de habeas corpus impetrado por Andrei Zenkner Schmidt, Cezar Roberto Bitencourt, Débora Poeta Weyh e Gabriela Nehme Bemfica em favor de ROBERTO BERTHOLDO, contra decisão proferida pela 5ª Turma do Superior Tribunal de Justiça no HC 59.115/PR.

A decisão atacada possui a seguinte ementa (fl. 24):

“HABEAS CORPUS. PEDIDO DE ACESSO A AUTOS DE INVESTIGAÇÃO PREAMBULAR EM QUE FORAM ESTABELECIDOS ACORDOS DE DELAÇÃO PREMIADA. INDEFERIMENTO. SIGILO DAS INVESTIGAÇÕES. QUESTÃO ULTRAPASADA. AJUIZAMENTO DE AÇÕES PENAIS. ALGUNS FEITOS JÁ SENTENCIADOS COM CONDENAÇÃO, PENDENTES DE JULGAMENTO DE APELAÇÕES. FALTA DE INTERESSE. MATERIAL QUE INTERESSAVA À DEFESA JUNTADO AOS AUTOS DAS RESPECTIVAS AÇÕES PENAIS. FASE JUDICIAL. MOMENTO PRÓPRIO PARA O CONTRADITÓRIO E A AMPLA DEFESA. AUSÊNCIA DE ILEGALIDADE.

1. Se havia algum interesse dos advogados do réu no inteiro teor das declarações prestadas pelos delatores na fase preambular meramente investigatória, ele não mais subsiste neste momento processual, em que já foram instauradas ações penais – algumas delas até sentenciadas e com apelações em tramitação na correspondente Corte Regional – porque tudo que dizia respeito ao paciente, e serviu para subsidiar as acusações promovidas pelo Ministério Público, foi oportuna e devidamente juntado aos respectivos autos. E, independentemente do que fora declarado na fase inquisitória, é durante a instrução criminal, na fase judicial, que os elementos de prova são submetidos ao contraditório e ampla defesa, respeitado o devido processo.

2. Além disso, conforme entendimento assente nesta Corte, ‘o material coligido no procedimento inquisitório constitui-se em peça meramente informativa, razão pela qual eventuais irregularidades nessa fase não tem o condão de macular a futura ação penal’ (HC 43.908/SP, 5ª Turma, de minha relatoria, DJ 03/04/2006).

3. Ordem denegada.”

Narram os impetrantes, em síntese, que o paciente responde a quatro ações criminais, nas quais foi utilizado material colhido por decorrência da homologação de acordos de delação premiada (fl. 03).

Dizem, mais, que a defesa desconhece o teor dos acordos firmados entre o Ministério Público Federal e os delatores (fl. 08).

Informam, ainda, que pleitearam o acesso a tais documentos, mas que os pedidos nesse sentido vêm sendo reiteradamente indeferidos desde a primeira instância (fl. 09).

Sustentam, em suma, que houve ofensa aos princípios do contraditório e da ampla defesa, uma vez que não teriam sido assegurados ao paciente os meios e recursos a eles inerentes (fl. 12).

Alegam, mais, que a impetração trata do “direito fundamental de o paciente ter acesso às provas que embasam as imputações penais que lhe foram feitas” (fl. 14).

Aduzem, também, que o acesso ao teor dos acordos de delação premiada é a forma de que dispõe a defesa para aferir os limites de atuação dos representantes do Ministério Público e do Poder Judiciário, já que a principal tese da defesa, suscitada em preliminar, relaciona-se “à nulidade absoluta e integral de todo o processo (...), tendo em vista que baseado em provas produzidas por Procuradores da República suspeitos e acolhidos por Juiz Federal suspeito” (fl. 15).

Acrescem, ainda, que parte dos Procuradores da República que ofereceram três denúncias contra o paciente foram vítimas do fato a ele imputado em ação que as precede.

Argumentam, além disso, que os documentos fornecidos por um dos delatores ao Ministério Público Federal não foram juntados aos autos, o que geraria a nulidade de toda a prova, inclusive daquela obtida por derivação (fl. 16).

Dizem, ademais, que houve violação à garantia do duplo grau de jurisdição, haja vista que a supressão do acesso ao teor dos acordos acaba por impedir que se verifique a validade formal e material destes nas distintas fases do processo (fls. 18 e 19).

Asseveram, por fim, que os pacientes “buscam demonstrar que o magistrado que teria sido vítima do crime imputado ao paciente – interceptação telefônica não autorizada – foi responsável pela produção de todas as provas que acabaram redundando em sua condenação” (fl. 22).

Em face do exposto, requerem a concessão da ordem para que se assegure aos defensores do paciente o acesso aos processos 2004.70.00.043116-0 (delação de Antônio Celso Garcia), 2005.70.00.29677-6 (delação de Sérgio Renato Costa Filho) e 2005.70.00.029678-8 (delação de Sérgio Rodrigues de Oliveira), ou, alternativamente, que a 2ª Vara Federal Criminal de Curitiba/PR certifique quais foram as autoridades, judiciárias e do Ministério Público Federal, responsáveis pela propositura e homologação dos acordos de delação premiada (fl. 23).

O Ministério Público Federal, por meio do parecer de lavra do Subprocurador-Geral da República Wagner Gonçalves, opinou pelo conhecimento parcial do habeas corpus, pois a autoridade impetrada não analisou o pedido quanto à delação de Sérgio Rodrigues de Oliveira, e, no mérito, pelo improvimento da ordem (fls. 552-569).

É o relatório.

 

V O T O

O Sr. Ministro RICARDO LEWANDOWSKI (Relator): Busca o impetrante, em síntese, ter acesso aos acordos de delação premiada que o Ministério Público promoveu com Antônio Celso Garcia, Sérgio Renato Costa Filho e Sérgio Rodrigues de Oliveira, os quais teriam possibilitado a promoção, contra o paciente, de quatro ações penais.

Entendem, em síntese, que a manutenção do sigilo em relação a tais acordos violaria as garantias do contraditório e da ampla defesa, bem como a do duplo grau de jurisdição.

Para o que interessa ao deslinde da presente questão, a delação premiada constitui um meio de prova introduzido na legislação brasileira por inspiração do sistema anglo-saxão de justiça negociada.

Nele, por força de lei, o delator compromete-se a colaborar “efetiva e voluntariamente com a investigação e o processo criminal, desde que dessa colaboração tenha resultado: I – a identificação dos demais co-autores ou partícipes da ação criminosa; II – a localização da vítima com a sua integridade física preservada; III – a recuperação total ou parcial do produto do crime” (art. 13 da Lei 9.807/99).

A delação premiada constitui, pois, elemento de prova, que, como tal, nas palavras de Amilton Bueno de Carvalho “está a exigir, para ter acolhida no sistema, requisitos que lhe são indispensáveis – condições de validade: um – deve ser coletada perante autoridade eqüidistante – no modelo vigente, o juiz. Ou seja, sujeito imparcial – aquele que não tem interesse pessoal na produção probatória”.

A eqüidistância, todavia, não é exigida apenas dos magistrados. O Código de Processo Penal, em seu artigo 258, estabelece que “os órgãos do Ministério Público não funcionarão nos processos em que o juiz ou qualquer das partes for seu cônjuge, ou parente, consangüíneo ou afim, em linha reta ou colateral, até o terceiro grau, e a eles se estendem, no que lhes for aplicável, as prescrições relativas à suspeição e aos impedimentos dos juízes”.

E um desses impedimentos, previstos no art. 252, IV, do CPP consiste exatamente em ser o juiz “diretamente interessado no feito”. Como se vê, o legislador também buscou evitar que o membro do Parquet tenha interesse direto na solução da lide.

Tal norma não precisaria sequer estar escrita. É que o processo penal nasce justamente para, superando a vingança privada, fazer com que um agente público, representante do Estado, em substituição à vítima, componha os conflitos sociais, zelando, em nome do interesse coletivo, para que a paz social seja mantida. Elementar, portanto, que, na hipótese de ser um Procurador da República vítima de um delito, não pode ele funcionar no processo como acusador de seu algoz.

Ora, bem examinados os autos, verifica-se que existe, de fato, a possibilidade de que tal princípio não tenha sido observado na hipótese sob exame.

Com efeito, leitura superficial da denúncia oferecida na ação penal 2005.70.00.029545-0 (Ação 1) demonstra que se imputa ao paciente ter ele realizado grampo telefônico ilegal contra as seguintes vítimas: i) Sérgio Fernando Moro, Juiz Federal da Segunda Vara Criminal de Curitiba; ii) Carlos Fernando dos Santos Lima, Procurador Regional da República; iii) Vladimir Aras, Procurador da República; iv) Maria de Fátima Labarerre, Desembargadora Federal do Tribunal Regional da Quarta Região; v) Patrícia Helena Daher Lopes, Juíza Federal; vi) Paulo Roberto Falcão, Delegado de Polícia Federal; vii) Eurico Montenegro Barbosa, Perito do INC/DPF; viii) Glênio Guimarães Belluco, Perito do INC; e ix) Jairo Cruz Pinto, Promotor de Justiça (fls. 45-46).

Constata-se, igualmente, que, em denúncia oferecida na mesma data e perante a mesma Vara Federal, dessa feita na ação penal 2005.70.00.029546-2 (Ação 2), subscrevem a exordial, dentre outros, os Procuradores Vladimir Aras e Carlos Fernando dos Santos Lima, vítimas na supra mencionada ação penal 2005.70.00.029545-0 (Ação 1).

Cerca de um mês depois, inicia-se a ação 2005.70.00.029733-1 (Ação 3), promovida, novamente, pelas vítimas da citada ação penal 2005.70.00.029545-0 (Ação 1), Vladimir Aras e Carlos Fernando dos Santos Lima, os mesmos subscritores da peça que ensejou o início da ação 2005.70.00.034324-9 (Ação 4).

Mostra-se fundada, pois, ictu oculi, a suspeita impetrantes em relação à falta de isenção necessária dos subscritores dos acordos de delação premiada empregados nas ações movidas contra o paciente.

Em que pese ter sido descartado o impedimento do Juiz Federal Sérgio Moro, certo está que os Procuradores da República que subscreveram as denúncias também foram, em tese, vítimas do paciente, sendo razoável supor a hipótese de que eles também firmaram os tais acordos, em indesejável coincidência dos papéis de acusador e vítima.

De se reformar, assim, a decisão impugnada, no ponto em que consignou o seguinte (fl. 29):

“A pretensão, contudo, não prospera. Com efeito, se havia algum interesse dos advogados do réu no inteiro teor das declarações prestadas pelos delatores na fase preambular meramente investigatória, ele não mais subsiste neste momento processual, em que já foram instauradas ações penais – algumas delas até sentenciadas e com apelações em tramitação na correspondente Corte Regional – porque tudo o que dizia respeito ao paciente, e serviu para subsidiar as acusações promovidas pelo Ministério Público, foi oportuna e devidamente juntado aos respectivos autos. E, independentemente do que fora declarado na fase inquisitória, é durante a instrução criminal, na fase judicial, que os elementos de prova são submetidos ao contraditório e à ampla defesa, respeitando o devido processo legal.

Quanto à disposição da defesa de ‘apurar eventual nulidade originária dos acordos firmados pelos delatores’, conforme entendimento assente nesta Corte, ‘o material coligido no procedimento inquisitório constitui-se em peça meramente informativa, razão pela qual eventuais irregularidades nessa fase não tem o condão de macular a futura ação penal’ (HC 43.908/SP, 5ª Turma, de minha relatoria, DJ 03/04/2006)”.

Não vislumbro, todavia, motivo para decretar a publicidade dos acordos de delação premiada, cujo sigilo lhe é ínsito, inclusive por força de lei.

Ao paciente basta saber quem participou da confecção e homologação dos acordos, sendo pública e notória a condição dos delatores.

Ante o exposto, acatando o parecer ministerial, deixo de conhecer do habeas corpus no que diz respeito ao acordo realizado pelo delator Sérgio Rodrigues de Oliveira, porquanto não foi requerido acesso ao mesmo ao Superior Tribunal de Justiça, sob pena de supressão de instância.

Na parte que conheço, concedo a ordem em parte para determinar à Secretaria da 2ª Vara Federal Criminal de Curitiba que certifique quais foram as autoridades, judiciárias e do Ministério Público Federal, responsáveis pela homologação e propositura dos acordos de delação premiada firmados pelos delatores Antônio Celso Garcia e Sérgio Renato Costa Filho.


Revista Consultor Jurídico, 18 de setembro de 2007

 


Origem

quarta-feira, outubro 11, 2006

Liberdade ameaçada

Fonte:


Estado tem poder de punir e exigir prática de condutas




Em um Estado Democrático de Direito reside o monopólio estatal do direito de punir e de exigir compulsoriamente a prática de alguma conduta. De sorte que se o particular incide em tal prática, perpetra efetivamente o tipo previsto no art. 345 do CP que é o crime de exercício arbitrário das próprias razões.

São tais crimes objeto do Capítulo VI do Código Penal e subdividem-se em: crimes contra a liberdade pessoal; contra a inviolabilidade de domicílio, da correspondência e de segredos.

O CP não considera como crimes contra a liberdade individual os denominados crimes eleitorais. Ainda que estes afetem a ordem política e sejam inseridos na classificação de crimes políticos e regulados por legislação especial.

A liberdade é direito assegurado expressamente pela atual Carta Magna (ex vi art. 5o, caput) e previsto como a possibilidade de cada ser humano se autodeterminar. Aliás, sobre a liberdade em termos filosóficos também se pode consultar um artigo da mesma autora sob o título Liberdade, a genuína expressão humana, também disponível no site www.direito.com.br. Como bem disse Sartre, estamos condenados a ser livres.



Constrangimento ilegal

O crime de constrangimento ilegal é previsto no art. 146 CP se traduz como um crime sui generis. Pois independentemente do meio obtido ou utilizado para perpetrar a privação de liberdade, este será punido de forma unitária.

Se, no entanto, ocorre a vis corporalis com resultado lesivo à vítima, dá-se evidentemente o concurso material de crimes. Constranger significa forçar alguém a fazer alguma coisa ou tolher seus movimentos para que deixe de fazer.

A pena é agravada se na execução houver a reunião de mais de três pessoas ou tiver havido emprego de armas. Não configura tal crime, o tratamento médico arbitrário se justificado por iminente perigo de vida, e a coação exercida para impedir o suicídio.

Trata-se de crime comum, pois pode ser praticado por qualquer pessoa. Se o agente criminoso é funcionário público, no exercício de suas funções, é responsabilizado por outros delitos previstos nos arts. 322 e 350 do CP e, ainda no art. 3o da Lei 4.898/65.

Como vítima é necessário que possua capacidade de querer constranger. Ficam excluídos os doentes mentais, os menores, o ébrio total e contumaz, as pessoas por qualquer motivo inconscientes.

Podem tais pessoas serem objeto do crime praticado contra seus representantes legais. A conduta típica no art. 146 do CP é a de coagir, impelir, compelir, não é a de tolerar que se faça alguma coisa.

A coação pode constituir-se de violência direta ou imediata (vias de fato, lesões corporais) como também a indireta ou mediata, utilizando o agente de ameaça ou qualquer outro meio como bebida alcoólica, narcótico para o constrangimento.

Não há ilicitude no caso de coação juridicamente justificada como é o caso de estrito cumprimento do dever legal. É ilícito o constrangimento destinado a obstar um ato imoral que não seja ilícito. È indispensável o nexo causal entre o emprego da violência ou da grave ameaça ou qualquer outro meio e o resultado, ou seja, a submissão do ofendido.

O tipo subjetivo corresponde ao dolo, ou seja, a vontade de coagir. Não existe a forma culposa. Guilherme de Souza Nucci e outros doutrinadores renomados não acreditam que não existe elemento subjetivo do tipo específico.

As expressões "a não fazer o que lei permite" e "a fazer o que não manda" constituem elementos objetivos do tipo e não subjetivos.

Diferentemente da ameaça na qual o medo é o próprio objetivo do agente criminoso, no constrangimento ilegal o medo é meio através do qual se alcança o fim almejado, subjugando-se a vontade da vítima e obrigando-a a fazer aquilo a que foi constrangida (RT 616/360).

Corroborando com a inexistência de um dolo específico há também um pronunciamento jurisprudencial que é pertinente e que convém citar in verbis: "Inocorrem os crimes de roubo ou constrangimento ilegal se a ação do agente tem por objetivo um constrangimento indeterminado, pois para a caracterização do delito contra o patrimônio é necessária a intenção de apoderar-se definitivamente de um bem, e, para a configuração da infração prevista no art. 146 do CP tipicamente subsidiária, exige-se que a conduta seja realizada com o fim de que a vítima não faça o que a lei permite ou faça o que ela não determina" RJTACrim 39/324(SP).

Considera-se o crime de constrangimento ilegal consumado quando o ofendido faz ou deixa de fazer o que não deseja em virtude de conduta do agente. Estará caracterizada a tentativa quando apesar da violência, ameaça ou quaisquer outro meios empregados, a vítima não se submete a vontade do agente criminoso.

O tipo previsto no art. 146 CP é tipicamente subsidiário, só ocorrendo quando o ato não constitui ilícito mais grave (como roubo, extorsão, estupro, desobediência). No caso de atuar o agente com o fim de obter o que poderia ser conseguido por meios legais, haverá o crime de exercício arbitrário das próprias razões que absorve a prática do crime de constrangimento ilegal.

Constitui crime de tortura sancionado com reclusão de 2 a 8 anos, constranger alguém com emprego de violência ou ameaça grave, causando-lhe sofrimento físico ou mental, com o fim de obter informação, declaração ou confissão da vítima ou de terceira pessoa para provocar ação criminosa ou em razão de discriminação racial ou religiosa (art. 1o, I, a, b e c da Lei 9.445 de 7/4/1997).

Não é porque a lei impõe um dever a alguém que a outra pessoa está autorizada a forçá-lo ao cumprimento deste, com violência ou grave ameaça.

Num Estado Democrático de Direito reside o monopólio estatal do direito de punir e de exigir compulsoriamente a prática de alguma conduta. De sorte que se o particular incide em tal prática, perpetra efetivamente o tipo previsto no art. 345 do CP que é o crime de exercício arbitrário das próprias razões.

O objetivo jurídico é a liberdade física ou psíquica do ser humano. Dentre a classificação doutrinária o tipo previsto no art.146 CP é: crime comum, de forma livre, material (pois se exige resultado naturalístico), comissivo (constranger em geral implica em ação positiva) e, excepcionalmente comissivo por omissão (ou omissivo impróprio); é crime instantâneo, de dano (é pois, consuma-se somente com a efetiva lesão à liberdade do ofendido), unissubjetivo, plurissubsistente e admite tentativa.

O preceito secundário do tipo prevê a alternância da pena privativa de liberdade ou multa. No entanto, se presentes a reunião de mais de três pessoas ou de emprego de armas, impões-se a acumulação de penas, por ser a modalidade qualificada reveladora de um caráter mais perigoso do agente criminoso.

O conceito de arma não foi especificado no tipo penal, mas incide a figura da majoração de pena. Se houver arma própria (como, por exemplo, as armas de fogo) ou ainda a arma imprópria (como a faca de cozinha, canivete, um porrete).

A prática de intervenção cirúrgica justificada por iminente perigo de vida ou a coação para impedir suicídio são fatos atípicos. Mesmo sem a menção expressa da lei, tais fatos seriam causas de exclusão de ilicitude por corresponderem ao estado de necessidade ou a legítima defesa conforme o caso.

"Obrigado a motorista, sob ameaça de arma a conduzir o agente a determinado lugar configura-se crime de constrangimento ilegal na forma qualificada; e não o de seqüestro, já que esses delitos diferenciam-se pelo elemento subjetivo: enquanto o constrangimento ilegal reclama a simples voluntariedade do fato e um fim imediato específico expressamente enunciado na lei; o seqüestro exige vontade consciente e dirigido à ilegítima privação ou restrição da liberdade alheia" (RT 651/269 e, ainda RT 564/373 TJSP).



As ameaças

Na conceituação do crime de ameaça (art. 147 do CP) não é preciso que o mal prometido constitua crime, bastando que seja injusto e grave. Não é somente incriminada a ameaça verbal ou por escrito, mas também a ameaça real ou a simbólica.

Ameaça do latim vulgar minacia, ameaça, prenúncio de acontecimento desagradável, promessa de castigo. O francês ménace e o italiano minaccia estão mais próximo da antiga origem. Já em espanhol amenaza lembra a forma portuguesa. Às vezes é empregado em sentido irônico, como quando dizemos que um escritor medíocre nos ameaça com um novo livro.(In : "A vítima íntima das palavras de Deonísio da Silva).

A ameaça é crime comum e conforme as circunstâncias pode caracterizar o abuso de autoridade (delito previsto no art. 3o da Lei 4.898, de 9.12.1965). Como vítima pode ser qualquer pessoa apta a entender a ameaça, restando sujeita à intimidação. Sendo o ofendido o presidente da República, presidente do Senado Federal, da Câmara dos Deputados ou do Supremo Tribunal Federal ocorrerá crime contra a segurança nacional previsto pela Lei 7.170 de 14.12.1983 em seu art. 28.

Ameaçar significa intimidar, anunciar ou prometer castigo ou malefício, a denominada violência moral. Pode a ameaça ser direta ou indireta ou reflexa. Pode ser condicional, se não constituir elemento do crime de constrangimento ilegal ou outro qualquer crime embora já se tenha jurisprudencialmente decidido o contrário.

Nada impede também a ameaça à distância (por telefone, e-mail, e, etc) ou transmitida à vítima por terceiro. Relevante é que a ameaça deva ser idônea e capaz de abalar a tranqüilidade psíquica da vítima.

Jurisprudencialmente firmou-se o conceito do tipo penal de ameaça através do TACrimSP (vide JTACrim 36/351-2) e consiste em o sujeito anunciar à vítima a prática de mal injusto e grave, consistente num dano físico, econômico ou moral (RT 597/328). É crime contra a liberdade pessoal do sujeito passivo e visa a lei proteger a paz de espírito e a tranqüilidade da vítima, deve-se referir a um mal futuro de efeito perdurável.

Não há de se cogitar em ameaça proferida e executada no momento de entrevero ou de contenda.

Mesmo ante a arma de brinquedo, está caracterizado o delito previsto no art. 147 do CP. Principalmente quando o revólver utilizado reproduza e guarda estreita semelhança com o verdadeiro, sendo capaz de incutir um justo temor e apto a intimidar a vítima.

Já quanto à ameaça por gesto com arma pesa a controvérsia. Pois há entendimento jurisprudencial que não considera séria e idônea tal ameaça e, outros (majoritário) entende por ser suficiente para plenamente caracterizar o delito de ameaça.

É indispensável a configuração delitiva a promessa de mal injusto grave e futuro (JTACrim 3/22). Outra polêmica acirrada cinge-se também a ameaça condicional, pois uns a admitem e outros não. Estes últimos entendem que "o crime de ameaça não se caracteriza se o agente condiciona a ação de ameaçar a um mal futuro e a ato que venha a ser praticado pelo rival' (RT 702/372).

Outra jurisprudência esclarece in verbis: "A ameaça não admite condições. Assim, não se caracteriza o delito se o agente condiciona a ação de praticar mal futuro à vítima caso esta porventura lhe fizer algum, visto que basta a vítima se omitir em sua ação, para que a ameaça não se caracterize." RT 580/354.

O mal prometido há de ser grave, sério e apto a intimidar, a atemorizar a vítima. Leva-se em consideração também as condições pessoais do ofendido (sua idade, sexo, cultura, compleição física e estado psíquico) que pode ou não determinar que seja intimidade efetivamente pelo agente criminoso.

A ameaça deve ser crível, verossímil e referir-se a um mal iminente e não remoto. E será avaliada sob o critério do homo medius. A figura típica do art. 147 do CP exige assim que o mal seja futuro (JTACrim 78/191). A ameaça é justificada não só nas hipóteses da legítima defesa e de estado de necessidade, mas também a que seja utilizada para evitar lesão ou a repetição de lesão de um interesse jurídico ameaçado ou para constranger outrem à iniqüidade. Simples desaforos com injúrias recíprocas não configuram o delito de ameaça. O dolo do crime de ameaça é a vontade de praticar a intimidação.

Não configura também o crime, portanto, a simples bravata ou a presença do animus jocandi.Existe jurisprudência no sentido de que não constitui o crime do art. 147 do CP a ameaça vaga feita sob o império de cólera passageira, uma vez que sua tipificação exige o ânimo calmo e refletido. O mesmo se tem decidido a respeito da ameaça partida de pessoa embriagada.

Em sentido diametralmente oposto, também se tem afirmado nos tribunais que a ira e a embriaguez não anulam a vontade de intimidar e de infundir temor injusto à vítima.

O crime de ameaça é formal, de forma que se consume no momento em que a vítima toma conhecimento da ameaça, independentemente da intimidação. Basta que seja idônea e suficiente capaz de intimidar.

Quando a ameaça é meio executório de outro crime, como por exemplo do constrangimento ilegal, roubo, extorsão fica este delito absorvido por estes mais gravosos. Não é punida, pois como crime autônomo. Se a ameaça atinge a várias pessoas, existirá concurso formal de crimes. Nada impede que haja crime continuado onde ocorre ameaças subseqüentes.



Barrar a liberdade

Difere da extorsão onde há a exigência de pagamento de certo valor. Apura-se mediante ação penal condicionada , exigindo-a representação da vítima ou seu representante legal. Permite-se a retratação antes da denúncia.

O seqüestro e o cárcere privado previstos no art. 148 CP apresenta como núcleo do tipo o significado de tolher, impedir, tirar o gozo da liberdade, desapossar. È uma restrição ao direito de ir e vir no aspecto físico e, não no intelectual.

Há uma insistência proposital na construção desse tipo penal incriminador, tanto assim que o legislador utilizou o mesmo verbo na configuração do delito de extorsão mediante seqüestro (ex vi ao art. 159 CP).

O seqüestro não tem o significado de tolhimento de liberdade de expressão. Exige-se a situação de permanência, tanto assim que é doutrinariamente classificado como delito permanente (ou seja, aquele que se consome e se prolonga no tempo).

Se ocorre a conduta instantânea de impedir que alguém faça alguma coisa que a lei lhe autoriza concretizar, segurando-a por alguns minutos, configura o delito de constrangimento ilegal. O elemento subjetivo do tipo é o dolo, não existindo a forma culposa.

O seqüestro é a conduta gênero da qual é espécie o cárcere privado. Manter alguém em cárcere privado é o mesmo que encerra-la em uma prisão ou cela, ou recinto fechado, isolando-a, sem a possibilidade de livre locomoção.

A completa classificação doutrinária do crime de seqüestro envolve: crime comum, material (exige pois tão-somente a privação da liberdade da vítima e, não, por exemplo, o pedido de resgate e nem mesmo o seu pagamento), de forma livre, comissivo ou omissivo, permanente, unissubjetivo, plurissubsistente. Mas não se afasta a possibilidade de ser cometido num único ato unissubsistente, admite também a tentativa na forma comissiva, embora de difícil comprovação.

O consentimento do ofendido elide a privação da liberdade. Não se trata de direito indisponível, a liberdade, salvo se ofender a ética e ao bom senso e, neste caso, o consentimento da vítima não surtirá o efeito de eliminar a ilicitude do fato.

Aplicar-se-á pena mais grave ao agente que pratica crime contra seus familiares, pode o parentesco ser natural ou civil pois a lei não faz a distinção. Em função do estrito cumprimento ao princípio da legalidade que vige em Direito Penal, não se aceita a inclusão dos concubinos ou mesmo dos companheiros.

A internação fraudulenta é também alvo de reprovação penal. A privação da liberdade a mais de 15(quinze) dias, na consideração do legislador pátrio, merece igualmente maior reprovabilidade com a conseqüente majoração da pena.

O art. 148 § 2o do CP que prevê maus-tratos e a natureza da detenção cogita de um resultado qualificador pelo resultado. Trata-se de meio particular de execução delituosa, causando a vítima além da privação da liberdade, um particular sofrimento físico ou moral, impondo-se igualmente a majoração de pena nestes casos.

A redução de condição análoga a de escravo é definido no art. 149 do CP também chamado de delito de plágio. Plágio é a sujeição de uma pessoa ao domínio de outra. Não se trata de sujeito submeter a vítima a escravidão. É situação similar a de escravo apenas. O tipo penal visa a um estado de fato e, não a uma situação jurídica.

É irrelevante o consentimento do ofendido uma vez que a liberdade do homem constitui interesse preponderante do Estado. Há de se lembrar que a vontade do cidadão que dá poder ao Estado para se constituir e se perpetuar enquanto instituição.

A norma incriminadora não faz nenhuma restrição ou exigência à qualidade pessoal do autor ou do ofendido. Só é punível a título de dolo que consiste na vontade de exercer domínio, sobe outra pessoa, suprimindo-lhe a liberdade fática embora ainda possua a liberdade jurídica. Tal delito atinge o momento consumativo quando o agente criminoso efetivamente reduz a vítima à condição similar a de escravo. Admite-se no entanto a tentativa.



Invasão de domicílio

Sob a rubrica de "crimes contra a inviolabilidade do domicílio", na verdade temos apenas a descrição de um só delito previsto no art. 150 CP. Apesar de possuir formas simples e qualificadas descritas nos parágrafos primeiro e segundo do art respectivo artigo do Código Penal Brasileiro, não constituem crimes autônomos, mas simplesmente tipos de uma figura central, que é a violação de domicílio.

Aliás, a norma penal vem sancionar o Direito Constitucional que através da Carta Magna vigente prevê expressamente que "a casa é asilo inviolável do indivíduo( ...) " em seu art. 5o., XI, (...) salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial.

Tal tipo penal não protege nem a posse e nem também a propriedade e, sim a tranqüilidade doméstica. Tanto assim que não constitui crume a entrada ou permanência em casa alheia desabitada.

Jaz importante distinção entre casa desabitada e a casa na ausência de seus moradores, nesta hipótese, subsiste o crime de violação de domicílio. Estando a casa desabitada, inexiste delito, pois não há o fato típico e nem lesão à paz doméstica.

A violação de casa desabitada consiste no delito previsto no art. 161 do CP (usurpação).O tipo penal não protege, pois o domicílio em sua acepção cível conceituado tanto como o lugar onde a pessoa reside com ânimo definitivo, sendo a sede jurídica quer da pessoa física ou jurídica.

É possível, portanto a pluralidade de domicílios. O legislador penal procurou proteger o lar, a casa, quer seja um barraco, quer seja uma luxuosa mansão. Tutela-se o direito ao sossego, no local de habitação, seja permanente, seja transitório ou mesmo eventual.

Esclarece Damásio Evangelista de Jesus que a empregada que deixa o amante penetrar em seu quarto efetivamente comete o crime previsto no art. 150 do CP, caput, onde se presume o dissentimento do dono da casa.

Diferentemente, porém, a esposa que na ausência do marido, permite o ingresso do amante na residência, esta não comete o delito, pois conforme os termos do art. 226, § 5o, da CF/88 encontra-se em igualdade jurídica em relação ao marido, podendo a esposa anuir com a entrada do amante. De sorte que o consentimento do ofendido exclui o crime (RTJ 47/734).

Diante do conflito horizontal de autoridades, havendo o condomínio ou a coletividade forçada, quanto às partes comuns como átrios, corredores, saguão, jardins. Qualquer um tem o direito de permitir e autorizar a entrada ou permanência de terceiros.

Entretanto, sendo condomínio fechado existe a violação de domicílio no caso de ocorrer a entrada não autorizada em partes que são individualizadas. Se um condômino permite e, outro proíbe, aplica-se o princípio de que melhor é a condição de quem proíbe.

Restará ao violador que agiu de boa fé, demonstrar que não praticou a violação domiciliar com dolo. Na casa de família, os titulares do jus prohibendi que são os pais. Entretanto os filhos podem admitir ou de excluir nas dependências a eles pertencentes.

O patrão tem o direito de penetrar no quarto da empregada, desde que para fins morais e lícitos, ainda que contra a vontade dela. Não constituindo violação de domicílio tal prática.

O locador que invade a casa de seu inquilino contra a sua vontade, comete a violação do domicílio, pois tem ofendida sua tranqüilidade doméstica. Casa significa qualquer compartimento habitado, ainda no caso de habitação coletiva, compartimento não aberto ao público, onde alguém pode exercer profissão ou atividade laboral.

Não merecem a proteção penal a hospedaria, a estalagem, ou qualquer outra habitação coletiva enquanto aberta. A proteção penal paira também sobre as dependências do domicílio tais como os jardins, varandas, alpendres, adegas, garagens, quintais, pátios, etc...desde que fechados cercados ou haja obstáculos visíveis que impeçam a passagem (quer seja correntes, telas, etc.).

A entrada e a permanência podem ser francas, astuciosas ou clandestinas (e neste caso o dissentimento é presumido). A violação de domicílio é mera conduta; segundo Damásio E. de Jesus nem é crime material e nem formal.

É preciso observar que o tipo penal não descreve qualquer conseqüência da entrada ou permanência. È delito instantâneo na modalidade "entrar", já na de "permanecer" é crime permanente. Não se trata de crime subsidiário.

O art. 150 do CP prevê forma qualificada se cometida a violação domiciliar durante a noite, ou em lugar ermo ou com emprego de violência ou de arma, ou por duas ou mais pessoas. A pena é de detenção de seis meses a dois anos, além da correspondente à violência.

O emprego de violência também qualifica o crime, é tanto a exercida contra a pessoa quanto a coisa. Diferentemente o art. 157 CP que prevê expressamente a violência contra a pessoa.

A pena majorada de um terço, se o fato é cometido por funcionário público, ou poderá se constituir abuso de poder. O § 3o do art. 150 CP prevê as causas especiais da exclusão da antijuridicidade se ocorrer durante o dia, com observância das formalidades legais, para efetuar prisão ou diligência; a qualquer hora do dia ou da noite, quando algum crime está sendo ali praticado ou na iminência de o ser.

É lícita a entrada ou permanência em casa alheia, a qualquer hora do dia ou da noite, quando algum crime está sendo ali praticado ou na iminência de o ser. Quanto à prisão em flagrante delito tanto de crime como de contravenção.

Não há violação de domicílio quando o fato é cometido em estado de necessidade, legítima defesa e o exercício regular de direito. Presente o consentimento do morador, o fato é atípico. A ação penal pública é incondicionada.

O consentimento de menor é inválido se contraria a vontade do chefe da família (RT 544/398). Também inválido o consentimento da empregada onde é presumido o dissenso tácito do proprietário à violação de seu lar (RT568/335).

O conceito de domicílio para fins penais não corresponde ao domicílio civil, mas a casa de moradia, o local reservado à vida íntima do indivíduo ou à sua atividade privada, seja ou não coincidente com o domicílio (RT 469/411).

A inviolabilidade domiciliar não se aplica a lares desvirtuados, como cassinos clandestinos, aparelhos subversivos, casa de tolerância, locais de comércio clandestino, de drogas ou entorpecentes (...) RTESP 69/386.

Em invasão de domicílio o empurrão contra a pessoa para o ingresso na casa integra o próprio tipo penal, não configurando separadamente, a contravenção de vias de fato (RT 626/305).

No art. 151, caput do Código Penal Brasileiro define-se o crime de violação de correspondência, mas o tipo penal foi substituído com a mesma redação pelo art. 40 da Lei 6.538, de 22/6/1978 que dispõe sobre os serviços postais, prevendo pena mais rigorosa que é de detenção de 6 meses, ou multa de até 20 dias-multa.

Já no parágrafo primeiro do mesmo artigo, a conduta é apossar-se da correspondência com o fim de escondê-la ou desviá-la ou para inutilizá-la, no todo ou em parte. É necessário que a conduta seja indevida e nada impede a tentativa.



Violar a comunicação

São várias as condutas típicas contempladas no art. 151, parágrafo primeiro divulgar a comunicação telegráfica ou radioelétrica; transmitir o conteúdo à pessoa determinada, ainda que reservadamente; e utilizar o conhecimento da mensagem, de qualquer forma, desde que o fato não configure crime mais grave, como o de extorsão, por exemplo.

As mensagens protegidas são as transmitidas por telégrafo, telefone ou por ondas hertzianas (rádios, televisão, etc.) quando não dirigidas ao público em geral.

O dolo corresponde a vontade de violar a lei, praticar as condutas incriminadas sendo irrelevante o fim pretendido pelo agente criminoso. Consuma-se o crime com a mera divulgação do conteúdo, inerentemente da obtenção de qualquer vantagem.

A interceptação telefônica passou a ser disciplinada pela Lei 9.296 de 24.7.96 que regulamentou o art. 5o, XII parte final da CF; tal lei em seu art. 10 criminaliza conduta de interceptar ligações telefônicas, de informática e quebrar segredo de Justiça, sem autorização judicial prévia, e com objetivos não autorizados em lei, aplica a pena de dois a quatro anos de reclusão e multa.

Júlio Fabrini Mirabete entende que tal lei especial não revogou o art. 151, §1o, II do CP que pode ser aplicado não ao interceptador mas a terceiro que não colaborou com tal conduta. A conduta típica enunciada em lei especial é interceptar a comunicação (por escuta ou por gravação, ou qualquer outro meio) ainda que não haja divulgação ou transmissão a terceiro.

Aliás, quanto a prova ilícita, discorri mais amiúde sobre o tema em artigo também publicado em 8/8/2002 no site www. direito.com.br sob o título de "O princípio da proibição da prova ilícita".

Também é crime impedir a comunicação ou conversação efetivada por telégrafo, rádio ou telefone. Qualquer pessoa pode cometer o delito, eis que é crime comum e mesmo a autoridade não pode embaraçar a liberdade de radiodifusão ou da televisão (exceto nos casos legalmente amparados por lei) e incidirá no que couber na sanção do art. 322 do CP (violência arbitrária).

O art. 151, §1o, inciso IV do CP foi substituído pelo art. 70 da Lei 4.117 do 27/8/62 que disciplinou o Código Brasileiro de Telecomunicações com a redação dada pelo Decreto-Lei 236 de 28-2-67. O artigo pune com detenção de um ano a dois anos, aumentada da metade, se houver dano a terceiro a instalação ou utilização de telecomunicações sem a observância da lei e dos regulamentos aplicáveis.

É indispensável para a caracterização típica a comprovação do dano. Devem tais dispositivos serem interpretados à luz da nova definição legal prevista no art. 183 da Lei 9.472 de16/7/1997 que dispõe sobre a organização dos serviços de telecomunicações e dá outras providências.

Acrescente-se ainda o Decreto 2615, de 3/6/1998 onde foi aprovado o Regulamento do Serviço de radiodifusão comunitária. De acordo com o art. 223 CF, a Lei 9.612 de 19/2/98, a Lei 4.117, de 27/8/62 modificada pelo Decreto-Lei 236/1997 e, ainda pelo Decreto 3.241 de 11/1/1999 onde foi promulgada a Convenção Interamericana sobre a Permissão Internacional de Radioamador, concluída em Montrouis, Haiti, em 8-6-1995.

É qualificado o crime quando o agente pratica a violação com abuso de função em serviço postal, telegráfico, radioelétrico ou telefônico, não se confundindo com o crime de abuso de autoridade previsto no art. 3o, da Lei 4.898/65.

A ação penal é sempre pública, condicionada a representação da vítima. Nos demais casos é obrigatória a representação da autoridade administrativa do Ministério Público Federal, sob pena de responsabilidade art. 45 da Lei 6.538.

O delito previsto no art. 152 CP referente à correspondência comercial é crime próprio. Pois só pode ser praticado pelo sócio ou o empregado do estabelecimento remetente ou destinatário da correspondência.

Apura-se o crime mediante ação penal pública condicionada à representação da pessoa jurídica ofendida, mas pode fazê-lo o sócio diretamente lesado pelo crime.

A divulgação de segredo prevista no art. 153 do CP é também crime próprio. E a conduta típica é divulgar por qualquer forma, sendo crime...



Revista Consultor Jurídico, 8 de janeiro de 2003

domingo, outubro 08, 2006

Pensão alimentícia deve prevalecer sobre direito de terceiro

Fonte:





04.10.2006 [14h14]



A 1ª Câmara de Direito Civil do TJ reformou sentença da Comarca de Curitibanos e deu provimento ao recurso do menino M. G. F., representado legalmente por sua mãe, S. A. F., em que o pagamento de alimentos demonstrou-se indispensável à sobrevivência do menor.

Em 1997, a mãe ajuizou ação de investigação de paternidade cumulada com pedido de alimentos. Comprovada a paternidade através de exame de DNA, o pai, M. A. F., foi condenado ao pagamento de pensão alimentícia mensal no valor de meio salário mínimo, o que atualmente equivale a R$ 175.

Em razão do não pagamento da pensão, em agosto de 2003, o réu foi citado e tomou conhecimento da ação de execução de alimentos. Conforme os autos, na data de 10 de setembro daquele ano consta a alienação para terceiro do único bem pertencente ao pai, um automóvel Volkswagen Saveiro modelo 2003.

Em novembro, o juiz determinou a penhora do veículo, que encontrava-se em nome de J. A. D., mas que já havia sido adquirido e revendido por outras duas pessoas. Para buscar os seus direitos, J. A. D. ajuizou embargos de terceiro contra o menor visando a suspensão do processo de execução e a desconstituição da penhora, sob o argumento de que estava prestes a vender o veículo e a restrição judicial lhe causava prejuízos. “Se o devedor transfere o único bem que possui para terceiro, após citação, pratica fraude”, destacou o relator do processo, desembargador substituto Joel Dias Figueira Júnior, ao tratar da ação de execução de alimentos.

Por conta disso, o magistrado declarou ineficaz a alienação do veículo para terceira pessoa, raciocínio seguido pelos demais desembargadores integrantes da Câmara. (Apelação Cível nº 2006.011469-9)

TJSC



Anúncio AdSense