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terça-feira, abril 08, 2008

O princípio da presunção de inocência - Blog Oficial do Prof. Damásio de Jesus

 

O princípio da presunção de inocência

7 de Abril de 2008   
Publicado por Damásio de Jesus  

 

O princípio do estado de inocência ou, como preferem, da presunção de inocência, previsto na Constituição Federal de 1988 (art. 5.º, LVII), determina, antes de a sentença condenatória transitar em julgado, a impossibilidade de se impor ao acusado de um crime qualquer medida de coação pessoal ao seu direito de liberdade, que se revista de característica de execução de pena. Proíbe-se a denominada “pena antecipada”, exceção às providências de natureza cautelar, como a prisão em flagrante, preventiva e a prisão temporária. Nesse sentido: TJSP, HC n. 79.434, RJTJSP 121/352.

 

Podem, assim, ser utilizados meios coativos contra o infrator penal, ainda que seja mero suspeito, durante a persecução punitiva, mesmo antes de ser instaurado inquérito policial. São legítimos, de modo que, enquanto não transitada em julgado a sentença condenatória, não podem ser tomadas contra o suspeito, indiciado ou réu medidas que seriam próprias da fase da execução, a não ser quando vinculadas à sua natureza cautelar, provisória e necessária. Por isso, dele decorrem outras regras, como: o sujeito só pode ser processado nas hipóteses previstas em lei; a cada um é assegurado o devido processo legal, obedecidos estritamente os ritos procedimentais; ninguém pode ser julgado sem citação regular; no terreno das provas, deve vigorar o brocardo in dubio pro reo; o fato que apresenta dúvida razoável quanto à sua ocorrência não pode ser considerado provado; não há presunção de dolo, de culpa ou de culpabilidade; por último, o réu tem direito a ver o seu caso julgado em um prazo razoável.

 

O princípio deve ser empregado com critério e equilíbrio, buscando-se uma justa posição entre o direito de punir do Estado e o direito penal público subjetivo de liberdade do cidadão. A medida a ser tomada precisa estar no meio-termo entre o respeito às garantias determinadas pela Constituição, como o devido processo legal, o contraditório, o princípio da dignidade, a plenitude de defesa etc., e a exigência da segurança social. Esta não pode sobrepor-se àquelas e vice-versa. O ponto de equilíbrio é aquele em que, resguardada a segurança social, a medida não se mostra injusta, cruel e desnecessária.

 

Estamos seguramente convencidos de que, mesmo que sejam providências de investigação, deve ser guardada a presunção de inocência. E não basta à autoridade afirmar que a determinação constitucional está sendo obedecida. Assim como à mulher de César não basta ser honesta, precisa parecer honesta, nos casos criminais não é suficiente que pareça que estão sendo obedecidas as regras da dignidade e da presunção de inocência do acusado: é necessário que isso esteja realmente ocorrendo.

 

Não é possível que, diante de provas ainda não submetidas ao contraditório, ainda que sejam consideradas firmes pela autoridade persecutória, o acusado seja exposto ao escárnio público como se já tivesse sofrido sentença condenatória. O mal é irreparável, mesmo que venha a ser absolvido.

 

Não estou defendendo uma Justiça Criminal frouxa nem suspeitos em face dos quais, não havendo provas seguras de inocência ou de autoria e materialidade, não foi escrita, ainda, sua verdadeira história. Incluo-me na totalidade dos brasileiros estarrecidos diante de crimes hediondos cometidos no cotidiano, causando intensa repulsa à consciência nacional.

 

A atuação da Justiça Criminal deve ser justa, severa, eficiente e responsável; que o criminoso, atendidas a gravidade do crime e sua culpabilidade, cumpra realmente a pena merecida.

 

Mas é preciso cautela. Não da boca para fora.

 

Blog Oficial do Prof. Damásio de Jesus

 

quinta-feira, abril 03, 2008

Decisão. Persecução penal. Sigilo. Direito de acesso do advogado, quando constituído. Medida cautelar deferida - Jusvi

 

Decisão. Persecução penal. Sigilo. Direito de acesso do advogado, quando constituído. Medida cautelar deferida

Celso de Mello

 

HC 93767 MC/DF*

RELATOR: MIN. CELSO DE MELLO

    EMENTA: PERSECUÇÃO PENAL INSTAURADA EM JUÍZO OU FORA DELE. REGIME DE SIGILO. INOPONIBILIDADE AO ADVOGADO CONSTITUÍDO PELO INDICIADO OU PELO RÉU. DIREITO DE DEFESA. COMPREENSÃO GLOBAL DA FUNÇÃO DEFENSIVA. GARANTIA CONSTITUCIONAL. PRERROGATIVA PROFISSIONAL DO ADVOGADO (LEI Nº 8.906/94, ART. 7º, INCISOS XIII E XIV). OS ESTATUTOS DO PODER NÃO PODEM PRIVILEGIAR O MISTÉRIO NEM COMPROMETER, PELA UTILIZAÇÃO DO REGIME DE SIGILO, O EXERCÍCIO DE DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS POR PARTE DAQUELE QUE SOFRE INVESTIGAÇÃO PENAL OU ACUSAÇÃO CRIMINAL EM JUÍZO. CONSEQÜENTE ACESSO AOS ELEMENTOS PROBATÓRIOS DOCUMENTADOS, PRODUZIDOS E FORMALMENTE INCORPORADOS AOS AUTOS DA PERSECUÇÃO PENAL (INQUÉRITO POLICIAL OU PROCESSO JUDICIAL). POSTULADO DA COMUNHÃO OU DA AQUISIÇÃO DA PROVA. PRECEDENTES (STF). DOUTRINA. MEDIDA CAUTELAR DEFERIDA.

    - A pessoa que sofre persecução penal, em juízo ou fora dele, é sujeito de direitos e dispõe de garantias plenamente oponíveis ao poder do Estado (RTJ 168/896-897). A unilateralidade da investigação penal não autoriza que se desrespeitem as garantias básicas de que se acha investido, mesmo na fase pré-processual, aquele que sofre, por parte do Estado, atos de persecução criminal.

    - O sistema normativo brasileiro assegura, ao Advogado regularmente constituído pelo indiciado (ou por aquele submetido a atos de persecução estatal), o direito de pleno acesso aos autos de persecução penal, mesmo que sujeita, em juízo ou fora dele, a regime de sigilo (necessariamente excepcional), limitando-se, no entanto, tal prerrogativa jurídica, às provas já produzidas e formalmente incorporadas ao procedimento investigatório, excluídas, conseqüentemente, as informações e providências investigatórias ainda em curso de execução e, por isso mesmo, não documentadas no próprio inquérito ou processo judicial. Precedentes. Doutrina.

DECISÃO: Trata-se de “habeas corpus”, com pedido de medida liminar, impetrado contra decisão emanada de eminente Ministra de Tribunal Superior da União, que, em sede de processo idêntico ainda em curso no Superior Tribunal de Justiça (HC 99.402/DF), denegou medida liminar que lhe havia sido requerida em favor do ora paciente.

Presente tal contexto, impende verificar, desde logo, se a situação processual versada nestes autos, justifica, ou não, o afastamento, sempre excepcional, da Súmula 691/STF.

Como se sabe, o Supremo Tribunal Federal, ainda que em caráter extraordinário, tem admitido o afastamento, “hic et nunc”, da Súmula 691/STF, em hipóteses nas quais a decisão questionada divirja da jurisprudência predominante nesta Corte ou, então, veicule situações configuradoras de abuso de poder ou de manifesta ilegalidade (HC 85.185/SP, Rel. Min. CEZAR PELUSO – HC 86.634-MC/RJ, Rel. Min. CELSO DE MELLO - HC 86.864-MC/SP, Rel. Min. CARLOS VELLOSO - HC 87.468/SP, Rel. Min. CEZAR PELUSO – HC 89.025-MC-AgR/SP, Rel. Min. JOAQUIM BARBOSA - HC 90.112-MC/PR, Rel. Min. CEZAR PELUSO, v.g.).

Parece-me que a situação exposta nesta impetração ajusta-se às hipóteses que autorizam a superação do obstáculo representado pela Súmula 691/STF. Passo, em conseqüência, a examinar a postulação cautelar ora deduzida nesta sede processual.

O caso ora em exame põe em evidência, uma vez mais, situação impregnada de alto relevo jurídico-constitucional, consideradas as graves implicações que o regime de sigilo – necessariamente excepcional – impõe ao exercício, em plenitude, do direito de defesa e à prática, pelo Advogado, das prerrogativas profissionais que lhe são inerentes (Lei nº 8.906/94, art. 7º, incisos XIII e XIV).

O Estatuto da Advocacia - ao dispor sobre o acesso do Advogado investido de mandato aos procedimentos estatais que tramitam em regime de sigilo – assegura-lhe, como típica prerrogativa de ordem profissional, o direito de examinar os autos, sempre em benefício de seu constituinte, e em ordem a viabilizar, quanto a este, o exercício do direito de conhecer os dados probatórios formalmente produzidos no âmbito da investigação penal, para que se possibilite a prática de direitos básicos de que também é titular aquele contra quem foi instaurada, pelo Poder Público, determinada persecução criminal.

Nem se diga, por absolutamente inaceitável, considerada a própria declaração constitucional de direitos, que a pessoa sob persecução penal (em juízo ou fora dele) mostrar-se-ia destituída de direitos e garantias. Esta Suprema Corte jamais poderia legitimar tal entendimento, pois a razão de ser do sistema de liberdades públicas vincula-se, em sua vocação protetiva, a amparar o cidadão contra eventuais excessos, abusos ou arbitrariedades emanados do aparelho estatal.

Cabe relembrar, no ponto, por necessário, a jurisprudência firmada pelo Supremo Tribunal Federal em torno da matéria pertinente à posição jurídica que o indiciado – e, com maior razão, o próprio réu - ostenta em nosso sistema normativo, e que lhe reconhece direitos e garantias inteiramente oponíveis ao poder do Estado, por parte daquele que sofre a persecução penal:

    INQUÉRITO POLICIAL - UNILATERALIDADE - A SITUAÇÃO JURÍDICA DO INDICIADO.

    - O inquérito policial, que constitui instrumento de investigação penal, qualifica-se como procedimento administrativo destinado a subsidiar a atuação persecutória do Ministério Público, que é - enquanto ‘dominus litis’ - o verdadeiro destinatário das diligências executadas pela Polícia Judiciária.

    A unilateralidade das investigações preparatórias da ação penal não autoriza a Polícia Judiciária a desrespeitar as garantias jurídicas que assistem ao indiciado, que não mais pode ser considerado mero objeto de investigações.

    O indiciado é sujeito de direitos e dispõe de garantias, legais e constitucionais, cuja inobservância, pelos agentes do Estado, além de eventualmente induzir-lhes a responsabilidade penal por abuso de poder, pode gerar a absoluta desvalia das provas ilicitamente obtidas no curso da investigação policial.”

    (RTJ 168/896-897, Rel. Min. CELSO DE MELLO)

Não custa advertir, como já tive o ensejo de acentuar em decisão proferida no âmbito desta Suprema Corte (MS 23.576/DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO), que o respeito aos valores e princípios sobre os quais se estrutura, constitucionalmente, a organização do Estado Democrático de Direito, longe de comprometer a eficácia das investigações penais, configura fator de irrecusável legitimação de todas as ações lícitas desenvolvidas pela Polícia Judiciária, pelo Ministério Público ou pelo próprio Poder Judiciário.

A pessoa contra quem se instaurou persecução penal - não importa se em juízo ou fora dele - não se despoja, mesmo que se cuide de simples indiciado, de sua condição de sujeito de determinados direitos e de senhor de garantias indisponíveis, cujo desrespeito só põe em evidência a censurável (e inaceitável) face arbitrária do Estado, a quem não se revela lícito desconhecer que os poderes de que dispõe devem conformar-se, necessariamente, ao que prescreve o ordenamento positivo da República.

Esse entendimento - que reflete a própria jurisprudência do Supremo Tribunal Federal construída sob a égide da vigente Constituição - encontra apoio na lição de autores eminentes, que, não desconhecendo que o exercício do poder não autoriza a prática do arbítrio, enfatizam que, mesmo em procedimentos inquisitivos instaurados no plano da investigação policial, há direitos titularizados pelo indiciado, que simplesmente não podem ser ignorados pelo Estado.

Cabe referir, nesse sentido, o magistério de FAUZI HASSAN CHOUKE (“Garantias Constitucionais na Investigação Criminal”, p. 74, item n. 4.2, 1995, RT), de ADA PELLEGRINI GRINOVER (“A Polícia Civil e as Garantias Constitucionais de Liberdade”, “in” “A Polícia à Luz do Direito”, p. 17, 1991, RT), de ROGÉRIO LAURIA TUCCI (“Direitos e Garantias Individuais no Processo Penal Brasileiro”, p. 383, 1993, Saraiva), de ROBERTO MAURÍCIO GENOFRE (“O Indiciado: de Objeto de Investigações a Sujeito de Direitos”, “in” “Justiça e Democracia”, vol. 1/181, item n. 4, 1996, RT), de PAULO FERNANDO SILVEIRA (“Devido Processo Legal - Due Process of Law”, p. 101, 1996, Del Rey), de ROMEU DE ALMEIDA SALLES JUNIOR (“Inquérito Policial e Ação Penal”, p. 60/61, item n. 48, 7ª ed., 1998, Saraiva) e de LUIZ CARLOS ROCHA (“Investigação Policial - Teoria e Prática”, p. 109, item n. 2, 1998, Saraiva), dentre outros.

Impende destacar, de outro lado, precisamente em face da circunstância de o indiciado (e com maior razão, o réu em juízo criminal) ser, ele próprio, sujeito de direitos, que o Advogado por ele regularmente constituído (como sucede no caso) tem direito de acesso aos autos da investigação (ou do processo) penal, não obstante em tramitação sob regime de sigilo, considerada a essencialidade do direito de defesa, que há de ser compreendido - enquanto prerrogativa indisponível assegurada pela Constituição da República - em perspectiva global e abrangente.

É certo, no entanto, em ocorrendo a hipótese excepcional de sigilo - e para que não se comprometa o sucesso das providências investigatórias em curso de execução (a significar, portanto, que se trata de providências ainda não formalmente incorporadas ao procedimento de investigação) -, que o acusado (e, até mesmo, o mero indiciado), por meio de Advogado por ele constituído, tem o direito de conhecer as informações “já introduzidas nos autos do inquérito, não as relativas à decretação e às vicissitudes da execução das diligências em curso (...)” (RTJ 191/547-548, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE – grifei).

Vê-se, pois, que assiste, àquele sob persecução penal do Estado, o direito de acesso aos autos, por intermédio de seu Advogado, que poderá examiná-los, extrair cópias ou tomar apontamentos (Lei nº 8.906/94, art. 7º, XIV), observando-se, quanto a tal prerrogativa, orientação consagrada em decisões proferidas por esta Suprema Corte (HC 86.059-MC/PR, Rel. Min. CELSO DE MELLO – HC 90.232/AM, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE - Inq 1.867/DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO – MS 23.836/DF, Rel. Min. CARLOS VELLOSO, v.g.), mesmo quando a persecução estatal, como no caso, esteja sendo processada em caráter sigiloso, hipótese em que o Advogado do acusado, desde que por este constituído (como sucede na espécie), poderá ter acesso às peças que digam respeito à pessoa do seu cliente e que instrumentalizem prova já produzida nos autos, tal como esta Corte decidiu no julgamento do HC 82.354/PR, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE (RTJ 191/547-548):

    Do plexo de direitos dos quais é titular o indiciado - interessado primário no procedimento administrativo do inquérito policial -, é corolário e instrumento a prerrogativa do advogado, de acesso aos autos respectivos, explicitamente outorgada pelo Estatuto da Advocacia (L. 8906/94, art. 7º, XIV), da qual - ao contrário do que previu em hipóteses assemelhadas - não se excluíram os inquéritos que correm em sigilo: a irrestrita amplitude do preceito legal resolve em favor da prerrogativa do defensor o eventual conflito dela com os interesses do sigilo das investigações, de modo a fazer impertinente o apelo ao princípio da proporcionalidade.

    A oponibilidade ao defensor constituído esvaziaria uma garantia constitucional do indiciado (CF, art. 5º, LXIII), que lhe assegura, quando preso, e pelo menos lhe faculta, quando solto, a assistência técnica do advogado, que este não lhe poderá prestar se lhe é sonegado o acesso aos autos do inquérito sobre o objeto do qual haja o investigado de prestar declarações.

    O direito do indiciado, por seu advogado, tem por objeto as informações já introduzidas nos autos do inquérito, não as relativas à decretação e às vicissitudes da execução de diligências em curso (cf. L. 9296, atinente às interceptações telefônicas, de possível extensão a outras diligências); dispõe, em conseqüência, a autoridade policial, de meios legítimos para obviar inconvenientes que o conhecimento pelo indiciado e seu defensor dos autos do inquérito policial possa acarretar à eficácia do procedimento investigatório.” (grifei)

Esse mesmo entendimento foi por mim reiterado, quando do julgamento de pleito cautelar que apreciei em decisão assim ementada:

    INQUÉRITO POLICIAL. REGIME DE SIGILO. INOPONIBILIDADE AO ADVOGADO CONSTITUÍDO PELO INDICIADO. DIREITO DE DEFESA. COMPREENSÃO GLOBAL DA FUNÇÃO DEFENSIVA. GARANTIA CONSTITUCIONAL. PRERROGATIVA PROFISSIONAL DO ADVOGADO (LEI Nº 8.906/94, ART. 7º, INCISOS XIII E XIV). OS ESTATUTOS DO PODER NÃO PODEM PRIVILEGIAR O MISTÉRIO NEM COMPROMETER, PELA UTILIZAÇÃO DO REGIME DE SIGILO, O EXERCÍCIO DE DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS POR PARTE DAQUELE QUE SOFRE INVESTIGAÇÃO PENAL. CONSEQÜENTE ACESSO AOS ELEMENTOS PROBATÓRIOS DOCUMENTADOS, PRODUZIDOS E FORMALMENTE INCORPORADOS AOS AUTOS DA INVESTIGAÇÃO PENAL. POSTULADO DA COMUNHÃO OU DA AQUISIÇÃO DA PROVA. PRECEDENTES (STF). DOUTRINA. MEDIDA CAUTELAR DEFERIDA.

    - O indiciado é sujeito de direitos e dispõe de garantias plenamente oponíveis ao poder do Estado (RTJ 168/896-897). A unilateralidade da investigação penal não autoriza que se desrespeitem as garantias básicas de que se acha investido, mesmo na fase pré-processual, aquele que sofre, por parte do Estado, atos de persecução criminal.

    - O sistema normativo brasileiro assegura, ao Advogado regularmente constituído pelo indiciado (ou por aquele submetido a atos de persecução estatal), o direito de pleno acesso aos autos de investigação penal, mesmo que sujeita a regime de sigilo (necessariamente excepcional), limitando-se, no entanto, tal prerrogativa jurídica, às provas já produzidas e formalmente incorporadas ao procedimento investigatório, excluídas, conseqüentemente, as informações e providências investigatórias ainda em curso de execução e, por isso mesmo, não documentadas no próprio inquérito. Precedentes. Doutrina.”

    (HC 87.725-MC/DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO, DJU 02/02/2007)

Os eminentes Advogados ALBERTO ZACHARIAS TORON e ALEXANDRA LEBELSON SZAFIR, em recentíssima obra - que versa, dentre outros temas, aquele ora em análise (“Prerrogativas Profissionais do Advogado”, p. 86, item n. 1, 2006, OAB Editora) -, examinaram, com precisão, a questão suscitada pela injusta recusa, ao Advogado investido de procuração (Lei nº 8.906/94, art. 7º, XIII), de acesso aos autos de inquérito policial ou de processo penal que tramitem, excepcionalmente, em regime de sigilo, valendo rememorar, a esse propósito, a seguinte passagem:

    No que concerne ao inquérito policial há regra clara no Estatuto do Advogado que assegura o direito aos advogados de, mesmo sem procuração, ter acesso aos autos (art. 7°, inc. XIV) e que não é excepcionada pela disposição constante do § 1° do mesmo artigo que trata dos casos de sigilo. Certo é que o inciso XIV do art. 7° não fala a respeito dos inquéritos marcados pelo sigilo. Todavia, quando o sigilo tenha sido decretado, basta que se exija o instrumento procuratório para se viabilizar a vista dos autos do procedimento investigatório. Sim, porque inquéritos secretos não se compatibilizam com a garantia de o cidadão ter ao seu lado um profissional para assisti-lo, quer para permanecer calado, quer para não se auto-incriminar (CF, art. 5°, LXIII). Portanto, a presença do advogado no inquérito e, sobretudo, no flagrante não é de caráter afetivo ou emocional. Tem caráter profissional, efetivo, e não meramente simbólico. Isso, porém, só ocorrerá se o advogado puder ter acesso aos autos. Advogados cegos, ‘blind lawyers’, poderão, quem sabe, confortar afetivamente seus assistidos, mas, juridicamente, prestar-se-ão, unicamente, a legitimar tudo o que no inquérito se fizer contra o indiciado.” (grifei)

Cumpre referir, ainda, que a colenda Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, ao apreciar o HC 88.190/RJ, Rel. Min. CEZAR PELUSO, reafirmou o entendimento anteriormente adotado por esta Suprema Corte (HC 86.059-MC/PR, Rel. Min. CELSO DE MELLO – HC 87.827/RJ, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE), em julgamento que restou consubstanciado em acórdão assim ementado:

    ADVOGADO. Investigação sigilosa do Ministério Público Federal. Sigilo inoponível ao patrono do suspeito ou investigado. Intervenção nos autos. Elementos documentados. Acesso amplo. Assistência técnica ao cliente ou constituinte. Prerrogativa profissional garantida. Resguardo da eficácia das investigações em curso ou por fazer. Desnecessidade de constarem dos autos do procedimento investigatório. HC concedido. Inteligência do art. 5°, LXIII, da CF, art. 20 do CPP, art. 7º, XIV, da Lei nº 8.906/94, art. 16 do CPPM, e art. 26 da Lei nº 6.368/76. Precedentes. É direito do advogado, suscetível de ser garantido por habeas corpus, o de, em tutela ou no interesse do cliente envolvido nas investigações, ter acesso amplo aos elementos que, já documentados em procedimento investigatório realizado por órgão com competência de polícia judiciária ou por órgão do Ministério Público, digam respeito ao constituinte.” (grifei)

Cabe assinalar, neste ponto, um outro aspecto relevante do tema ora em análise, considerados os diversos elementos probatórios já produzidos nos autos da persecução penal e, portanto, a estes já formalmente incorporados. Refiro-me ao postulado da comunhão da prova, cuja eficácia projeta-se e incide sobre todos os dados informativos, que, concernentes à “informatio delicti”, compõem o acervo probatório coligido pelas autoridades e agentes estatais.

Esse postulado assume inegável importância no plano das garantias de ordem jurídica reconhecidas ao investigado e ao réu, pois, como se sabe, o princípio da comunhão (ou da aquisição) da prova assegura, ao que sofre persecução penal – ainda que submetida esta ao regime de sigilo -, o direito de conhecer os elementos de informação já existentes nos autos e cujo teor possa ser, eventualmente, de seu interesse, quer para efeito de exercício da auto-defesa, quer para desempenho da defesa técnica.

É que a prova penal, uma vez regularmente introduzida no procedimento persecutório, não pertence a ninguém, mas integra os autos do respectivo inquérito ou processo, constituindo, desse modo, acervo plenamente acessível a todos quantos sofram, em referido procedimento sigiloso, atos de persecução penal por parte do Estado.

Essa compreensão do tema – cabe ressaltar - é revelada por autorizado magistério doutrinário (ADALBERTO JOSÉ Q. T. DE CAMARGO ARANHA, “Da Prova no Processo Penal”, p. 31, item n. 3, 3ª ed., 1994, Saraiva; DANIEL AMORIM ASSUMPÇÃO NEVES, “O Princípio da Comunhão da Prova”, “in” Revista Dialética de Direito Processual (RDPP), vol. 31/19-33, 2005; FERNANDO CAPEZ, “Curso de Processo Penal”, p. 259, item n. 17.7, 7ª ed., 2001, Saraiva; MARCELLUS POLASTRI LIMA, “A Prova Penal”, p. 31, item n. 2, 2ª ed., 2003, Lumen Juris, v.g.), valendo referir, por extremamente relevante, a lição expendida por JOSÉ CARLOS BARBOSA MOREIRA (“O Juiz e a Prova”, “in” Revista de Processo, nº 35, Ano IX, abril/junho de 1984, p. 178/184):

    E basta pensar no seguinte: se a prova for feita, pouco importa a sua origem. (...). A prova do fato não aumenta nem diminui de valor segundo haja sido trazida por aquele a quem cabia o ônus, ou pelo adversário. A isso se chama oprincípio da comunhão da prova’: a prova, depois de feita, é comum, não pertence a quem a faz, pertence ao processo; pouco importa sua fonte, pouco importa sua proveniência. (...).” (grifei)

Cumpre rememorar, ainda, ante a sua inteira pertinência, o magistério de PAULO RANGEL (“Direito Processual Penal”, p. 411/412, item n. 7.5.1, 8ª ed., 2004, Lumen Juris):

    A palavra comunhão vem do latim ‘communione’, que significa ato ou efeito de comungar, participação em comum em crenças, idéias ou interesses. Referindo-se à prova, portanto, quer-se dizer que a mesma, uma vez no processo, pertence a todos os sujeitos processuais (partes e juiz), não obstante ter sido levada apenas por um deles. (...).

    O princípio da comunhão da prova é um consectário lógico dos princípios da verdade real e da igualdade das partes na relação jurídico processual, pois as partes, a fim de estabelecer a verdade histórica nos autos do processo, não abrem mão do meio de prova levado para os autos.

    (...) Por conclusão, os princípios da verdade real e da igualdade das partes na relação jurídico-processual fazem com que as provas carreadas para os autos pertençam a todos os sujeitos processuais, ou seja, dão origem ao princípio da comunhão das provas.” (grifei)

Nem se diga que a existência de co-indiciados (ou de co-réus) poderia obstar o exercício do direito de acesso à prova penal já formalmente introduzida nos autos da persecução estatal. É que, mesmo que haja co-réus (ou co-indiciados), a concessão da presente medida cautelar, ainda assim, garantirá, ao ora paciente (por intermédio dos Advogados por ele constituídos), acesso a toda e qualquer prova, desde que formalmente incorporada aos autos, especialmente porque a tanto o autoriza o postulado da comunhão da prova.

É por tal razão que se impõe assegurar, ao ora paciente, por intermédio dos patronos que constituiu, o acesso a toda informação já produzida e formalmente incorporada aos autos da persecução penal em causa, mesmo porque o conhecimento do acervo probatório pode revestir-se de particular relevo para a própria defesa do paciente em questão.

É fundamental, como salientado, para o efeito referido nesta decisão, que os elementos probatórios já tenham sido formalmente produzidos nos autos da persecução penal.

O que não se revela constitucionalmente lícito, segundo entendo, é impedir que o réu (ou indiciado, quando for o caso) tenha pleno acesso aos dados probatórios, que, já documentados nos autos (porque a estes formalmente incorporados), veiculam informações que possam revelar-se úteis ao conhecimento da verdade real e à condução da defesa da pessoa investigada ou processada pelo Estado, não obstante o regime de sigilo excepcionalmente imposto ao procedimento de persecução penal.

O fascínio do mistério e o culto ao segredo não devem estimular, no âmbito de uma sociedade livre, práticas estatais cuja realização, notadamente na esfera penal, culmine em ofensa aos direitos básicos daquele que é submetido, pelos órgãos e agentes do Poder, a atos de persecução criminal, valendo relembrar, por oportuno, a advertência de JOÃO BARBALHO feita em seus comentários à Constituição Federal de 1891 (“Constituição Federal Brasileira – Comentários”, p. 323/324, edição fac-similar, 1992, Senado Federal):

    O pensamento de facilitar amplamente a defesa dos acusados conforma-se bem com o espírito liberal das disposições constitucionais relativas à liberdade individual, que vamos comentando. A lei não quer a perdição daqueles que a justiça processa; quer só que bem se apure a verdade da acusação e, portanto, todos os meios e expedientes de defesa que não impeçam o descobrimento dela devem ser permitidos aos acusados. A lei os deve facultar com largueza, regularizando-os para não tornar tumultuário o processo.

    Com aplena defesasão incompatíveis, e, portanto, inteiramente inadmissíveis, os processos secretos, inquisitoriais, as devassas, a queixa ou o depoimento de inimigo capital, o julgamento de crimes inafiançáveis na ausência do acusado ou tendo-se dado a produção das testemunhas de acusação sem ao acusado se permitir reinquiri-las, a incomunicabilidade depois da denúncia, o juramento do réu, o interrogatório dele sob a coação de qualquer natureza, por perguntas sugestivas ou capciosas, e em geral todo o procedimento que de qualquer maneira embarace a defesa.

    Felizmente, nossa legislação ordinária sobre a matéria realiza o propósito da Constituição, cercando das precisas garantias do exercício desse inauferível direito dos acusados – para ela ‘res sacra reus’ (grifei)

Em conclusão, e tal como decidi no MS 24.725-MC/DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO (Informativo/STF nº 331), cumpre enfatizar, por necessário, que os estatutos do poder, numa República fundada em bases democráticas, não podem privilegiar o mistério.

A Assembléia Nacional Constituinte, em momento de feliz inspiração, repudiou o compromisso do Estado com o mistério e com o sigilo, que fora tão fortemente realçado sob a égide autoritária do regime político anterior (1964-1985), quando no desempenho de sua prática governamental.

Ao dessacralizar o segredo, como proclamou esta Corte Suprema (RTJ 139/712-713, Rel. Min. CELSO DE MELLO), a Assembléia Constituinte restaurou velho dogma republicano e expôs o Estado, em plenitude, ao princípio democrático da publicidade, convertido, em sua expressão concreta, em fator de legitimação das decisões e dos atos governamentais.

É preciso não perder de perspectiva que a Constituição da República não privilegia o sigilo, nem permite que este se transforme em “praxis” governamental, sob pena de grave ofensa ao princípio democrático, pois, consoante adverte NORBERTO BOBBIO, em lição magistral sobre o tema (“O Futuro da Democracia”, 1986, Paz e Terra), não há, nos modelos políticos que consagram a democracia, espaço possível reservado ao mistério.

Tenho por inquestionável, por isso mesmo, que a exigência de publicidade dos atos que se formam no âmbito do aparelho de Estado traduz conseqüência que resulta de um princípio essencial, a que a nova ordem jurídico-constitucional vigente em nosso País não permaneceu indiferente, revestindo-se de excepcionalidade, por isso mesmo, a instauração do regime de sigilo nos procedimentos penais, consideradas, para tanto, razões legítimas de interesse público, cuja verificação, no entanto, não tem o condão de suprimir ou de comprometer a eficácia de direitos e garantias fundamentais que assistem a qualquer pessoa sob investigação ou persecução penal do Estado, independentemente da natureza e da gravidade do delito supostamente praticado.

Sendo assim, e tendo em consideração as razões expostas, defiro o pedido de medida liminar, em ordem a suspender, cautelarmente, até final julgamento da presente ação de “habeas corpus”, o curso do Processo-crime nº 2007.01.1.122602-4, ora em tramitação perante a 1ª Vara Criminal da Circunscrição Especial Judiciária de Brasília/DF, sustando, em conseqüência, a realização do interrogatório judicial do ora paciente, com data já designada para o próximo dia 05/03/2008 (fls. 48), ressalvada a prática de atos processuais de urgência ou, se necessário, a produção antecipada das provas consideradas inadiáveis.

Estendo, ainda, referido provimento cautelar, aos demais litisconsortes penais passivos, que, nessa condição, figuram no mesmo procedimento penal instaurado contra o ora paciente (Processo-crime nº 2007.01.1.122602-4) perante a 1ª Vara Criminal da Circunscrição Especial Judiciária de Brasília/DF.

Comunique-se, com urgência, transmitindo-se cópia da presente decisão à eminente Senhora Ministra-Relatora do HC 99.402/DF (STJ), ao E. Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (HC 2007.00.2.014019-8) e ao MM. Juiz de Direito da 1ª Vara Criminal da Circunscrição Especial Judiciária de Brasília/DF (Processo-crime nº 2007.01.1.122602-4).

Publique-se.

Brasília, 12 de fevereiro de 2008.

Ministro CELSO DE MELLO

Relator

* decisão publicada no DJE de 18.2.2008

Assessora responsável pelo Informativo

Anna Daniela de A. M. dos Santos

informativo@stf.gov.br

 

Fonte: Supremo Tribunal Federal »

 

Revista Jus Vigilantibus, Terça-feira, 1º de abril de 2008

 

Jusvi

 

terça-feira, abril 01, 2008

A razoabilidade constitucional (o princípio do devido processo legal substantivo aplicado a casos concretos)

 


A razoabilidade constitucional
(o princípio do devido processo legal substantivo aplicado a casos concretos)

Texto extraído do Jus Navigandi
http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=820


André Luiz Borges Netto
advogado constitucionalista em Campo Grande (MS), professor universitário, mestre em Direito Constitucional pela PUC/SP


I - INTRODUÇÃO

          Como conclusão da disciplina "Processo Administrativo" resolvemos desenvolver a título de monografia o tema da RAZOABILIDADE CONSTITUCIONAL, longamente estudado durante o semestre, especialmente quando se abordou em inúmeras aulas o princípio do devido processo legal.

          Trata-se de tema dos mais ricos, vindo elencado na Constituição pátria (art. 5º, inciso LIV), não havendo mesmo como compreender temas importantes do Direito sem o recurso à razoabilidade constitucional, tudo porque, por exemplo, "não se pode conceber a função administrativa, o regime jurídico administrativo, sem se inserir o princípio da razoabilidade. É por meio da razoabilidade das decisões tomadas que se poderão contrastar atos administrativos e verficar se estão dentro da moldura comportada pelo Direito"(1).

          Durante as aulas foram abordadas algumas questões práticas, o que me levantou a hipótese de abordar a razoabilidade constitucional diante de situações concretas, até para dar razão a autores de nomeada (como Tércio Sampaio Ferraz), quando se sustenta a necessidade de o estudo do Direito estar vinculado à prática, voltando-o à decidibilidade de conflitos.

          É isto o que fizemos, esperando ter revelado o conhecimento obtido durante este proveitoso semestre de estudos.

          Analisando a Constituição, buscaremos extrair os múltiplos relacionamentos advindo da compreensão da razoabilidade, daí sendo extraídas as conclusões ao final apresentadas.


II – A SUPREMACIA HIERÁRQUICA DAS NORMAS CONSTITUCIONAIS

          Quando se elege como objeto de estudo um tema extraído da Constituição deve ser destacada a relevância da proposta, dado que se estará tirando conclusão do Texto Jurídico que domina o cenário jurídico, em razão da supremacia hierárquica das normas jurídicas ali estabelecidas.

          É pacífico o entendimento de que a importância do estudo da Constituição reside na reconhecida superioridade hierárquica de suas normas em relação às demais normas que constam de nosso direito positivo ou do nosso sistema jurídico-positivo (conjunto de atos normativos expedidos pelo Estado).

          Um ponto é certo: a Constituição é o complexo de normas fundamentais de um dado ordenamento jurídico, ou a ordem jurídica fundamental da comunidade, como diz Konrad Hesse, acrescentando, ainda, que "a Constituição estabelece os pressupostos da criação, vigência e execução das normas do resto do ordenamento jurídico, determinando amplamente seu conteúdo, se converte em elemento de unidade do ordenamento jurídico da comunidade em seu conjunto, no seio do qual vem a impedir tanto o isolamento do Direito Constitucional de outras parcelas do Direito como a existência isolada dessas parcelas do Direito entre si mesmas". (2)

          Por ser a Constituição, vista aqui no seu conteúdo normativo, "aquele complexo de normas jurídicas fundamentais, escritas ou não escritas, capaz de traçar as linhas mestras do mesmo ordenamento", (3) é que se dá a ela a denominação de Lei Fundamental, porque nela é que estão exarados os pressupostos jurídicos básicos e necessários à organização do Estado, além da previsão das regras asseguradoras de inúmeros direitos aos cidadãos, colocando-se, em razão disso, como base, ponto de partida e fundamento de validade de todo o ordenamento jurídico pátrio.

          É o que, com palavras bem mais precisas e elegantes, tem ensinado nosso mestre Celso Ribeiro Bastos, ao analisar a questão da inicialidade fundamentante das normas constitucionais:

"Como sobejamente conhecido, as normas constitucionais fundam o ordenamento jurídico. Inauguram a ordem jurídica de um dado povo soberano e se põem como suporte de validade de todas as demais regras de direito. São normas originárias, fundamentantes e referentes, enquanto que as demais se posicionam, perante elas, como derivadas, fundamentadas e referidas. Aquelas de hierarquia superior, e estas, logicamente de menor força vinculatória". (4)

          O jusfilósofo Hans Kelsen, por sua vez, ao dissertar sobre a Constituição no exercício do papel de fundamento imediato de validade da ordem jurídica, explica o porquê de tal raciocínio:

"O Direito possui a particularidade de regular a sua própria criação. Isso pode operar-se por forma a que uma norma apenas determine o processo por que outra norma é produzida. Mas também é possível que seja determinado ainda -- em certa medida -- o conteúdo da norma a produzir. Como, dado o caráter dinâmico do Direito, uma norma somente é válida porque e na medida em que foi produzida por uma determinada maneira, isto é, pela maneira determinada por uma outra norma, esta outra norma representa o fundamento imediato de validade daquela. A relação entre a norma que regula a produção de uma outra e a norma assim regularmente produzida pode ser figurada pela imagem espacial da supra-infra-ordenação. A norma que regula a produção é a norma superior; a norma produzida segundo as determinações daquela é a norma inferior". (5)

          Considerada dessa maneira, a Constituição é a referência obrigatória de todo o sistema jurídico, inclusive dela própria, uma vez que estabelece no seu próprio corpo as formas pelas quais poderá ser reformada (por intermédio do processo de emenda ou de revisão, na atual Carta Magna brasileira), daí surgindo a noção de hierarquia(6) entre as normas jurídicas, de tal sorte que normas de grau superior são as que constam das Constituições (Constituição Federal, Constituições dos Estados-Membros e Leis Orgânicas Municipais, sendo que as duas últimas também se submetem à primeira) e normas de grau inferior são as veiculadas por intermédio de leis ordinárias, leis complementares, medidas provisórias etc.

          Em razão dessa superioridade, devem ser extirpados do ordenamento jurídico em que exista uma Constituição em vigor quaisquer atos contrários a ela que tenham a pretensão de produzir efeitos jurídicos, inexistindo lugar, inclusive, para regras jurídicas que pretendam ser superiores à própria Constituição ou que, sendo normas constitucionais originárias, sejam inconstitucionais.

          Digno de menção é este trecho da lição de Gomes Canotilho e Vital Moreira:

"A Constituição ocupa o cimo da escala hierárquica no ordenamento jurídico. Isto quer dizer, por um lado, que ela não pode ser subordinada a qualquer outro parâmetro normativo supostamente anterior ou superior e, por outro lado, que todas as outras normas hão-de conformar-se com ela.

"..................................................................

"A principal manifestação da preeminência normativa da Constituição consiste em que toda a ordem jurídica deve ser lida à luz dela e passada pelo seu crivo, de modo a eliminar as normas que se não conformem com ela". (7)

          Assim sendo, toda e qualquer norma, seja de direito público, seja de direito privado, que contrariar comando constitucional, será tida por inconstitucional, sendo norma inválida perante o sistema normativo, (8) devendo ser expulsa do mesmo de acordo com os mecanismos processuais existentes (controle da constitucionalidade difuso e concentrado). À supremacia das normas constitucionais todas as demais normas devem adequar-se.

          Mais uma vez é Hans Kelsen quem bem explica a propalada superioridade hierárquica da Constituição, ensinando-nos que "a ordem jurídica não é um sistema de normas jurídicas ordenadas no mesmo plano, situadas umas ao lado das outras, mas é uma construção escalonada de diferentes camadas ou níveis de normas jurídicas. A sua unidade é produto da conexão de dependência que resulta do fato de a validade de uma norma, que foi produzida de acordo com outra norma, se apoiar sobre essa outra norma, cuja produção, por seu turno, é determinada por outra; e assim por diante, até abicar finalmente na norma fundamental pressuposta. A norma fundamental -- hipotética, nestes termos -- é, portanto, o fundamento de validade último que constitui a unidade desta interconexão criadora". (9)


III - INTERPRETAÇÃO JURÍDICA (ALGUMAS NOÇÕES)

          É sabido que na base de todo e qualquer problema de natureza jurídica está a questão da interpretação. O professor, o magistrado, o advogado, enfim, todo e qualquer operador do Direito, para extrair alguma noção de uma ou mais normas jurídicas, precisa, de antemão, interpretá-las, fixando o sentido ou o significado jurídico das normas objeto de questionamento, visando demarcar o seu campo de incidência.

          Eis a razão pela qual julgamos ser necessário constar do início de nosso estudo um espaço dedicado à interpretação das normas jurídicas, sendo certo, porém, que, por ser outro o objetivo principal de nossas indagações, apreciaremos o tema apenas para delinear algumas das linhas mestras da HERMENÊUTICA, naquilo que for aplicável ao nosso tema principal. (10)

          Partimos da premissa de que o intérprete se vê diante de várias significações possíveis para as normas analisadas, exatamente em razão do sentido verbal das mesmas não ser unívoco, pois o legislador, ao transformar em normas o fruto de suas valorações políticas, (11) utiliza-se da linguagem natural, que é caracterizada pela vagueza e ambigüidade, além de sua textura aberta, (12) razões pelas quais normalmente as prescrições legais são imprecisas, embaraçando, muitas vezes, a transmissão clara das mensagens normativas.

          Correto parece ser, no labor científico, verificar, no interior do sistema, quais as normas que foram prestigiadas pelo legislador constituinte, para desvendar aquelas que foram erigidas em princípios gerais regentes desse mesmo sistema, (13) vetores estes que serão de grande utilidade para a solução dos questionamentos que levantaremos a propósito da questão do conflito de normas constitucionais.

          De algo, porém, estaremos sempre atentos, em razão disto ser uma das premissas básicas de todo e qualquer estudo científico, qual seja: o Direito, como ordem normativa da conduta humana, merece ser interpretado sem arbitrariedades, (14) onde o jurista dogmático, visando compreender suas normas para bem descrevê-las (pois não é sua tarefa julgar as normas do ordenamento), sempre deverá reter na memória a noção de que devem ser respeitados os limites oferecidos pela própria norma, no sentido de não se chegar a uma interpretação "contra legem". Sabemos que este limite não é claro, não estando nem muito menos delimitado com a precisão necessária, mas a questão é de não se ultrapassar o conteúdo jurídico oferecido pela normas interpretadas. (15)

          Referido destaque parece ser importante, na medida em que, na atualidade de nosso mundo jurídico, muitas são as teses e discussões doutrinárias que colocam o justo em situação de prevalência em face do Direito, o que supomos ser incorreto, principalmente quando essas mesmas teses acabam sendo aceitas por aqueles que transformam as normas gerais e abstratas em normas individuais e concretas, por intermédio das decisões e sentenças, que são os magistrados.

          Com tal afirmação, queremos deixar certo que A NORMA JURÍDICA É A BALIZA DA ATIVIDADE INTERPRETATIVA DO JURISTA DOGMÁTICO, algo que é assim colocado para que se respeitem as vigas mestras do sistema jurídico pátrio, que são os princípios da certeza e da segurança jurídica, além do tradicional princípio da tripartição das funções estatais. (16)

          Tal posicionamento, longe de derivar de posições meramente opinativas, deflui do que sempre foi ensinado pela doutrina mais autorizada, como é o caso da seguinte lição de Carlos Maximiliano, "verbis":

"Cumpre evitar {o intérprete}, não só o demasiado apego à letra dos dispositivos, como também o excesso contrário, o de forçar a exegese e deste modo encaixar na regra escrita, graças à fantasia do hermeneuta, as teses pelas quais este se apaixonou, de sorte que vislumbra no texto idéias apenas existentes no próprio cérebro, ou no sentir individual, desvairado por ojerizas e pendores, entusiasmos e preconceitos. ‘A interpretação deve ser objetiva, desapaixonada, equilibrada, às vezes audaciosa, porém não revolucionária, aguda, mas sempre atenta respeitadora da lei’.

"‘Toda inclinação, simpática ou antipática, enfraquece a capacidade do intelecto para reconhecer a verdade, torna-o parcialmente cego. A ausência de paixão constitui um pré-requisito de todo pensamento científico’". (17)

          Não é nosso propósito, aqui, destacar todas as regras de interpretação das normas constitucionais(18) a serem objeto de análise. Limitaremos essas colocações iniciais somente àquilo que julgamos necessário à correta análise da questão vinculada a princípios e regras constitucionais, tema principal de nossa investigação científica.

          Ademais, em matéria de interpretação do Direito, não parece ser possível estabelecer princípios rígidos ou uma escala de precedência entre os diversos métodos existentes, pois não há subordinação ou hierarquia entre os vários recursos da hermenêutica, de vez que "a teoria da interpretação há de contentar-se com fornecer diretivas um pouco mais vagas e plásticas que, sem abandonarem o intérprete a um empirismo incontrolado, alguma coisa peçam todavia à delicadeza e à finura do seu senso jurídico". (19)

          Levaremos em conta tais ensinamentos quando da apreciação dos casos concretos a serem abordados à luz da razoabilidade constitucional.


IV - O RESULTADO DA INTERPRETAÇÃO JURÍDICA SERÁ APENAS UM DOS RESULTADOS POSSÍVEIS

          Oportuno se torna dizer que, na linha da corrente filosófica que adotamos (HAHS KELSEN, Teoria Pura do Direito), o resultado das análises interpretativas que faremos será apenas um dos resultados possíveis, sendo que afastamos a intenção de fazer prevalecer a solução por nós adotada como se ela fosse a única solução correta para os problemas que surgirem no decorrer de nossa explanação.

          Afigura-se-nos correta referida premissa, pois, segundo ensinamento do notável Hans Kelsen, "a questão de saber qual é, de entre as possibilidades que se apresentam nos quadros do Direito a aplicar, a ‘correta’, não é sequer -- segundo o próprio pressuposto de que se parte -- uma questão de conhecimento dirigido ao Direito positivo, não é um problema de teoria do Direito, mas um problema de política do Direito". (20)

          O resultado, portanto, de nossa tarefa interpretativa do tema proposto será um resultado apenas possível, nunca um resultado que seja o único correto, por não ser permitido ao cientista do Direito valorar a norma a ponto de sustentar ser esta ou aquela interpretação a única aplicável ao caso sob análise. Isto decorre da convicção de que o Direito a aplicar forma "uma moldura dentro da qual existem várias possibilidades de aplicação, pelo que é conforme ao Direito todo o ato que mantenha dentro deste quadro ou moldura, que preencha esta moldura em qualquer sentido possível". (21)

          Também adotaremos neste estudo a noção de ser o Direito um conhecimento tecnológico, prático, VOLTADO PARA A DECIDIBILIDADE DE CONFLITOS, ainda que tais conflitos sejam meramente teóricos, porque são frutos da mente de quem estuda determinado assunto sob o nível da ciência jurídica "stricto sensu". Para tanto, sempre daremos um resultado para nossas pesquisas acerca do sentido das normas analisadas, sentido este que será apenas um dos possíveis sentidos a dar à questão posta.

          Sabedores, porém, de que a interpretação é um mero ato de vontade e de valoração, não cabendo à Ciência do Direito dizer qual é o sentido mais justo ou correto, mas apenas apontar as interpretações possíveis, (22) utilizaremos no presente estudo a Lógica do Razoável de Recasén Siches, para escolhermos, dentre as possíveis interpretações que se nos apresentarem, a que nos parecer mais razoável, por estar de acordo com as regras e princípios jurídicos sob questionamento. (23) Somente assim conseguiremos realizar trabalho com alguma finalidade prática, tarefa a que o jurista deve obrigatoriamente se submeter, pois de nada adiantará a elaboração de estudo desprovido de qualquer intenção de servir para a evolução do pensamento jurídico e para a decidibilidade de conflitos.


V – A IMPORTÂNCIA DA INTERPRETAÇÃO SISTEMÁTICA

          Para conseguirmos extrair do Texto Constitucional os múltiplos relacionamentos com o tema proposto, teremos que, desde o início, adotar como proposta exegética a consideração dos princípios e regras jurídicas em harmonia com o contexto geral do sistema constitucional. Com isto queremos dizer que, a despeito de não menosprezarmos nenhum dos conhecidos métodos interpretativos, a coordenação e o inter-relacionamento das normas constitucionais será buscado pela via da interpretação sistemática, considerada o método por excelência da hermenêutica jurídica por Paulo de Barros Carvalho, (24) em razão de permitir uma visão grandiosa do Direito.

          Como observou o inesquecível Geraldo Ataliba, "qualquer proposta exegética, objetiva e imparcial, como convém a um trabalho científico, deve considerar as normas a serem estudadas, em harmonia com o contexto geral do sistema jurídico. Os preceitos normativos não podem ser corretamente entendidos isoladamente, mas, pelo contrário, haverão de ser considerados à luz das exigências globais do sistema, conspicuamente fixados em seus princípios. Em suma: somente a compreensão sistemática poderá conduzir a resultados seguros. É principalmente a circunstância de muitos intérpretes desprezarem tais postulados metodológicos que gera as disparidades constantemente registradas em matéria de propostas de interpretação". (25)

          Realmente, na perquirição do significado ou conteúdo de qualquer texto normativo, e especialmente quando o texto é a Constituição, (26) o intérprete, ao invés de atentar unicamente para regras isoladas, deverá voltar os olhos para o sistema constitucional, compreendido como um todo uno, harmônico e coerente. Com noção dessa natureza, nosso empenho deverá ser no sentido de fazer com que as normas constitucionais se ajustem umas às outras, fazendo com que eventuais antinomias sejam meramente aparentes, solucionáveis pelos critérios interpretativos existentes.

          Sobre a interpretação sistemática, veja-se o que escreveu Luís Roberto Barroso:

"O método sistemático disputa com o teleológico a primazia no processo interpretativo. O direito objetivo não é um aglomerado aleatório de disposições legais, mas um organismo jurídico, um sistema de preceitos coordenados ou subordinados, que convivem harmonicamente. A interpretação sistemática é fruto da idéia de unidade do ordenamento jurídico. Através dela, o intérprete situa o dispositivo a ser interpretado dentro do contexto normativo geral e particular, estabelecendo as conexões internas que enlaçam as instituições e as normas jurídicas. Em bela passagem, registrou Capograssi que a interpretação não é senão a afirmação do todo, da unidade diante da particularidade e da fragmentaridade dos comandos singulares". (27)

          Verifique-se, inclusive, que uma das raríssimas intervenções do legislador constituinte em matéria de interpretação constitucional foi dada pelo texto da Constituição da Thecoslováquia, de 1948, quando nela restou estabelecido que "a interpretação das diversas partes da Constituição deve inspirar-se no seu conjunto e nos princípios gerais sobre os quais se alicerça". Vale a citação como notícia histórica, sendo que agiu correto nosso legislador constituinte em não adotar regra semelhante, já que o campo das prescrições impositivas, voltado para a disciplina do comportamento humano, é impróprio para as definições e estabelecimento de critérios interpretativos, algo que é encargo da doutrina, como se sabe.

          Ao adotarmos tal premissa metodológica -- decorrente da estrita observância do método da interpretação sistemática, tal como posto pela melhor doutrina --, acreditamos operar no sentido da concretização do princípio da unidade da Constituição, que na pena do constitucionalista português Gomes Canotilho é considerado como princípio interpretativo, quando com ele se quer significar que o direito constitucional deve ser interpretado de forma a evitar contradições (antinomias, antagonismos) entre as suas normas, princípio este que acaba por obrigar o intérprete a considerar a Constituição na sua globalidade e a procurar harmonizar os espaços de tensão existentes entre as normas constitucionais a concretizar. (28)

          Do quanto ficou escrito, pode-se inferir que temos como pretensão básica a consecução do objetivo exegético delineado por Carlos Maximiliano, no sentido de que o Direito deve ser interpretado inteligentemente, "não de modo que a ordem legal envolva um absurdo, prescreva inconveniências, vá ter a conclusões inconsistentes ou impossíveis. Também se prefere a exegese de que resulte eficiente a providência legal ou válido o ato, à que torne aquela sem efeito, inócua, ou este, juridicamente nulo". (29)

          Referida abordagem tem muito a ver com o tema da razoabilidade constitucional, servindo para dar maior clareza ao que se pretende elucidar.


VI – O DEVIDO PROCESSO LEGAL E A RAZOABILIDADE CONSTITUCIONAL: ORIGEM E EVOLUÇÃO HISTÓRICA

          Como já se disse, é da excelente obra de Carlos Roberto de Siqueira Castro(30) que se extraem as melhores considerações sobre o devido processo legal e o princípio constitucional da razoabilidade. Vejamos como que se pode revelar a origem e a evolução histórica do assunto.

Surgimento: o devido processo legal surgiu na Idade Média, por meio da Magna Carta, em 15 de junho de 1215, inicialmente concebida como simples limitação às ações reais.

Evolução do termo "due process of law": o princípio do devido processo legal acobertou-se inicialmente sob a locução "law of the land". Em 1354, editada lei pelo Parlamento inglês que substitui o termo "law of the land" por "due process of law".

          Ingresso da cláusula do devido processo legal nas cartas das colônias inglesas da América do Norte.

Evolução constitucional britânica: teve como pano de fundo a resistência do Parlamento contra a autoridade do rei, acabando por sacramentar a supremacia do Parlamento. Por este motivo, e depois do sufrágio universal, o Parlamento significava para o povo inglês a casa da liberdade e das grandes aspirações sociais. O Parlamento pode até abolir o "Bill of Rights", mas confia-se que não o fará por causa da "rigidez sociológica", que dá caráter imutável aos institutos jurídicos calcados nas tradições seculares.

Evolução constitucional dos Estados Unidos da América: tanto no período colonial como no período pós-independência preponderou o preconceito contra o Poder Legislativo porque o Parlamento, para as colônias, representava o poder de repressão vinculado através da legislação da metrópole. Era através do Parlamento que as colônias eram exploradas economicamente e se impedia a emancipação das famílias protestantes pioneiras na colonização. Por isso era necessário encontrar mecanismos de controle do Legislativo. Após a emancipação política e a formação da federação foi criado o controle judicial de constitucionalidade das leis ("judicial review") e o veto presidencial.

          As diferenças existentes entre os dois sistemas também traz marcante diferença no conceito de legalidade. Para os americanos a legalidade é a supremacia da Constituição conforme assim o declare o Poder Judiciário. Para os ingleses a legalidade nada mais é do que a vontade do Poder Legislativo expressa nas leis que foram votadas segundo o princípio da maioria parlamentar.

Edward Coke: juiz que na Inglaterra, em 1610, defendeu a revisão judicial dos atos do Parlamento pelas Cortes de "common law". Suas idéias tiveram muito maior ressonância nos EUA. No "Dr. Bonhan’s Case" o juiz Coke concluiu que seria nulo o ato do Parlamento que transformasse alguém interessado na causa em seu julgador, ou seja, em juiz em causa própria.

Juiz Marshall: em 1803, no caso "Marbury v. Madyson", julgado pela Suprema Corte dos Estados Unidos, consagrou a "judicial review".

          Os americanos passaram a adotar os mesmos direitos individuais ("fundamental rights") já consagrados na formação constitucional anglo-saxônica, mas foram adicionando mecanismos que garantiam a revisão judicial dos atos legislativos. Com isso passaram a desautorizar no seu território as leis do Parlamento inglês que considerassem violadoras de suas liberdades fundamentais. O Poder Judiciário passou a ter a função de declarar o sentido e alcance das normas ("what the law is").

"Bill of Rights" inglês: foi aprovado como lei pelo Parlamento em 1.689. Em sentido jurídico, pode ser emendado ou revogado pelo legislador. Simboliza a vitória do Parlamento sobre a monarquia.

"Bill of Rights" americano: o conceito de declaração de direitos é primariamente americano em sua origem porque incorpora garantias de liberdade individual a um documento constitucional no qual se limita e define as áreas de atuação legislativa. O primeiro "Bill of Rights" moderno foi a Declaração de Direitos de Virgínia (1776), porque foi pioneiro em usar uma Constituição escrita para imunizar os direitos individuais da atividade legislativa. Expressa uma conquista supralegal da sociedade sobre o Estado como um todo, confiando-se ao Poder Judiciário o depósito das liberdades individuais. Índole jusnaturalista atrelada ao ideal de independência contra a dominação inglesa.

Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão (Revolução Francesa de 1789): nítido caráter burguês, metafísico e universalista. Visava retirar privilégios dados à nobreza e ao clero em detrimento do terceiro estado (burguesia), que tinha pretensões de conquistar o poder político ao lado do econômico (que já detinha).

          Desde os tempos de colonialismo o sistema jurídico norte-americano assimilou as tradições humanistas inglesas pela via da "recepção". Por terem necessidade de se estruturarem organicamente após a independência, os novos Estados, reunidos na convenção da Filadélfia de 1787, não proclamaram desde logo o "Bill of Rights" uniforme para toda a Federação. Isso só aconteceu 4 anos mais tarde (1791) com a promulgação das 10 primeiras emendas à Constituição dos EUA, ratificadas por ¾ dos Estados–membros.

          As 10 primeiras emendas consubstanciam o "Bill of Rights" norte-americano ao qual foram agregadas depois outras emendas, também para proteção dos direitos humanos.

"Due Process of Law": intimamente ligada à própria prerrogativa de revisão judicial e independência do judiciário. Esteve sempre latente no pensamento constitucional norte-americano. Foi haurido e aperfeiçoado a partir de tradições jusnaturalistas do "common law" anglo-saxônico. Ao lado do princípio da igualdade ("equal protection of the law"), o due process of law tem sido o principal instrumento de argumentação utilizado pela doutrina e pela jurisprudência no processo de transformação do direito constitucional norte-americano.

5ª e 14ª Emendas: Incorporaram formalmente ao direito constitucional norte-americano a cláusula "due process of law", que tem passado por profundas variações em razão da interpretação que lhe tem dado a jurisprudência da Suprema Corte.

          Eis aí a demonstração de como surgiu e a própria evolução histórica do tema do devido processo legal, do qual é possível extrair a noção da razoabilidade constitucional.


VII – O DEVIDO PROCESSO LEGAL ADJETIVO E
SUBSTANTIVO: SURGE A RAZOABILIDADE CONSTITUCIONAL

          Já do texto de Charles D. Coole(31) é que se podem extrair outras considerações sobre o devido processo legal, especialmente acerca das diferenças entre o devido processo legal ADJETIVO e SUBSTANTIVO.

O Devido Processo Legal Adjetivo: é determinação extraída da Constituição dos EUA, que garante aos cidadãos um processo JUSTO.

          Para afetar a vida, a liberdade ou o patrimônio dos cidadãos é necessário que os governos estaduais e federal observem esta garantia constitucional, algo que se concretiza, por exemplo, diante da necessidade de ser expedida intimação para apresentação de defesa em um procedimento específico adotado para o acaso.

          O devido processo adjetivo, no sistema constitucional americano, configura-se como um direito negativo, porque o conceito dele extraído apenas limita a conduta do governo quando este atua no sentido de restringir a vida, a liberdade ou o patrimônio dos cidadãos.

          A realidade atual das expressões VIDA, LIBERDADE e PROPRIEDADE na cultura jurídica dos EUA pode ser extraída da jurisprudência firmada pela Suprema Corte, sempre favorável a uma leitura ampla e extensão da Constituição.

          Tem sido determinado pela Suprema Corte que a natureza do processo é determinada pelo equilíbrio de valor do procedimento ao indivíduo em questão ("teste de equilíbrio"), tudo como forma de evitar privação indevida do patrimônio, contra o custo de tal procedimento para a sociedade como um todo.

O Devido Processo Legal Substantivo: a Constituição indica a existência de competência a ser exercida pelo Judiciário, no sentido de poder afastar a aplicabilidade das Leis com conteúdo arbitrário e desarrazoado, como forma de limitar a conduta do legislador.

          Lei que não atinge um fim legítimo é inválida, como tal devendo ser declarada, por força da garantia constitucional em exame.

          Na atualidade, o texto da Lei ou ato governamental será preservado pela Suprema Corte, até que nenhum posicionamento razoavelmente concebível possa estabelecer uma relação entre a regulamentação contestada e um fim legítimo do governo.

          Fato é que o entendimento atual do devido processo legal substantivo permite o controle de atos normativos disciplinadores de liberdades individuais até mesmo "não econômicas". Este princípio, em sua concepção substantiva, é fonte inesgotável de criatividade hermenêutica, transformando-se numa mistura entre os princípios da "legalidade" e "razoabilidade" para o controle dos atos editados pelo Executivo e Legislativo.

          Expostas assim as diferenças entre as duas formas apresentadas pelo devido processo legal, convém aplicar a casos concretos o princípio da razoabilidade constitucional (extraído da noção do devido processo legal substantivo), buscando, sempre, a integração entre teoria e prática exigida pela melhor doutrina (Tércio Sampaio Ferraz, "decidibilidade de conflitos").


VIII - CASO CONCRETO ANALISADO À LUZ DA RAZOABILIDADE CONSTITUCIONAL: A QUESTÃO DA CONVERSÃO OBRIGATÓRIA AO EXECUTIVO DOS DEPÓSITOS JUDICIAIS RELATIVOS A TRIBUTOS

          Eis um tema que andou agitando o Judiciário e que pode ser solucionado à luz da razoabilidade constitucional.

          Inovando a ordem jurídica de forma indevida, o Legislador do Estado de Mato Grosso do Sul, aprovando projeto de lei apresentado pelo Governador do Estado, editou a Lei Ordinária Estadual nº 1.952, de 19 de março de 1999, tratando da questão da conversão dos depósitos judiciais e extrajudiciais (futuros e passados), relativos a tributos estaduais, para a conta do Tesouro do Estado (art. 1º, §§ 1º e 2º e art. 2º).

          Também ficou estabelecido que em caso de derrota judicial do Estado os valores antes convertidos em renda serão "devolvidos ao depositante pela Secretaria de Estado de Fazenda, no prazo máximo de dez dias, quando a sentença lhe for favorável ou na proporção em que o for, acrescido de juros, sob pena de bloqueio das contas do Estado" (§ 3º, inciso I, do art. 1º).

          Ocorre que é inválida a conduta do legislador estadual.

          Com efeito, é INCONSTITUCIONAL a transferência estabelecida pela questionada lei estadual, por ofensa, inicialmente, ao princípio da Separação dos Poderes, estabelecido no art. 2º da Constituição da República.

          Os depósitos judiciais são realizados à ordem e à disposição do Juízo. Traduzem atividade jurisdicional. Deles dispor livremente o Executivo, utilizando-os como receita corrente, constitui intromissão indébita de um Poder em outro.

          A transferência dos recursos preconizada pela indigitada lei estadual vulnera ainda o princípio da isonomia – art. 5º, "caput" – e o princípio do devido processo legal (art. 5º, LIV, da Constituição Federal) (32). Quebra a paridade de armas fazer com que o contribuinte deposite o valor "sub judice", dele privando-se, para entregá-lo à parte contrária, que poderá usar a quantia como lhe aprouver.

            Já a limitação ao levantamento dos depósitos imposta pela mesma lei estadual (permitindo tal ato apenas após o encerramento do processo), a par de ser inconstitucional pelos mesmos fundamentos já deduzidos, é inconstitucional também por violência, sob outro aspecto, ao "due process of law".

          Exigir trânsito em julgado para o levantamento de depósitos em regra voluntários é privar – sem o devido processo legal e sem razão justificável – o jurisdicionado de seus bens. É fomentar, ainda, desvirtuando a finalidade do processo, a interposição abusiva de recursos, uma vez que à Fazenda jamais interessará o término da demanda.

          Ora, lei dessa natureza ofende mesmo o princípio do devido processo legal substantivo, de onde decorre a noção jurídica da RAZOABILIDADE, somente podendo ser considerado como tal "o que seja conforme à razão, supondo equilíbrio, moderação e harmonia; o que não seja arbitrário ou caprichoso; o que corresponda ao senso comum, aos valores vigentes em dado momento ou lugar". (33) Evidente parece ser que não se está diante de lei produzida em obediência este postulado constitucional fundamental.

          Noutra vertente, a pretensão do Poder Público Estadual de transformar depósitos judiciais e extrajudiciais em verdadeiros EMPRÉSTIMOS esbarra também no que estabelece o art. 148, incisos I e II, da Constituição, que trata da competência exclusiva da UNIÃO para instituir empréstimos compulsórios.

          O apossamento pelo Estado de Mato Grosso do Sul daquilo que foi depositado, com promessa de devolução a termo incerto, caracteriza-se como empréstimo compulsório. Como, porém, para a instituição desta exação tributária existe a necessidade da edição de LEI COMPLEMENTAR FEDERAL e a presença de extraordinárias circunstâncias ausentes na espécie (incisos I e II do art. 148 da CF/88), a lei ordinária estadual nº 1.952/99 é inconstitucional, devendo como tal ser declarada.

          Mais se avulta a inconstitucionalidade quando se verifica a existência de previsão legal no sentido de serem devolvidos os recursos repassados ao Tesouro do Estado, em caso de derrota judicial do Estado. Se isto não ocorrer voluntariamente, diz o legislador, deverá haver BLOQUEIO DE RECURSOS QUE JÁ PASSARAM A INTEGRAR A RECEITA ESTADUAL. Como admitir esta hipótese, diante da clareza da redação do art. 100 da Constituição Federal (que determina a expedição de PRECATÓRIO para quitação de dívidas do Poder Público) ?

          A bem da verdade, todo o novel diploma legal estadual merece ser invalidado, pois o que restará da Lei impugnada não corresponderá à vontade legislativa.

          A invasão da esfera de atuação do Poder Judiciário perpetrada pelo Poder Executivo por meio da lei analisada macula, por si, o próprio Estado Democrático de Direito. Uma vez que a divisão de Poderes é a principal garantia da democracia, qualquer vulneração a este princípio é extremamente grave e exige imediato repúdio. A propósito, merece lembrança o contido no art. 16 da Declaração dos Direitos do Homem de 1789:

"Toute société dans laquelle la garantie des droits n’est pas assurée, ni la séparation des pouvoirs déterminée, n’a point de constitution".

          Limitar, por outro lado, o resgate de depósitos apenas por ocasião do trânsito em julgado da demanda provocará dano injusto e de difícil reparação a inumeráveis jurisdicionados, o que já autoriza a propositura de demandas visando controlar a constitucionalidade daquele indigitada lei estadual, que viola todos os princípios retro-elencados, especialmente a noção da razoabilidade constitucional.

          Não se pode compactuar com violação jurídica desta magnitude, em que se inobserva tudo o que há de bom e valioso no regime jurídico pátrio, como forma de atender à vontade ilícita dos Deputados e do Governador Estadual.

          Fato é que não se está diante de conduta CONVENIENTE e LEGÍTIMA, à luz do princípio da razoabilidade, dado que este exige prudência e sensatez (Celso Antonio Bandeira de Mello), algo que certamente não foi observado pelo legislador estadual, fulminando de invalidade jurídica o que restou produzido.

          A análise dessa questão revela bem como que se pode trabalhar de forma satisfatória com o princípio da razoabilidade constitucional.


IX - CASO CONCRETO ANALISADO À LUZ DA RAZOABILIDADE CONSTITUCIONAL:
A QUESTÃO DAS PASSAGENS GRATUITAS DE ÔNIBUS

          Outra questão que também pode ser analisada tendo como parâmetro jurídico a razoabilidade constitucional é a que será exposta a seguir, demonstradora de impressionante abuso do poder de legislar.

          De uns anos para cá, além de as empresas do Estado de Mato Grosso do Sul terem que se submeter aos encargos normais de um empreendimento comercial, estão sendo obrigadas a cumprir os termos da Lei Estadual nº 1.355, de 04 de janeiro de 1993, que concede gratuidade no transporte coletivo intermunicipal aos servidores públicos militares e aos servidores públicos da polícia civil.

          Resolveu-se discutir a validade jurídica desta lei perante o Judiciário, especialmente porque se veio a verificar (em tempos de economia estável, de baixa liquidez dos ativos financeiros, de redução do lucro das atividades comerciais e de aumento dos encargos) que o cumprimento da regra da gratuidade do transporte coletivo a policiais militares e civis tem levado a uma significativa redução do faturamento das empresas, comprometendo seriamente a solidez financeira das mesmas.

          Eis aí a questão posta em Juízo: Lei Estadual transferiu às empresas o ônus de transportar os policiais militares e civis por todo o Estado, sem repassar ou sem permitir qualquer tipo de contraprestação pelo serviço prestado. Situação como esta é absolutamente irregular, sob o ponto de vista constitucional, pois não se permite, antes se veda, que o legislador (seja ele estadual ou federal) imponha a empresa privada ônus desta natureza sem a correspondente contraprestação.

          Norma jurídica inválida, como se sabe, não pode impor nada a ninguém, pois o que é nulo não pode produzir efeitos jurídicos. Como já teve oportunidade de decidir o STF, "a superioridade normativa da Constituição traz, ínsita, em sua noção conceitual, a idéia de um estatuto fundamental, de uma ‘fundamental law’, cujo incontrastável valor jurídico atua como pressuposto de validade de toda a ordem positiva instituída pelo Estado" (RTJ 140/954).

          Pois bem, a desvalia jurídica da Lei Estadual nº 1.355/93, que está a impor obrigação indevida às empresas, decorre, de início, da desatenção dos princípios fundamentais da LIVRE INICIATIVA e da PROPRIEDADE (art. 1º, IV, da CF/88), que vêm repetidos e enfatizados em outras oportunidades ("caput" do art. 5º e "caput", parágrafo único e inciso II do art. 170 da CF/88). Daí decorre a conclusão de que "não só aqui, como no mundo ocidental em geral, a ordem econômica consubstanciada na Constituição, não é senão uma forma econômica capitalista, porque ela se apóia inteiramente na apropriação privada dos meios de produção e na iniciativa privada" (34).

          Ora, não pode deixar de ser considerado que a intervenção do Estado de Mato Grosso do Sul na atuação mercantil das empresas (impondo-lhes, sem contraprestação, ônus relativo à concessão de passagens gratuitas de transporte coletivo) está a ferir de morte os princípios da livre iniciativa e da propriedade, pois restou criada OBRIGAÇÃO NOVA que está a reduzir drasticamente o faturamento das empresas e em conseqüência o lucro das mesmas, características de sua atuação mercantil que estão em sintonia com a ordem constitucional em vigor.

          Ao Estado incumbe a prestação do serviço de SEGURANÇA PÚBLICA, cabendo-lhe, ainda, como decorrência lógica, suportar o ônus relativo ao transporte de seus servidores. Como, pois, entender pela não violação dos princípios destacados acima quando se verifica que não existe na Lei 1.355/93 absolutamente nenhuma previsão quanto à remuneração da concessionária do serviço público pelo fato de ter sido criada obrigação nova e que não existia à época da assinatura do contrato ?

          Obrigação como a que se analisa sequer possui caráter tributário, pois não se amolda a nenhuma das modalidades previstas no art. 145 da Constituição Federal (especialmente porque a Lei 1.355/93 não possui todos os requisitos necessários para que se considere existente um tributo - tal como base de cálculo, sujeito ativo e passivo, alíquota, hipótese de incidência etc, não se tratando, inclusive, de prestação pecuniária, tal como exige o art. 3º do CTN). Em verdade, o ônus repassado às empresas mais se assemelha a uma espécie de CONFISCO ou de DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA, sem pagamento de qualquer espécie de indenização, algo que é sabidamente inválido.

          Observe-se que não se desconhece a autorização constitucional para intervenção do Estado no domínio econômico. Ocorre que isto somente se dá, validamente, quando o Poder Público exerce as funções de fiscalização, incentivo e planejamento ("caput" do art. 174 da CF/88), sendo-lhe lícito, também, via Poder Legislativo, "reprimir o abuso do poder econômico" (§ 4º do art. 174 da CF/88), algo que, à toda evidência, está fora de cogitação, porquanto se está a tratar não de correção de conduta comercial irregular mas sim de atuação imprópria do Estado-legislador, que impôs ônus pesadíssimo a empresas regidas pelas leis de mercado sem a necessária contraprestação.

          JOSÉ AFONSO DA SILVA, notável constitucionalista pátrio, bem abordou a questão da limitação da intervenção estatal no domínio econômico, "in verbis":

"Se a constituição econômica, traduzida no direito constitucional positivo, é essencialmente capitalista, fundada na livre iniciativa e na livre concorrência, a faculdade de intervenção e participação estatal no domínio econômico constitui apenas um modo de temperamento do sistema". (35)

          Não se quer dizer que ao Estado é vedada a concessão do privilégio estabelecido pela Lei 1.355/93. Isto até que seria válido, desde que se tivesse indicado a fonte estatal necessária para o custeio da gratuidade de passagens de transporte coletivo, TUDO PORQUE A REGRA DA ATUAÇÃO DAS EMPRESAS MERCANTIS, pelo que se vê dos dispositivos constitucionais retrocitados, É A LIBERDADE (decorrente da livre iniciativa) e em razão disso elas estão sempre autorizadas a cobrar pelos serviços que desenvolvem. QUALQUER RESTRIÇÃO A ESTA REGRA HÁ DE DECORRER DA PRÓPRIA CONSTITUIÇÃO OU DE LEIS EDITADAS COM FUNDAMENTO NELA.

          Exemplo da correta aplicação dos princípios jurídicos destacados acima pode ser extraído da LIMINAR concedida pelo dedicado Magistrado da 2ª Vara de Fazenda Pública de Campo Grande, que, recentemente, analisando medida cautelar incidental proposta por Josimar Promoções Artísticas Ltda (autos nº 98.13251-1), que combate a validade jurídica de Lei Estadual que concedeu aos estudantes o benefício da meia entrada em cinemas e em outros eventos culturais, veio a considerar que "os argumentos expostos na inicial são consistentes, uma vez que o art. 170 da Constituição Federal, ao elencar os princípios que norteiam a ordem econômica, determina, dentre outros, que sejam respeitados a propriedade privada, a livre concorrência e a defesa do consumidor. (...) Ninguém é contrário que se proporcione incentivo à cultura e, tampouco, se desconhece as dificuldades financeiras pelas quais todos atravessam nesses momentos difíceis da economia. CONTUDO, O ESTADO, A QUEM INCUMBE APOIAR E INCENTIVAR A VALORIZAÇÃO E A DIFUSÃO DAS MANIFESTAÇÕES CULTURAIS (ART. 125, ‘CAPUT’, DA CF), NÃO PODE TRANSFERIR O ENCARGO À INICIATIVA PRIVADA SEM OFERECER QUALQUER CONTRAPRESTAÇÃO" (sem destaque no original).

          Também sobre a questão da inconstitucionalidade das leis que estipularam cobrança de meia entrada dos estudantes nos cinemas existe LIMINAR que foi concedida no Mandado de Segurança nº 001756-8, proferida pelo Desembargador José Antônio Amorim (TJ/SP), do seguinte teor:

"Objetiva o impetrante do presente mandado de segurança, a exclusão do encargo que lhe foi imposto pela Lei Estadual nº 10.859/91, que criou a ‘meia entrada’ para estudantes, em eventos artísticos. Argüiu o impetrante que o Governo do Estado, ao instituir esse incentivo, o fez sem assimilar os altíssimos custos que estavam sendo imputados às empresas do setor. Não se tem notícia de que o Governo do Estado, por qualquer forma, tenha procurado aliviar a carga decorrente do incentivo, mediante a concessão de subsídio, ao menos parcial aos promotores de eventos. Nesse passo não parece correto carrear àqueles todo o ônus do financiamento da cortesia que o Estado cuida em patrocinar. Alega o impetrante a inconstitucionalidade da medida, posto que o Estado, assim procedendo, pratica intervenção no domínio econômico, o que é perfeitamente discutível, até porque, no nosso ordenamento jurídico constitucional só se encontram regras de apoio e incentivo à livre iniciativa. Presentes os pressupostos, defiro a liminar, para excluir o impetrante da obrigatoriedade de praticar a ‘meia entrada’ nos eventos que promover até decisão do mérito do presente mandado de segurança".

          Os argumentos elencados por aqueles ilustres Magistrados vêm de encontro com os que aqui estão sendo sustentados, a saber: lícito seria a instituição do benefício e a transferência do ônus ao particular, desde que prevista a necessária contraprestação.

          Demonstração de clara observância da Constituição Federal foi dada pelo legislador do Estado de Goiás, que ao editar a Lei nº 12.313/93, estabelecendo gratuidade de tarifas para os usuários do transporte coletivo urbano, veio a estabelecer a necessidade de o Poder Público assumir os encargos relativos ao benefício criado (cf. art. 2º). Como em nosso Estado o mesmo não veio a ocorrer, por absoluta desatenção àquilo que já se sustentou, tem-se como certa a desvalia constitucional do ato normativo ora analisado.

          Convém dizer, ainda a título de ilustração, que para fazer valer o benefício constitucional da gratuidade do transporte coletivo urbano para os idosos (§ 2º do art. 230 da CF/88), no Estado de Mato Grosso do Sul editou-se a Lei nº 1.542/94 e a Norma Complementar nº 01/96 do DERSUL, que estipularam LIMITAÇÕES CLARAS ao exercício daquele privilégio, até como forma de vedar o ABUSO. Com efeito, referidos atos estabeleceram limitações quanto ao número de viagens (apenas 10 viagens anualmente, art. 4º) e quanto ao número de poltronas a serem reservadas em cada ônibus (poltronas de nº 03 e de nº 04 de cada veículo de transporte).

Mais se reforça a inconstitucionalidade da Lei Estadual nº 1.355/93 quando, comparando suas prescrições normativas com as contidas nos atos indicados no item anterior, verifica-se que a mesma não estipulou absolutamente nenhuma limitação para o exercício do privilégio ali estatuído. Ou seja: nada restou previsto legislativamente quanto à necessidade de ser limitado o número de policiais militares e civis nos ônibus das empresas e também nada se estipulou quanto ao número de viagens anuais a serem permitidas com relação aos mesmos servidores. Tudo, pois, está a demonstrar ser realmente inválida a lei questionada, por desatenção clara e grave ao princípio constitucional da iniciativa privada e por ingerência indevida do Estado na ordem econômica.

          Outro aspecto de natureza constitucional não pode ser deixado de lado (e que reforça a necessidade de ser reconhecida a inconstitucionalidade da Lei 1.355/93), a saber: com a criação de encargo novo, que não existia à época da assinatura dos contratos de concessões de linhas de transporte coletivo, HOUVE NÍTIDO DESEQUILÍBRIO ECONÔMICO-FINANCEIRO, pois não se indicou e não se autorizou nenhuma forma de as empresas repassarem ao Estado o valor das passagens gratuitas que vêm sendo fornecidas diariamente.

          Sabido é que "na concessão de serviço público é lícita a modificação pelo poder concedente do funcionamento do serviço desde que fique assegurado o equilíbrio do contrato" (RTJ 46/144). Também não se desconhece a célebre lição doutrinária no sentido de que, perante o concedente, "os direitos do concessionário cifram-se ao respeito à parte contratual da concessão, isto é, à manutenção do equilíbrio econômico-financeiro e também a que não lhe seja exigido, sob cor de cumprimento de suas obrigações, o desempenho de atividade estranha ao objeto da concessão, pois é o objeto que identificará tal ou qual concessão". (36)

          Da leitura do ato normativo impugnado verifica-se o sentido desequilíbrio que ele provocou na relação contratual mantida entre as empresas e o Estado, com desatenção violenta à regra legal (art. 9º da Lei Federal nº 8.987/95) e constitucional (inciso XXI do art. 37 da CF/88 - "...mantidas as condições efetivas da proposta") do equilíbrio econômico-financeiro. Fato é que houve alteração da relação encargo-remuneração, que deveria ser mantida durante toda a execução dos contratos firmados entre as partes. Como foi violado o direito da concessionária de ver mantida a equação financeira originariamente estabelecida, cabe ao Judiciário invalidar o ato ilicitamente produzido pelo Parlamento Estadual e que vem sendo cumprido pelo Estado.

          Existe precedente do E. Tribunal de Justiça de São Paulo no mesmo sentido, quando se declarou inconstitucional lei municipal que dispensou as pessoas com mais de 60 anos de idade do pagamento da tarifa do transporte coletivo urbano, tendo sido firmado o entendimento de que "... a lei municipal guerreada não indica a fonte de recursos disponíveis para fazer frente à despesa criada com a dispensa de recolhimento das tarifas, ofendendo, nitidamente, o art. 25 da Carta Estadual".

          Noção como a extraída deste acórdão bem demonstra que não seria difícil, repita-se, tornar a Lei Estadual nº 1.355/93 compatível com a Constituição Federal. Bastaria que este ato normativo indicasse "a fonte de recursos disponíveis para fazer frente à despesa criada com a dispensa de recolhimento das tarifas". Como isto não ocorreu (e como não é dado ao Judiciário, infelizmente, atuar como legislador positivo), não há como deixar de reconhecer o vício da inconstitucionalidade em discussão, daí decorrendo a nulidade absoluta daquilo que foi produzido pelo legislador estadual.

          Os exemplos de correta observância da Constituição Federal não acabam. Veja-se a questão da propaganda eleitoral gratuita, que é transmitida OBRIGATORIAMENTE pelas empresas concessionárias de serviços públicos de telecomunicações. Seria o caso de perguntar se tais empresas, ao realizarem a divulgação, em horário nobre, da propaganda eleitoral (supostamente gratuita), estariam assumindo tal encargo em nome do Poder Público sem qualquer contraprestação. A resposta, pelo que se vê de leis que sempre são editadas por ocasião das Eleições (tal como a Lei Federal nº 8.173/93, regulamentada pelo Decreto nº 1.976/96), é no sentido de que as emissoras de rádio e televisão, obrigadas à divulgação "gratuita" de propaganda eleitoral, poderão excluir do lucro líquido, para efeito de determinação do lucro real, valor correspondente a oito décimos do resultado da multiplicação do preço do espaço comercializável pelo tempo que seria efetivamente utilizado pela emissora em programação destinada a publicidade comercial, no período de duração daquela propaganda (art. 1º).

          Com mais este exemplo, que se aplica a concessionária de serviço público, parece ter ficado claro que o ato normativo estadual ora combatido não possui mesmo nenhuma validade jurídica. A Constituição Federal (especificamente quando este documento jurídico se refere ao princípio da livre iniciativa, ao direito de propriedade e ao equilíbrio econômico-financeiro) foi amplamente desprezada pelo Parlamento Estadual, quando da inovação jurídica que se combate.

          Mas não é só. A doutrina de MARÇAL JUSTEN FILHO(37) é bastante precisa ao abordar a questão da variação da tarifa em função da ausência de recursos do usuário ("tarifa social"), tal como se vê do parágrafo a que se pede atenção na leitura:

"A questão apresenta contornos distintos conforme se enfoque a prestação do serviço público efetivada diretamente pelo Estado ou por concessionário. É QUE O CONCESSIONÁRIO NÃO TEM O DEVER DE ARCAR, INDIVIDUALMENTE, COM CUSTOS REFERENTES À REDUÇÃO OU SUPRESSÃO DAS DESIGUALDADES ECONÔMICAS. Esses encargos devem ser repartidos entre todos os integrantes da comunidade, segundo o princípio da isonomia. Pode-se supor que, desempenhado o serviço público diretamente pelo Estado, os efeitos econômicos das tarifas sociais acabam repassados à comunidade, segundo princípios adequados. QUANDO SE PRETENDE, PORÉM, ESTABELECER TARIFA SOCIAL PARA SERVIÇOS PÚBLICOS CONCEDIDOS, NÃO SE PODE IMPOR AO CONCESSIONÁRIO QUE ARQUE, COM RECURSOS PESSOAS PRÓPRIOS, COM OS EFEITOS ECONÔMICOS CORRESPONDENTES. Deverá haver mecanismos, na concessão, de transferência dos custos da tarifa social para toda a comunidade. De regra, esse mecanismo não pode repassar o custo para a tarifa dos demais usuários. Se essa fosse a solução, os custos da tarifa social seriam partilhados entre os usuários do serviço. Ora, normalmente, nem todos os integrantes da comunidade são usuários. De todo modo, a transferência desses custos para a tarifa produziria outras distorções incompatíveis com os princípios constitucionais, pois o consumo mais intenso de serviço público significaria assunção de encargos mais elevados. A SOLUÇÃO, PORTANTO, É O ESTADO CUSTEAR ESSAS TARIFAS SOCIAIS" (sem destaque no original).

          O mesmo autor ainda cita o texto original do art. 12 da Lei das Concessões, QUE FOI VETADO PELO PRESIDENTE DA REPÚBLICA, que era bastante elucidativo e que estava em harmonia com o Texto Constitucional: "Art. 12 - É vedado, ao poder concedente, estabelecer privilégios tarifários que beneficiem segmentos específicos de usuários do serviço concedido, exceto se no cumprimento de lei que especifique as fontes de recursos". O veto, certamente, só foi aposto em razão de já ser "tradição" no Brasil o Poder Público "dar esmola com o bolso alheio" ou a "fazer cortesia com o chapéu alheio".

          Tem-se, ainda, que, descumprida a caraterística mais elementar do contrato de concessão (modalidade de contrato administrativo governado pelo princípio da remuneração e do equilíbrio da equação financeira), acabou sendo descumprida a garantia constitucional do ATO JURÍDICO PERFEITO (art. 5º, XXXVI, da CF/88), algo que certamente não será referendado pelo Judiciário Estadual, que tem sabido (como se vê da decisão noticiada acima) afastar a incidência de leis produzidas em descompasso com a Carta Magna.

          Impressiona o incrível elenco de princípios e regras jurídicas inobservadas mais uma vez pelo legislador estadual. Mas não é só, porque outra vez é possível elencar o princípio da razoabilidade constitucional como parâmetro para aferir a desatenção da Constituição.

          É que também a melhor doutrina(38) destaca a necessidade de "a lei, para atender aos ditames constitucionais do devido processo, tem de ser justa, critério que compete ao Judiciário aferir no exame do caso, aplicando-se a doutrina do substantivo processo legal". Examinando o caso em destaque, fica fácil constatar tratar-se, mais uma vez, de atuação legislativa inválida, inconstitucional e nula de pleno direito, em razão mesmo da gritante inobservância de tudo que restou exposto.

          A imposição, via atuação do legislador, de ônus excessivo e descabido à iniciativa privada, relativamente às passagens gratuitas e sem direito à contraprestação, evidentemente que ofende a noção de razoabilidade, por se configurar como medida caprichosa, desproporcional e bizarra (especialmente em razão da clara desatenção inúmeros outros princípios claramente destacados no Texto Constitucional).

          Impressiona, como se vê, a enorme utilidade e eficácia jurídica do princípio da razoabilidade constitucional, algo que pode ser extremamente útil na solução de casos concretos.


CONCLUSÕES

          Com o objetivo de sintetizar o que foi visto ao longo desta monografia, elencaremos a seguir, sob a forma de itens, as principais conclusões a que chegamos.

          1. Por conter normas que dão estrutura (organização) ao Estado, normas que estabelecem a forma de elaboração das outras normas e que fixam os direitos e as responsabilidades dos indivíduos, é que a Constituição passa a ser reconhecida como Lei Fundamental, por ser a base de todo o direito positivo da comunidade que a adote, em especial naqueles países que possuem um sistema baseado na lei escrita, sobrepondo-se, inclusive, em relação aos demais atos normativos por estar situada no vértice da pirâmide jurídica que representa idealmente o conjunto de normas jurídicas vigentes em determinado espaço territorial.

          2. A Constituição Federal serve como referência obrigatória de todo o sistema jurídico, que ela própria inaugura, pondo-se como suporte de validade de todas as normas jurídicas da comunidade e sendo a matriz de toda e qualquer manifestação normativa estatal.

          3. Por ocupar o cimo da escala hierárquica no ordenamento jurídico, todas as demais normas deverão conformar-se com a Constituição Federal. À supremacia das normas constitucionais todas as demais normas devem adequar-se.

          4. O estudioso do Direito, em especial o jurista dogmático, não deve se afastar do conteúdo jurídico das normas a serem interpretadas, respeitando os limites oferecidos pela própria norma, visando unicamente compreendê-las para bem descrevê-las, pois não é sua tarefa julgar as normas do sistema.

          5. A norma jurídica é a baliza da atividade interpretativa do jurista dogmático, algo que é assim colocado para que se respeitem as vigas mestras do sistema jurídico pátrio, que são os princípios da certeza e da segurança jurídica, além do tradicional princípio da tripartição das funções estatais.

          6. O resultado das análises interpretativas realizadas neste estudo é apenas um dos resultados possíveis, nunca um resultado que seja o único correto, por não ser permitido ao cientista do Direito valorar a norma a ponto de sustentar ser esta ou aquela interpretação a única aplicável ao caso sob análise.

          7. A coordenação e o inter-relacionamento das normas constitucionais sempre deverá ser buscado pela via da interpretação sistemática, em razão deste método da hermenêutica jurídica permitir uma visão grandiosa do Direito, pois não se deve atentar unicamente para regras jurídicas isoladas, mas sim voltar-se os olhos para o sistema constitucional, compreendido como um todo uno, harmônico e coerente.

          8. O sentido jurídico da Constituição é o único sentido possível e válido de ser estudado pelo jurista dogmático, por ser este o sentido que aproxima o estudioso da característica própria do Direito – e, por conseqüência, das próprias normas constitucionais --, que é a imperatividade, que se traduz na obrigatoriedade do cumprimento dos preceitos normativos por parte daqueles a quem os mesmos são dirigidos.

          9. O devido processo legal foi veiculado inicialmente por intermédio da Magna Carta de 1215, concebido como simples limitação às ações reais, tendo ingressado posteriormente nas Cartas das colônias inglesas da América do Norte, que rendeu extraordinários frutos por força da orientação dada ao tema pela jurisprudência da Suprema Corte.

          10. Ao lado do princípio da igualdade, o devido processo legal tem sido o principal instrumento de argumentação utilizado pela doutrina e pela jurisprudência no processo de transformação do direito constitucional norte-americano.

          11. Duas são as facetas do devido processo legal, a adjetiva (que garante aos cidadãos um processo justo e que se configura como um direito negativo, porque o conceito dele extraído apenas limita a conduta do governo quando este atua no sentido de restringir a vida, a liberdade ou o patrimônio dos cidadãos) e a substantiva (que, mediante autorização da Constituição, indica a existência de competência a ser exercida pelo Judiciário, no sentido de poder afastar a aplicabilidade de leis ou de atos governamentais na hipótese de os mesmos serem arbitrários, tudo como forma de limitar a conduta daqueles agentes públicos).

          12. O entendimento atual do devido processo legal substantivo permite o controle de atos normativos disciplinadores de atividades individuais até mesmo "não econômicas". Este princípio, em sua concepção substantiva, é fonte inesgotável de criatividade hermenêutica, transformando-se numa mistura entre os princípios da "legalidade" e "razoabilidade" para o controle dos atos editados pelo Executivo e pelo Legislativo.

          13. Lei Estadual que trata da conversão obrigatória de depósitos judiciais tributários padece do vício grave da inconstitucionalidade, ofendendo inúmeros princípios e regras constitucionalmente estabelecidos, dentre eles o princípio da razoabilidade (devido processo legal substantivo), dado que não se trata de medida legislativa equilibrada, moderada e que esteja em harmonia com o sistema constitucional vigente, sendo, em verdade, arbitrária e caprichosa, violando a idéia de sensatez e prudência do ato de legislar.

          14. Lei Estadual que obriga as empresas privadas a concederem passagens gratuitas aos policiais civis e militares é nula de pleno direito, em razão do vício da inconstitucionalidade, especialmente por violação da razoabilidade constitucional, porquanto restou desatendida a necessidade constitucional de a lei ser justa, o que não ficou caracterizado, gravidade esta que é acrescida diante da impossibilidade técnica ou legal da contraprestação, ou seja, do dever do Estado de arcar com aquele tipo de ônus ou encargo. A imposição, via atuação do legislador, de ônus excessivo e descabido à iniciativa privada, relativamente às passagens gratuitas e sem direito à contraprestação, evidentemente que ofende a noção de razoabilidade, por se configurar como medida caprichosa, desproporcional e bizarra (até em razão da clara desatenção a um variadíssimo número de princípio e regras destacados explicitamente no Texto Constitucional).


NOTAS

  1. Lúcia Valle Figueiredo, "Curso de Direito Administrativo", f. 42.
  2. Escritos del Derecho Constitucional, p. 17 (traduzimos o trecho citado).
  3. Paolo Biscaretti di Ruffia, Direito Constitucional, p. 86.
  4. Celso Ribeiro Bastos e Carlos Ayres de Brito, Interpretação e Aplicabilidade das Normas Constitucionais, p. 13.
  5. Teoria Pura do Direito, pp. 309-310.
  6. Segundo Michel Temer, hierarquia, "para o Direito, é a circunstância de uma norma encontrar sua nascente, sua fonte geradora, seu ser, seu engate lógico, seu fundamento de validade numa norma superior. A lei é hierarquicamente inferior à Constituição porque encontra nesta o seu fundamento de validade" (Elementos de Direito Constitucional, p. 140).
  7. Fundamentos da Constituição, p. 45.
  8. Norma inconstitucional, como se sabe, é norma nula, não operando (ou não podendo operar) nenhum efeito juridicamente válido. Esta é a lição que consta de voto do eminente Ministro Celso de Mello, que tem valorizado sobremaneira sua atuação junto à nossa Suprema Corte: "Impõe-se ressaltar que o valor jurídico do ato inconstitucional é nenhum. É ele desprovido de qualquer eficácia no plano do Direito. `Uma conseqüência primária da inconstitucionalidade´ -- acentua Marcelo Rebelo de Souza (`O Valor Jurídico do Acto Inconstitucional´, vol. I/15-19, 1988, Lisboa) -- `é, em regra, a desvalorização da conduta inconstitucional, sem a qual a garantia da Constituição não existiria. Para que o princípio da constitucionalidade, expressão suprema e qualitativamente mais exigente do princípio da legalidade em sentido amplo, vigore, é essencial que, em regra, uma conduta contrária à Constituição não possa produzir cabalmente os exactos efeitos jurídicos que, em termos normais, lhe corresponderiam´. A lei inconstitucional, por ser nula e, conseqüentemente, ineficaz, reveste-se de absoluta inaplicabilidade. Falecendo-lhe legitimidade constitucional, a lei se apresenta desprovida de aptidão para gerar e operar qualquer efeito jurídico. `Sendo inconstitucional, a regra jurídica é nula´ (RTJ 102/671)" (RE nº 136.215-4/210/RJ, Rel. Min. Octávio Galloti, in JSTF-LEX 177/212).
  9. Ob. cit., p. 310.
  10. Foram publicadas há pouco tempo duas obras jurídicas de grande relevância para os que se preocupam com a interpretação da Constituição, a saber: Interpretação e Aplicação da Constituição, de Luís Roberto Barroso (Ed. Saraiva, 1996) e Manual de Interpretação Constitucional, de Uadi Lammêgo Bulos (Ed. Saraiva, 1997). É recomendável a leitura dessas duas obras, escritas por juristas que conhecem bem os mecanismos de interpretação constitucional.
  11. Aliás, como demonstrou Fran Figueiredo, principalmente quando o documento jurídico a ser interpretado é a Constituição, "não se pode contar com uma linguagem jurídica escorreita, isenta de equívocos e de variações. Resultando da transação de distintas tendências ideológicas e políticas, é natural que não se possa apresentar em uma linguagem jurídica uniforme, tecnicamente rigorosa, apresentando muitas vezes até nítidos contrastes interiores" (Introdução à Teoria da Interpretação Constitucional, pp. 175/200).
  12. Segundo Agustin Gordillo, "...a linguagem natural tem como característica o que se denominou textura aberta, em razão da qual não se pode lograr uma precisão absoluta nas definições, nas palavras ou nos símbolos, a menos que construamos uma linguagem nova e totalmente artificial. Isso é o que foi feito pelas ciências exatas e o que até agora não pôde fazer o Direito: em conseqüência não pôde alcançar a precisão que caracteriza as chamadas ciências exatas" (Princípios Gerais de Direito Público, pp. 2-3).
  13. Michel Temer, Elementos de Direito Constitucional, p. 24.
  14. A respeito do arbítrio na interpretação do Direito, destaque-se o estudo realizado por Maury R. de Macedo (A Lei e o Arbítrio à Luz da Hermenêutica, Rio de Janeiro, Ed. Forense, 1981).
  15. Na seara do direito constitucional sempre é importante observar, com Luís Roberto Barroso, que "A interpretação da Constituição, a despeito do caráter político do objeto e dos agentes que a levam a efeito, é uma tarefa jurídica, e não política. Sujeita-se, assim, aos cânones de racionalidade, objetividade e motivação exigíveis das decisões proferidas pelo Poder Judiciário. Uma Corte Constitucional não deve ser cega ou indiferente às conseqüências políticas de suas decisões, inclusive para impedir resultados injustos ou danosos ao bem comum. Mas somente pode agir dentro dos limites e das possibilidades abertas pelo ordenamento. CONTRA O DIREITO O JUIZ NÃO DEVE DECIDIR JAMAIS. EM CASO DE CONFLITO ENTRE O DIREITO E A POLÍTICA, O JUIZ ESTÁ VINCULADO AO DIREITO" (Interpretação e Aplicação da Constituição, p. 106, sem destaques no original).
  16. Não é outra a lição de Carlos Maximiliano, seguramente o mais notável cientista que se preocupou com o estudo da Hermenêutica Jurídica em território pátrio, que deixou averbado o seguinte: "Substituir a lei (vontade geral) pelo juiz (critério individual), conforme pretende a corte chefiada pelo Professor Kantorowicz, seria retrogradar; a evolução realizou-se no sentido inverso, no de sobrepor a vontade coletiva à de um só" (Hermenêutica e Aplicação do Direito, p. 79, sem destaque no original).
  17. Carlos Maximiliano, ob. cit., p. 103, sem destaques no original.
  18. Como exemplo dessas regras, podem ser citadas as que foram coligidas por Linares Quintana, que procurou sistematizar as conclusões da jurisprudência em geral: a) Na interpretação constitucional deve sempre prevalecer o conteúdo teleológico da Constituição, que é instrumento de governo, além de ser instrumento de restrição de poderes de amparo à liberdade individual; b) a finalidade suprema e última da norma constitucional é a proteção e a garantia da liberdade e dignidade do homem; c) a interpretação da lei fundamental deve orientar-se, sempre, para esta meta suprema; d) em caso de aparente conflito entre a liberdade e o interesse do governo, aquela deve prevalecer sempre sobre este último, pois a ação estatal manifestada através de normas constitucionais, não pode ser incompatível com a liberdade; e) o fim último do Estado é exercer o mandato dentro de seus limites (Teoría de la Ciencia del Derecho Constitucional Argentino y Comparado, apud José Alfredo de Oliveira Baracho, Hermenêutica Constitucional, in RDP 59-60/46). Também é oportuno, somente para ilustrar o estudo, citar as regras para a interpretação constitucional enumeradas por Henry Campbell Black (que foram expostas no estudo de Uadi Lammêgo Bulos, Manual de Interpretação Constitucional, pp. 58-90): "1) O Texto Constitucional deve ser interpretado de acordo com princípios técnicos, mas também literalmente, conforme as linhas gerais, estatuídas para efetivar os grandes princípios de governo; 2) uma Constituição deve ser interpretada para tornar efetiva a intenção do povo que a adotou; 3) a Constituição, em caso de ambigüidade, deve ser examinada na sua totalidade, objetivando a determinação do sentido de suas partes; 4) uma Constituição deve ser interpretada de acordo com a legislação previamente existente no Estado, a qual deverá compatibilizar-se com as normas constitucionais; 5) a norma constitucional não deve ser interpretada com efeito retroativo, salvo disposição expressa na Constituição; 6) os dispositivos de uma Constituição são quase que invariavelmente imperativos; 7) tudo que for necessário para efetivar uma norma constitucional deve ser considerado implícito ou subentendido – seja uma proibição, restrição ou uma concessão de poder; 8) o preâmbulo da Constituição e os títulos de seus vários artigos ou seções podem fornecer alguma prova de seu sentido e intenção, embora os argumentos deduzidos daí tenham valor apenas relativo; 9) não é permitido desobedecer ou interpretar um dispositivo de modo a negar-lhe aplicação somente porque possa ela parecer injusto, ou conduzir a conseqüências julgadas nocivas, ou a injustas discriminações; 10) havendo ambigüidade, que não possa ser esclarecida pelo exame da própria Constituição, deve-se recorrer a fatos e elementos extrínsecos, tais como a legislação anterior, o mal a ser remediado, as circunstâncias históricas contemporâneas e as discussões da Assembléia Constituinte; 11) as disposições transitórias não podem revogar ou transgredir a parte permanente da Constituição; 12) a interpretação judicial, após deliberadamente firmada, não deve ser abandonada sem graves razões; 13) os preceitos relativos á liberdade, ou que abrem exceção às normas gerais firmadas pela Constituição, devem interpretar-se de modo restrito; 14) a interpretação poderá recorrer ao Direito Constitucional Comparado, a preceitos de outras constituições, de caráter semelhante".
  19. Manuel A. Domingues de Andrade, Ensaio sobre a Teoria da Interpretação das Leis, p. 31.
  20. Teoria Pura do Direito, p. 469. É do mesmo autor a seguinte observação: "A interpretação jurídico-científica tem de evitar, com o máximo cuidado, a ficção de que uma norma jurídica apenas permite, sempre e em todos os casos, uma só interpretação: a interpretação ‘correta’. Isto é uma ficção de que se serve a jurisprudência tradicional para consolidar o ideal da segurança jurídica. Em vista da plurissignificação da maioria das normas jurídicas, este ideal somente é realizável aproximativamente" (ob. cit., pp. 472-473).
  21. Kelsen, ob. cit., pp. 466-467.
  22. Paulo de Barros Carvalho, Curso de Direito Tributário, p. 77.
  23. Acerca dos estudos desenvolvidos por Luís Recaséns Siches, conferir: Lídia Reis de Almeida Prado, "A lógica do razoável na interpretação jurídica", in Revista Justiça e Democracia, Ed. RT, nº 2, p. 122. O estudo do princípio da razoabilidade ou da proporcionalidade já conta com boa doutrina entre nós: Carlos Roberto de Siqueira Castro, O Devido Processo Legal e a Razoabilidade das Leis na Nova Constituição do Brasil, Ed. Forense, 1989; Raquel Denize Stumm, Princípio da Proporcionalidade no Direito Constitucional Brasileiro, Ed. Livraria do Advogado, 1995; Suzana de Toledo Barros, O Princípio da Proporcionalidade e o Controle de Constitucionalidade das Leis Restritivas de Direitos Fundamentais, Ed. Brasília Jurídica, 1996.
  24. Ob. cit., p. 76.
  25. República e Constituição, p. 152. É conhecida e bastante divulgada a lição de Stammler, que se aplica à questão da interpretação sistemática, a saber: "Quando alguém aplica um artigo do Código, aplica todo o Código. Poder-se-ia dizer ainda mais, ou seja, ao aplicar um artigo do Código, aplica-se todo o Direito" (tradução de Eduardo Marcial Ferreira Jardim, Microempresa ao Lume do Regime Jurídico Tributário, p. 33).
  26. Devemos esclarecer que, ainda que não se possa falar em uma "teoria da interpretação constitucional", é certo que os métodos interpretativos a serem aplicados à Constituição revestem-se de atributos próprios. Isto se dá em razão dos traços típicos ou das notas caracterizadoras das normas constitucionais, tão bem ressaltadas por Celso Ribeiro Bastos e Calos Ayres de Brito, que são as seguintes: a) inicialidade, pertinentemente à formação originária do ordenamento jurídico, em grau de superioridade constitucional; b) conteúdo marcantemente político de suas normas; c) estrutura de linguagem caracterizada pela síntese e coloquialidade; d) predominância das normas de estrutura, que têm por destinatário habitual o próprio legislador ordinário (Interpretação e Aplicabilidade das Normas Constitucionais, p. 12).
  27. Luís Roberto Barroso, ob. cit., pp. 127-128.
  28. J. J. Gomes Canotilho, Direito Constitucional, p. 232.
  29. Ob. cit., p. 166.
  30. "O devido processo legal e a razoabilidade das leis na nova Constituição do Brasil", Ed. Forense.
  31. "O devido processo legal na cultura jurídica dos Estados Unidos: passado, presente e futuro", Revista AJUFE.
  32. Vale lembrar que a jurisprudência é farta em reconhecer a importância e eficácia do princípio da razoabilidade constitucional. Ver, por todos, Gilmar Ferreira Mendes, "Direitos Fundamentais e Controle de Constitucionalidade", especialmente o texto sobre "A proporcionalidade na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal", Celso Bastos Editor, p. 67/83.
  33. Luís Roberto Barroso, "Interpretação e Aplicação da Constituição", p. 204.
  34. José Afonso da Silva, "Curso de Direito Constitucional Positivo", p. 666.
  35. José Afonso da Silva, ob. cit., p. 506.
  36. Celso Antonio Bandeira de Mello, "Prestação de Serviços Públicos e Administração Indireta", p. 42.
  37. "Concessões de Serviços Públicos", Ed. Dialética, p. 162.
  38. Paulo Fernando Silveira, "Devido processo legal", Ed. Del Rey, p. 291.

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(inclui livros e textos jurídicos consultados mas não citados explicitamente)

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Sobre o autor


André Luiz Borges Netto

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Sobre o texto:
Texto inserido no Jus Navigandi nº41 (05.2000)
Elaborado em 03.2000.


Informações bibliográficas:
Conforme a NBR 6023:2000 da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto científico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma:
BORGES NETTO, André Luiz. A razoabilidade constitucional (o princípio do devido processo legal substantivo aplicado a casos concretos). Jus Navigandi, Teresina, ano 4, n. 41, maio 2000. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=820>. Acesso em: 01 abr. 2008.


Jus Navigandi - Doutrina - A razoabilidade constitucional (o princípio do devido processo legal substantivo aplicado a casos concretos)

 

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