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sexta-feira, setembro 12, 2008

Breve análise sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente

 


Breve análise sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente

Texto extraído do Jus Navigandi
http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=1645


Sírley Fabiann Cordeiro de Lima Melo
acadêmica de Direito em Recife



1. Anotações sobre a Lei nº 8.069/90

          O Século XVIII trouxe à civilização importantes conquistas. No campo tecnológico, iniciou-se a Revolução Industrial, e, com ela, o capitalismo tomou um notável impulso. No campo político, as chamadas "Grandes Revoluções" firmaram os ideais do Iluminismo como diretrizes de construção dos Estados Modernos.

          No Direito Penal, os princípios iluministas deram origem à Escola Clássica, que entendia o ser humano dotado de livre arbítrio, devendo ser punido em razão dos atos que escolheu praticar, sempre na proporção do mal que causara à sociedade. Para que houvesse punição, era preciso que o delito fosse anteriormente previsto em lei, e que ao acusado fossem dadas as garantias do devido processo legal, dessa forma legalidade eproporcionalidade constituíram-se como os princípios fundamentais dessa nova era.

          Nesta época, crianças e adolescentes eram submetidas às mesmas regras dos adultos para o julgamento e punição dos delitos praticados. Havia apenas uma idade mínima para submeter-se ao castigo (em geral por volta dos nove anos), mas o cumprimento da pena, dava-se nos mesmos locais dos adultos.

          O Século XIX assistiu ao triunfar do positivismo científico, que, no Direito Penal, trouxe a visão do criminoso como um doente social, fruto da sua constituição biológica (fatores endógenos) e do meio em que vivia (fatores exógenos), e o crime era apenas o efeito (reflexo) dessas causas. Logo, a punição do indivíduo não seria regulada pela gravidade do ato – já que não o controlava – mas sim pela necessidade de tratamento do paciente.

          Chegou-se ao extremo de se admitir que um indivíduo fosse submetido à pena sem que houvesse cometido qualquer delito, desde que apresentasse características típicas do criminoso.

          O que refreou o impulso positivista foi a importância política do princípio da legalidade penal e seus corolários (anterioridade e tipicidade), sendo consenso de que não pode existir democracia sem que o direito de punir do Estado tenha tais limitações.A derrota do nazismo e do fascismo enterrou de vez a possibilidade de submeter alguém à privação de liberdade sem que haja praticado um delito (pelo menos em tese, pois sabemos que, hoje, tem-se centenas de pessoas presas injustamente, devido à desorganização do sistema judiciário, mas esta é uma outra questão que será abordada oportunamente).

          Mas se isso funcionou para os adultos, as crianças e adolescentes teriam um tratamento diferente.

          O antigo "Direito do Menor", elaborado a partir das experiências dos chamados Tribunais dos Menores, tinha por função exercer o controle sobre determinados grupos de crianças e adolescentes, excluídos do processo de produção capitalista. A utilização do Direito Penal propriamente dito contra esses grupos, apresentava alguns empecilhos(1). Em primeiro lugar, as crianças e adolescentes excluídos, embora incomodassem a sociedade, nem sempre praticavam atos que podiam ser considerados criminosos, como, por exemplo, perambular pelas ruas.

          Um caminho possível para privar tais pessoas de sua liberdade e, conseqüentemente, "limpar as vistas" da classe mais favorecida, seria criar tipos penais que proibissem tais condutas. Mas aí surgia outro porém: para privar alguém da liberdade, em razão da prática de delito, era necessário garantir o devido processo legal, inclusive com ampla defesa através de profissional habilitado, etc. Isso demandava tempo e trabalho...

          Não sendo possível alterar-se a essência das medidas a serem aplicadas, especialmente a privação de liberdade, a solução encontrada foi mudar os nomes dados a essas medidas. Desta forma, o julgamento viroututela e a prisão virou internamento.

          Para operacionalizar esses conceitos, foram utilizados dois institutos jurídicos: a menoridade e a situação irregular. Assim, o menor em situação irregular passaria à égide do Juiz de Menores, que, em seu "favor", aplicar-lhe-ia as medidas para sua "proteção". O menor, assim, não era julgado, mas tutelado; não era condenado, mas sim protegido e não era preso, mas internado. Não se admitia que o menor fosse estigmatizado pela sentença penal, assim, exorcizava-se o juízo criminal pelos aspectos retributivo e punitivo, mas encaminhavam-se crianças e adolescentes a celas iguais às da pior carceragem, sem garantir um dos mais elementares dos direitos: o devido processo legal. Garantias como tipicidade, antijuridicidade, culpabilidade, presunção de inocência eram ignoradas, tudo em nome do superior interesse do menor.

          Até o Ministério Público quando pleiteava "internação" como resposta pela prática de atos delinquenciais, rotulados de "desvios de conduta", estava "defendendo"os interesses do menor.

          A despeito de atentarem contra a inteligência, tais conceitos perduraram em nosso direito por quase um século, e ainda constituem a base da legislação menorista em inúmeros países. Em virtude disso, as Nações Unidas promoveram amplas discussões sobre o tema e editaram, através de convenções subscritas e ratificadas por quase todos os seus integrantes, uma extensa normativa internacional.

          No Brasil, o Código de Menores, que foi substituído pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, data de 1979, justamente quando foi comemorado o Ano Internacional da Criança, com grandes promessas de melhor proteção ao menor carente, abandonado e infrator(2).

          Deflagrou-se, a partir daí, um grande movimento político, reunindo pessoas das mais diversas áreas do conhecimento, e que resultou na aprovação, pela Assembléia Constituinte, dos arts. 227 e 228 da Constituição Federal, e, posteriormente, pelo Congresso Nacional, da Lei nº 8.069/90 – o nosso Estatuto da Criança e do Adolescente.

          O novo sistema se restringe aos limites do Estado Democrático de Direito, onde as decisões judiciais para terem validade, carecem do pressuposto da fundamentação, onde os operadores têm papéis definidos: Juiz é o experto em Direito que julga de acordo com a hermenêutica; o Ministério Público, o titular das ações necessárias à defesa dos interesses da sociedade e dos incapazes e, o advogado, o representante (junto com o Ministério Público) e defensor de direitos, que atua, como os demais, na constituição do devido processo legal.

          O Estatuto da Criança e do Adolescente ("nova esperança" (3)) trasladou as garantias do Direito Penal, propiciando como resposta à delinqüência juvenil, em vez da severidade das penas criminais, medidas predominantemente pedagógicas.


2. O papel do Ministério Público no E.C.A. – Críticas

          O Ministério Público, instituição da qual fazem parte os Promotores e os Procuradores de Justiça, é essencial à função jurisdicional do Estado e a ele incumbe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis. É o que está escrito no artigo 127 da Constituição Federal.

          Ao Promotor de Justiça, entre outras atribuições, compete zelar pelo efetivo respeito aos direitos e garantias legais assegurados à criança e ao adolescente, atuando em todos os casos em que houver necessidade de defesa desses interesses, bem como nos casos em que se atribui ao adolescente a prática de ato infracional. Sim, porque não é verdade o que se costuma dizer no sentido de que nada acontece ao adolescente autor de ato infracional.

          O adolescente que pratica ato infracional é apresentado ao Promotor de Justiça que pode, dependendo da hipótese, promover o arquivamento dos autos, conceder a remissão ou representá-lo ao Juiz para aplicação de medida sócio-educativa. Essa representação dará início ao processo, no qual o adolescente poderá se defender e será sempre representado por advogado. Ao final, ao jovem poderá ser aplicada medida de proteção ou sócio-educativa.

          Entretanto, apesar de reconhecida a grandeza do Ministério Público e a sua importância, encontra-se, não raro, alguns comportamentos funcionais intoleráveis para quem exerce uma parcela da soberania estatal(4).

          Nenhum problema há com um escritor, professor ou ator, que não tenha compromisso com a realização da justiça, não é sua função, porém tal característica é incompatível com quem exerce qualquer função pública, notadamente quando revestida do poder de influir no destino das pessoas, ou melhor, no destino das pessoas que legitimam os "operadores" das leis a trabalharem em seu benefício.

          Já dizia o Ministro Luis Vicente Cernicchiaro que, "o Direito é o trânsito para concretizar o justo". De fato, é afirmado que os juristas, de uma forma geral, constituem uma elite intelectual, supostamente habilitada a encontrar ou apontar a solução justa para todo conflito. O que se vê é tal inteligência, muitas vezes, servindo como um mero produto de raciocínio lógico e matemático, despido de qualquer avaliação crítica e valorativa do caso concreto. Às vezes, culpa-se o legislador pelas suas falhas e lacunas, como se a lei não admitisse múltiplas interpretações.

          Assim o é na aplicação do Estatuto da Criança e do Adolescente. Muitas vezes, aqueles que deveriam fiscalizar e aplicar o que dispõe este diploma legal, simplesmente se esquecem da sua finalidade, qual seja a garantia de todos os direitos fundamentais e sociais, principalmente de proteção, decorrência de se encontrarem (os sujeitos daquela lei) na posição de pessoas em desenvolvimento e, ainda, qual o caráter das medidas (sócio-educativas e de proteção) ali previstas – essencialmente pedagógicas e construtivas.

          Agindo assim, não fiscalizam os estabelecimentos onde estas crianças e adolescentes ficam internados, quando é o caso de internação (é só assistir à televisão e perceber que quase toda semana há rebeliões nos "estabelecimentos destinados à recuperação" dos menores infratores), não atentando para o fato de que esses jovens lá estão para se tornarem pessoas melhores e se desenvolverem de acordo com as regras da sociedade (que muitas vezes nem são tão justas como querem aparentar); não se preocupam com o destino daquele "cheira-cola" que é posto novamente no convívio da família, muitas vezes problemática, o que se constata pelas estatísticas, sendo ela (a família) um dos maiores fatores que levam esses jovens a permanecerem nas ruas.

          Abre-se o olho quando o fato ilícito é atribuído aos adolescentes, principalmente depois do advento do ECA - posto que se criou o mito da impunidade devido às regras protecionistas que lhe formam o conteúdo -, mas fecha quando o agente da ilicitude é o poder público que não cumpre a lei; familiares negligentes e adultos corruptores.

          O Ministério Público, como defensor desses interesses, tem uma verdadeira arma poderosa – o ECA – para realizar e fazer cumprir todas as normas ali presentes. A lei está feita e é muito boa, o que falta é o compromisso, de muitos, com a sua realização, em todos os seus termos e condições.


3. Das Medidas de Proteção

          A partir do artigo 98 da Lei nº 8.069/90 (ECA) são estabelecidas medidas de proteção à criança e ao adolescente, quando estes tiverem direitos reconhecidos na Lei ameaçados ou violados, tais medidas escalonam os menores em três categorias: os carentes ou em situação irregular, os menores vítimas e aqueles que praticam atos infracionais.

          As medidas de proteção à criança e adolescente são genéricas e específicas.

          As genéricas decorrem da ação ou omissão da sociedade ou do Estado, da falta, omissão ou abuso dos pais ou responsável, e da conduta do menor, com a finalidade de protegê-lo.

          As específicas estão previstas no art. 101, incisos I a VIII, e serão determinadas pela autoridade competente.

          O primeiro caso previsto pelo art. 98 é daquelas crianças ou adolescentes que têm seus direitos violados/ameaçados por ação ou omissão da sociedade ou do Estado, tratando basicamente dos menores carentes.

          O Juiz de Menores de Brasília, Prof. José Manuel Coelho, conceitua esta categoria como "aqueles que são pobres, porque pobres são os seus pais", podendo, por isso, serem abandonados por conta da indigência dos pais, que os inabilita para o exercício do pátrio poder.

          Muitos desses menores que se tornam mendigos, no sentido exato da palavra, assim o são por falta de melhores condições materiais e até emocionais de seus pais. Estes menores "abandonados" à própria sorte,problema que não é só deles, mas de todas as nações, tornam-se "perigosos vadios", encontrando nas ruas todos os "ensinamentos" necessários para se tornarem elementos negativos e maginalizados.

          Antônio Chaves(5), em seu livro, mostra as estatísticas desastrosas destas afirmações: cerca de 20 milhões em todo o Brasil, 7 milhões só em São Paulo, o menor carente apresenta uma parcela de 17% da população. Só isso já seria mais do que suficiente para que o problema fosse encarado com maior seriedade e preocupação.

          Ressalte-se, ainda, a enorme confusão que se faz entre menor carente e menor delinqüente, esclarecendo que tal fato contribui ainda mais para a descriminação e estigmatizarão desses jovens.

          O mesmo autor se questiona a respeito do futuro das nações que não dão a devida importância aos problemas de suas crianças, justamente o segmento da população responsável por esse futuro. E conclui profetizando que, se nada mudar, nossos filhos e netos vão pagar uma conta muita cara pela nossa omissão.

          O segundo caso previsto pelo referido artigo diz respeito aos menores vítimas dos pais ou responsáveis, seja pela falta, omissão ou abuso.

          Como já foi dito anteriormente, muitas vezes os próprios pais ou responsáveis também são vítimas, fazendo, por conseqüência, de seus filhos, vítimas como eles.

          É notório o fato de que a maior parte da violência e dos maus tratos contra crianças, são cometidos por aquelas famílias de menor condição social. Na maior parte das vezes, não há estrutura familiar estabelecida e, quando há, é formada de pessoas desequilibradas moral e emocionalmente, pois como já dizia o mestre Tobias Barreto: " A dor da fome é maior do que a dor moral". Dessa forma, a criança se desenvolve em ambiente pouco propício à honestidade e ao discernimento.

          Utilizando a mesma linha de raciocínio, observamos que a última categoria abordada pelo artigo em tela, é a dos menores infratores. Ora, se o menor vive numa sociedade profundamente desumana e injusta, como exigir que ele não delinqua e tenha comportamento louvável? Como já dizia Tobias Barreto...

          Ninguém nasce menor infrator. Para se chegar à delinqüência, passa-se pelo abandono e vai dos pequenos furtos até o latrocínio.

          É por essas e outras reflexões, que o Estatuto se propõe a estabelecer medidas de proteção de caráter, essencialmente, pedagógico, levando em consideração a peculiaridade dos sujeitos-objetos das mesmas.

          O art. 101 da Lei, determina que são medidas de proteção:

I. Encaminhamento aos pais ou responsáveis à não se trata de mero documento burocrático, tendo em vista que as diretrizes são traçadas por uma equipe interdisciplinar. Aconselha-se dar preferência a essa medida, porque ela permite que o menor permaneça em seu meio natural, junto à família e na sociedade, desde que este não seja prejudicial à sua educação e desenvolvimento de sua personalidade.

          A concessão da medida está condicionada ao estudo social do caso, em que se verifique a preponderância de fatores positivos em prol da permanência do menor no lar, devendo-se atentar para a ausência de situações perigosas, bem como a certeza de que os pais são capazes de satisfazer as necessidades básicas do filho.

II. Orientação, Apoio e Acompanhamento Temporário à esta medida está implícita na primeira, o encaminhamento aos pais. Pode ocorrer tanto na família, como em estabelecimentos de educação ou aprendizagem profissional. Isto porque se sabe que nem sempre a família, instituição primeira e mais importante na formação da personalidade, está apta a oferecer condições a um perfeito desenvolvimento educacional, moral e físico ao menor, sendo que, situações de risco como a falta de investimento afetivo por parte dos pais, a sua ausência, a rejeição do filho, são casos nos quais se encontram em perigo a sua segurança, saúde e formação moral.

III. Matrícula e Freqüência Obrigatória em Estabelecimento de Ensino Fundamental à a matrícula e freqüência em estabelecimento fundamental caracterizam-se como medida de higiene social, porque previne o analfabetismo e a marginalidade. Tal medida tem em vista o fato de que, muitos atribuem à má educação ou à falência da escola, a crescente criminalidade, defendendo a tese de que a escola é um dos meios de socialização, e o seu fracasso responderá por muitos casos de delinqüência.

          De fato, a escola é o primeiro sistema oficial da sociedade com o qual o menor toma contato; através dela fará o conceito positivo ou negativo da sociedade. Entretanto, é também na escola que o menor verifica pela primeira vez se é igual ou diferente dos outros e, se essa diferença é natural ou criada pela estratificação social, gerando, daí, um complexo de inferioridade.

          Sob esse prisma, a escola pode até vir a ser a fonte de um conflito cultural, causando um comportamento anti-social, reação à inferioridade. Dessa forma, a escola deve ter muito cuidado em não acentuar esse tipo de diferença, mas tão-somente aquilo que houver em comum.

IV. Programa Comunitário à o art. 101, incisos IV e VI, prevê dois tipos de programa comunitário: um de auxílio à família e ao menor e outro de tratamento a alcoólatras e toxicômanos.

          Trata-se de instrumento eficaz da comunidade, através do qual se efetiva a participação ativa da sociedade com o Estado na execução da política social de proteção à infância e à adolescência.

V. Tratamento Médico, Psicológico ou Psiquiátrico à o tratamento tutelar, sob o enfoque médico, psicológico e psiquiátrico, é específico das medidas sócio-educativas, por se tratar de um tipo de internação provisória, visando à saúde do menor. Na aplicação desta medida, o órgão responsável terá que se certificar da eficácia e cumprimento da mesma e das condições do serviço a ser prestado, posto que se assim não o for, ter-se –ia um retrocesso ao eufemismo do antigo Código de Menores: internação para fins meramente paliativos, sem finalidade nenhuma.

VI. Orientação e Tratamento a Alcoólatras e Toxicômanos à no caso em tela, prefere-se o tratamento ambulatorial, pois está comprovada a nocividade da instituição psiquiátrica.

          O legislador teve essa preocupação porque está comprovada a correlação entre alcoolismo e criminalidade, encarando o mesmo como uma enfermidade psíquica, tratando-se, portanto, de uma patologia e, assim, devendo ser tratada como tal.

          O alcoólatra é uma pessoa dependente e, por isso, deve ser tratado como tal, necessitando de apoio psicológico e ambulatorial por um longo período.

          O álcool ou a droga não é causa de criminalidade somente quando se está sob seus efeitos, mas a própria abstinência pode levar ao crime, tendo em vista as reações orgânico-fisiológicas que acarreta. Ressalte-se, ainda, que num meio desequilibrado é muito difícil se libertar do vício, provando-se, assim, a necessidade de verdadeiro apoio e tratamento.

VII/VIII . Abrigo em Entidade/Colocação em Família Substituta à o abrigo é medida provisória e excepcional, caracterizando-se como fase de transição ou preparação para a sociedade (colocação em família substituta). Trata-se de medida inconveniente e contra-indicada para a formação da personalidade do menor. Entretanto, é um mal necessário e provisório, posto que na maioria das vezes, quando se determina a colocação do menor em família substituta, é porque a família natural realmente não tinha condições de educar e manter o menor. Ressaltando que, o menor só deve ser internado em último caso.


4. Das Medidas Sócio-Educativas

          As medidas sócio-educativas destinam-se ao menor "delinqüente". Entretanto, as medidas de proteção também são medidas sócio-educativas, sendo que o que distingue as duas espécies é que as primeiras são aplicadas pelo Conselho Tutelar, enquanto que as segundas pelo Juiz de Menores.

          São modalidades do tratamento tutelar: o institucional, o de semiliberdade (meio aberto) e o meio livre. Das medias do art.112, incluem-se em meio aberto a advertência, reparação do dano, prestação de serviços à comunidade; em regime meio aberto, as de inserção em regime aberto ; e como fechado, a de internação em estabelecimento educacional.

          A advertência (art. 115) é a primeira medida judicial aplicada ao menor que delinqüe e, consiste numa entrevista do mesmo com o Juiz, tendo sentido essencialmente educativo. Não se trata de simples "conversa de rotina", tendo em vista que dela resultará um termo de advertência, no qual estarão contidos os deveres do menor e as obrigações do pai ou responsável, com vista a sua recuperação, sendo-lhe permitido permanecer em seu meio natural.

          O art. 116 prevê a obrigação de reparar o dano, com finalidade essencialmente educativa, despertando e desenvolvendo o senso de responsabilidade do menor em face do que não lhe pertence. Entretanto, deve-se ter em vista que tal medida será muito pouco aplicada, porque a grande maioria de menores que praticam atos infracionais, é de famílias bem pobres e que não têm condições de reparar o dano que causaram. Para casos assim, o parágrafo único do citado artigo prevê a substituição dessa medida por outra adequada, ficando ao arbítrio do Juiz.

          Uma alternativa que pode ser dada a esses casos é a prestação de serviços à comunidade, prevista pelo art. 117. Tal medida, ao meu ver, é das mais eficazes, pois ao se encontrar trabalhando (prestando serviços), o menor, sente-se útil e inserido dentro da sociedade (dos meios de produção), de forma que, em não ficando ocioso, não tem tempo para pensar na descriminação que recai em si próprio; ter contato com elementos perversos e corruptores, sem falar que está colaborando, de certa forma, para a melhoria de uma sociedade que não deixa de ser sua. Alguém já disse que o trabalho engrandece o homem.

          Há casos de menores infratores que não comportam total liberdade de ação, sendo que, mesmo que permaneça em meio à sociedade, necessitam de maior fiscalização e acompanhamento. É o que prevê o art. 118, na liberdade assistida.

          Aqui, o menor não é privado do convívio familiar o que é muito saudável (em alguns casos), sendo que sua liberdade e alguns de seus direitos são limitados, tendo em vista a reeducação e a não reincidência.

          Sob o enfoque das ciências humanas, a liberdade assistida se caracteriza como modalidade de tratamento tutelar em meio livre, com prévio estudo médico-psicológico e social, elaboração do programa de tratamento e execução por pessoal especializado.

          A liberdade assistida deve ser aplicada aos adolescentes reincidentes ou habituais na prática de infrações e que demonstrem tendência para reincidir, já que os primários devem ser apenas advertidos, com a entrega aos pais ou responsável.

          Tal medida não comporta prazo máximo, devendo perdurar enquanto houver necessidade da assistência.

          O art. 120 prevê o regime de semi-liberdade, ou melhor, dois regimes de semi-liberdade: o que é determinado desde o início, e o que representa a transição para o meio aberto.

          No primeiro tipo, semi-liberdade propriamente dita, o menor passará da instituição para a liberdade. No segundo tipo, que é o semi-internato, o menor passa da liberdade para a instituição, onde o "menor" deveria passar o dia trabalhando externamente e só se recolher à noite ao estabelecimento.

          A aplicação da medida de regime de semi-liberdade deve ser acompanhada de escolarização e profissionalização obrigatórias.

          Convém salientar que, tal medida pressupõe casas especializadas e preparadas para o recebimento desses jovens e, infelizmente, não se dispõe dessas casas para o recolhimento dos jovens, como forma de transição para o regime aberto, que seria o da liberdade assistida.

          Ora, não existem "prisões suficientes, casas de albergado, recolhimento de menores e abrigos de velhos, e demais prédios indispensáveis, previstos em diversas leis (...). Os próprios legisladores têm conhecimento de nossa realidade ao promulgarem determinada lei, mas assim mesmo a aprovam, conscientes de que não será devidamente cumprida, o que concorre para que seja desmoralizada, tornando-se inexeqüível" (6).

          O problema está no fato de que nossos governantes sofrem pressões de todos os lados, de forma que têm de responder às reivindicações da população de alguma forma, sendo que a solução por eles encontrada é a edição de leis que muitas vezes não têm como serem cumpridas e não passam de letra morta(7).

          A comunidade tem papel de relevância, na medida que cobra do Estado a execução correta das leis, porém nada terá sucesso se não houver verbas e recursos públicos, indispensáveis ao sucesso de qualquer programa assistencial.

4.1. A co-responsabilidade do Estado e da Sociedade frente à marginalidade

          A criança, de uma forma geral, é credora de proteção integral em razão de sua condição de pessoa em desenvolvimento e necessita de prioridades, de proteção e socorro, no atendimento dos serviços públicos ou de relevância pública, na preferência da formulação e execução das políticas sociais públicas e destinação privilegiada de recursos.

          Contudo, o que se vê são criança nas ruas, sem condição nenhuma de sobrevivência digna, desenvolvimento, saúde ou educação. Todos os dias presenciamos crianças e adolescentes perambulando pelas ruas, como verdadeiros mendigos e a nossa reação é de medo, na maioria das vezes, desprezo e até mesmo "asco".

          Ressalte-se que o medo que sentimos, não é pelo que essas crianças irão se tornar no futuro(8) não muito distante, mas de sermos lesados em nosso patrimônio, pegarmos alguma doença, etc. Que visão pequena e egoísta!

          De fato, a violência dentre os "pequenos" é muito comum e, é natural que temamos pela nossa integridade física. Entretanto, é absurdamente anormal a nossa condescendência, podia-se dizer até "criminosa", com a situação de inteiro abandono e miséria daqueles, repito, que são responsáveis pelo futuro de nossos filhos e netos.

          O Estado é responsável pela política de bem-estar do menor, porém a sociedade tem que se conscientizar da sua co-responsabilidade, sob pena de malogro na realização dessa política social, que visa a resgatar a infância abandonada.

          A co-responsabilidade da sociedade funda-se em sua própria culpa na "gênese" do abandono e marginalidade da infância, a começar pela falta de escrúpulos na escolha daqueles responsáveis pela feitura das leis de proteção ao menor, passando pela falta de cobrança destes mesmos indivíduos. Sim, porque que nós que somos alfabetizados e, na maioria das vezes, muito bem informados, temos a obrigação de reivindicar os direitos daqueles que não tiveram as mesmas chances que nós. É nosso dever moral contribuir com o mínimo para a construção de uma Nação, no sentido exato da palavra.

          Ressalte-se, ainda que, muitas das vezes que crianças ou adolescentes delinqüem, tem um adulto como orientador e mentor desses "crimes". Dessa forma, criança e adolescentes = autores de delitos, são vítimas (quase sempre) da ação violenta e covarde de adultos , contudo a opinião pública é levada a olhar para essas vítimas como agentes exclusivos de violência.

          A sociedade e o Estado agiriam mais "decentemente" se resolvessem ou, pelo menos, tentassem resolver este problema começando pela sua causa, pois se deveria agir "contra os adultos que corrompem crianças ao invés de continuá-las segregando, atribuindo-lhes a responsabilidade pela violência que as vitimiza".

4.2. A imputabilidade Penal x imputabilidade Estatutária

          O Direito Penal encara o crime como uma violação das normas de comportamento estabelecidas no Código e leis complementares. Tais normas têm o objetivo de conceituar, reprimir e penalizar ações ou omissões anti-sociais.

          A imputabilidade penal, normalmente de todos, não incide em duas hipóteses: em razão (exclusivamente) da idade (menos de dezoito anos) ou por ausência da capacidade de entender o caráter ilícito do fato e determinar-se segundo este entendimento.

          O critério dos 18 anos é de política criminal, nada tem a ver com capacidade ou incapacidade de discernimento, ou seja, "admitir que a imputabilidade (penal-comum) aos 18 anos se baseia na falta de entendimento do caráter ilícito, anti-social ou reprovado dos crimes, implica comparar adolescentes a insanos mentais, o que nada tem de "coerente" (9).

          Observe-se, assim, que a idade é critério adotado para melhor execução de política criminal, pois a criminologia concluiu resultar por demais danoso aos próprios fins de prevenção e repressão da criminalidade, submeter crianças e jovens ao sistema carcerário comum destinado aos adultos, sendo que isto não implica impunidade aos jovens, mas tão-somente que aos adolescentes (12 a 18 anos) não se pode imputar responsabilidade frente à legislação comum, mas pode-se atribuir responsabilidade com base nas normas do Estatuto, respondendo pelos delitos que praticarem e submetendo-se às medidas sócio-educativas (de caráter penal especial), que têm caráter pedagógico apresentando-se como respostas justas e adequadas, de boa política criminal, à prática de crimes por jovens.

          Reconhece-se, não é de hoje, a falência dos sistemas penitenciários. A pena privativa de liberdade não reeduca, ressocializa ou cumpre qualquer das suas funções de reintegração do preso à sociedade, mas ao contrário, perverte, deforma e corrompe. Dessa forma, encaminhar jovens a tal sistema seria concorrer para o aumento e não diminuição da criminalidade.

          Entretanto, não se conclua que as medidas sócio-educativas são brandas e flexíveis, posto que não configura a verdade. Tais medidas não deixam de ter o caráter sancionatório e retributivo das penas impostas pelo Código Penal. A diferença reside no caráter pedagógico das mesmas e na preocupação verdadeira de recuperação, ressocialização e reintegração do menor delinqüente na sociedade, utilizando-se, para isso, de alternativas outras que não somente a pena de prisão.

          Isto posto, acreditamos na proposta oferecida pelo ECA como tentativa de melhorar a qualidade de vida nossa e, sobretudo desses pequenos cidadãos, que muitas vezes são tão vítimas quanto nós, seja por meio das medidas sucintamente expostas ou por meio de melhor fiscalização das leis, enfim o primeiro passo para uma solução já está dado, o resto depende de nós.


Notas

  1. NOGUEIRA, Paulo Lúcio, Estatuto da Criança e do Adolescente Comentado, p. 4.

  2. Expressão de Paulo Lúcio Nogueira, op. cit.

  3. A Quem Servimos?, Rogério Schietti Machado Cruz – Promotor de Justiça do MPDFT

  4. CHAVES, Antônio, Comentários ao Estatuto da Criança e do Adolescente, p. 457.

  5. NOGUEIRA, Paulo Lúcio, op. cit., p. 187.

  6. Observe-se que, para tentar diminuir a criminalidade, em 1990 foi promulgada a Lei de Crimes Hediondos (Lei nº 8072/90), sendo que de lá para cá a violência só aumentou. Por quê? Porque não adianta fazer leis severas, aumentar a quantidade de crimes a serem previstos, etc., deve-se investir em prevenção, ou seja, colocar polícia na rua, fiscalizar, dar condições à sociedade para coibir a criminalidade, pois aumentar quantidade de pena não faz o delinqüente parar de delinqüir.

  7. Quem assistiu às manchetes de jornais há poucos dias atrás, pôde constatar o que acontece com crianças desprezadas que se tornam adultos revoltados, tendo em vista o caso do MENOR DE RUA SOBREVIVENTE DA CHACINA DA CANDELÁRIA que seqüestrou e matou uma jovem num ônibus no Rio de Janeiro.

  8. SILVA, Antônio Fernando do Amaral , Mandar jovens de 16 anos para o sistema carcerário vai resolver a questão da violência e criminalidade?, p. 2.


Sobre a autora


Sírley Fabiann Cordeiro de Lima Melo

E-mail: Entre em contato


Sobre o texto:
Texto inserido no Jus Navigandi nº45 (09.2000)
Elaborado em 08.2000.


Informações bibliográficas:
Conforme a NBR 6023:2000 da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto científico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma:
MELO, Sírley Fabiann Cordeiro de Lima. Breve análise sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente . Jus Navigandi, Teresina, ano 4, n. 45, set. 2000. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=1645>. Acesso em: 12 set. 2008.


 

Breve análise sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente

 

segunda-feira, junho 02, 2008

BDJur no STJ: A incongruência normativa em relação à maioridade no ordenamento jurídico brasileiro

 

Título: A incongruência normativa em relação à maioridade no ordenamento jurídico brasileiro

Autores: Silva, Nádia Cristina de Campos e

Data de Publicação: 2008

URL: http://bdjur.stj.gov.br/dspace/handle/2011/17150

Palavras-chave: Maioridade, Responsabilidade civil, Responsabilidade penal, Direitos do menor

 

Resumo: 
A definição de maioridade no ordenamento jurídico brasileiro sofre de incongruência em relação aos critérios adotados na elaboração das diversas normas que se referem ao menor. Do ponto de vista civil, elementos fisiológicos e eventos sociais são capazes de determinar sua emancipação; já do ponto de vista penal e sob a ótica da proteção à infância, apenas a idade cronológica é tomada como parâmetro na determinação do desenvolvimento individual. Tendo em vista que a determinação da maioridade é elemento convencional e de cunho eminentemente cultural, faz-se necessária uma harmonização entre os dispositivos normativos, com o fito de dirimir tal incongruência.

 

Referência: 
SILVA, Nádia Cristina de Campos e. A incongruência normativa em relação à maioridade no ordenamento jurídico brasileiro. [Brasília, DF], [2008?]. 14 f. Artigo científico apresentado como requisito para obtenção do título de Especialista em Direito Público. – Fórtium Centro de Estudos Jurídicos.
SILVA, Nádia Cristina de Campos e. A incongruência normativa em relação à maioridade no ordenamento jurídico brasileiro. Artigo científico apresentado como requisito para obtenção do título de Especialista em Direito Público. – Fórtium Centro de Estudos Jurídicos. BDJur, Brasília, DF, 28 maio 2008. Disponível em: http://bdjur.stj.gov.br/dspace/handle/2011/17150.

Descrição:
Artigo científico apresentado como requisito para obtenção do título de Especialista em Direito Público. – Fórtium Centro de Estudos Jurídicos.

 

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Trabalhos de Conclusão de Curso e Monografias

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BDJur no STJ: A incongruência normativa em relação à maioridade no ordenamento jurídico brasileiro

 

 

sexta-feira, maio 23, 2008

MP-PB lança campanha para combater abuso e exploração sexual contra crianças e adolescentes - Observatório da Criminologia (Prof. Lélio Braga Calhau)

 

Segunda-feira, 19 de Maio de 2008

MP-PB lança campanha para combater abuso e exploração sexual contra crianças e adolescentes

O Ministério Público da Paraíba realizará nesta segunda-feira (20) a 1ª Conferência Regional de Combate ao Abuso e Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes no Vale do Mamanguape. A Conferência será aberta às 8h30, na Escola Estadual João Fernandes de Lima, na cidade de Capim, com a palestra da professora Maísa Kilma de Lima Gondim.

 

De acordo com a Promotora de Justiça de Mamanguape, Ana Maria de França Coutinho, a proposta é fazer um enfrentamento no combate ao abuso e a exploração sexual de crianças e adolescentes nos municípios que formam o Vale do Mamanguape, tendo em vista ser essa região local de grande incidência de casos.

 

Na segunda-feira à tarde será realizada uma caminhada para mobilizar a população e conscientizar da necessidade de se lutar contra o abuso sexual. Na terça-feira, será lançado o Projeto Menina Abusada, com a apresentação da peça, nos municípios de Itapororoca e Mataraca.

 

Por fim, na quarta-feira, será realizado um pedágio na BR que corta o município de Mamanguape. "Nós pretendemos parar todos os caminhoneiros, que é o nosso principal foco, para panfletar e orientar que a prostituição de crianças e adolescentes é crime. Vamos panfletar e utilizar carros de som nesse pedágio", relatou a Promotora de Justiça.

 

Assessoria de ImprensaMinistério Público - PB(83) 2107.6015

Observatório da Criminologia (Prof. Lélio Braga Calhau)

 

 

terça-feira, maio 06, 2008

Projeto "Depoimento Sem Dano" - Observatório da Criminologia (Prof. Lélio Braga Calhau)

 

Segunda-feira, 5 de Maio de 2008

Projeto "Depoimento Sem Dano"

 

O projeto Depoimento Sem Dano (DSD) foi implantado na 2ª Vara da Infância e da Juventude de Porto Alegre (2ª VIJ -- Porto Alegre), em maio de 2003, com o intuito de evitar que a criança ou adolescente vítima de abuso sexual passasse por mais de uma inquirição durante o processo judicial. Introduzindo recursos como câmeras filmadoras e equipamentos de gravação em audiências, o projeto tem como principal objetivo promover a proteção psicológica da criança vítima de violência sexual, evitando seu contato com o acusado e a repetição de interrogatórios. Elogiado por profissionais da área do Direito, o projeto encontra-se em expansão, com vistas a ser aplicado em todo o país.Autor: Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul

 

 

Postado por Observatório da Criminologia

 

Observatório da Criminologia (Prof. Lélio Braga Calhau): Projeto "Depoimento Sem Dano"

 

terça-feira, abril 29, 2008

Violência doméstica lidera ranking de agressões contra crianças e adolescentes

 

28/4/2008

Violência doméstica lidera ranking de agressões contra crianças e adolescentes

 

Os pais são os principais agressores contra crianças e adolescentes. A constatação pode ser vista na página da internet que mantém atualizadas as denúncias dos Conselhos Tutelares de todo o país, enviadas ao Sistema de Informação para a Infância e Adolescência (Sipia). São 186.415 registros, de 1999 até hoje.

 

Também constata-se que os números de agressões contra crianças e adolescentes são altos pelo Disque 100, sistema que permite que qualquer um faça denúncias, inclusive anônimas. Em números absolutos, os casos de agressão por negligência ou agressão física e psicológica são 54.889 dos 111.807 registros. Isso representa 67,40% do total. Entre os registros, 242 são denúncias de violência com morte da criança ou do adolescente.

 

Diante do índice, especialistas em questões da infância, consideram que episódios como o da menina Isabella Nardoni, que morreu aos 5 anos, causando comoção por ter causas ainda desconhecidas, são mostras de um país ainda tolerante com a agressão contra crianças e adolescentes.

 

Para o integrante do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda), Ariel de Castro Alves, os dados revelam que a violência contra a infância é generalizada no Brasil e que há muita tolerância para com ela – o que faz com que as pessoas se sintam menos à vontade para denunciar.

 

“Devemos tratar do caso da menina Isabella e, a partir dele, refletir com toda a sociedade brasileira. Os números mostram que a violência contra a infância e a juventude é generalizada e, muitas vezes, a violência ocorre exatamente nos locais em que elas deveriam receber proteção, que são os lares, escolas e creches”, disse.

 

A coordenadora do Programa de Enfrentamento à Violência Sexual contra a Criança e o Adolescente da Secretaria de Direitos Humanos, Leila Paiva, concorda com o conselheiro do Conanda. Para ela, o que contribui para a manutenção deste quadro é a falta de iniciativa de quem observa a violência, mas não denuncia.

 

“Existe um pensamento no imaginário popular de que não devemos interceder em problemas que ocorrem no âmbito familiar, o que é um equívoco. Mas, ao mesmo tempo, eu penso que o aumento dos registros no Disque 100 é pelo fato dele garantir o anonimato e a distância das pessoas”, analisou a coordenadora.

 

Ariel Alves, do Conanda, retoma a questão do papel da sociedade: “Não é só a família a responsável por garantir os direitos da infância e juventude, o próprio Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) diz que é um dever de todos: da família, do Estado e de toda a sociedade brasileira.”

 

A média de utilização do Disque 100, desde que foi implantado em 2003 até hoje, é crescente. Começou com 12 relatos por dia, passou para 38 em 2006 e chegou a 69 em 2007. Até março deste ano, foram contabilizados em torno de 93 casos diariamente.

 

Os dois especialistas atribuem o crescimento do número de denúncias à sensibilização de todos da importância em não se calar diante dos casos de agressão a crianças e a adolescentes. Para ambos, não se trata de aumento dos casos de agressão.

 

Alves citou estudo da Universidade de São Paulo sobre o tema: “Uma pesquisa do Laboratório de Estudos da Criança da USP, feito entre 1996 e 2007, diagnosticou a existência de 159.754 casos de violência doméstica. E também concluiu que aproximadamente 10% dos casos de abusos e violência contra crianças e adolescentes são denunciados.”

 

Morillo Carvalho

Agência Brasil

Violência doméstica lidera ranking de agressões contra crianças e adolescentes

 

quinta-feira, abril 10, 2008

Google deve informar conteúdo de álbuns fechados - Jusvi

 

Google deve informar conteúdo de álbuns fechados

 

O Grupo de Combate a Crimes Cibernéticos do Ministério Público Federal em São Paulo (MPF/SP) concedeu o prazo de 48 horas para que a empresa Google Brasil informe quais dos 3.261 álbuns de fotografia do Orkut com conteúdo bloqueado por usuários denunciados pela ONG Safernet contêm fotos de pornografia infantil. A notificação foi enviada ao presidente da empresa, Alexandre Hohagen, e o prazo se encerra amanhã (quarta-feira), mesmo dia previsto para que o MPF/SP e a empresa deponham à CPI da Pedofilia, instalada no Senado Federal.


A publicação, em qualquer mídia, de imagens de pornografia com crianças e adolescentes é crime previsto pelo artigo 241 do Estatuto da Criança e do Adolescente. A pena é de 2 a 6 anos de prisão. Entretanto, o novo recurso de privacidade criado pelo Orkut, da Google, impede o acesso do Ministério Público e da Polícia a tais álbuns, impedindo a investigação do delito e, portanto, garantindo a impunidade dos autores.


A ONG Safernet Brasil, por meio do site www.denunciar.org.br (canal oficial de denúncias conveniado ao MPF) recebeu denúncias contra 3.261 diferentes álbuns de fotografias fechados do Orkut. Estes álbuns estão, na maioria das vezes, em perfis falsos feitos por pedófilos para divulgar álbuns de fotos com esse tipo de conteúdo.


Com os álbuns fechados, apenas pessoas autorizadas pelo criador da página acessam as fotos, criando um ambiente para troca dessas imagens entre pedófilos. Mas os usuários do Orkut percebem que tipo de conteúdo há nesses álbuns e os denunciam, já que a página principal desses perfis geralmente são ilustradas com fotos de crianças nuas.



Notificação
– No documento enviado à Google Brasil, o procurador da República Luiz Fernando Gaspar Costa, coordenador substituto do Grupo de Combate aos Crimes Cibernéticos do MPF/SP, alerta que “somente a empresa tem acesso ao conteúdo publicado”. Na notificação, além das informações sobre as páginas denunciadas, o MPF/SP pede que a Google Brasil preserve “todas as evidências necessárias” (logs de acesso, dados do usuário e fotografias que estavam nos álbuns).


Após as denúncias, vários desses perfis com álbuns fechados são retirados do ar pela Google, entretanto o MPF/SP quer a garantia de que a materialidade dos crimes seja preservada para que os responsáveis possam ser investigados e punidos. Caso a Google Brasil não atenda a notificação, o MPF/SP poderá responsabilizar a empresa civil e criminalmente.


No último dia 1º de abril, a procuradora da República Fernanda Teixeira Souza Domingos Taubemblatt notificou a empresa para preservar todo o conteúdo das quase 100 mil páginas denunciadas comunicadas pela Safernet Brasil nos anos de 2006 a 2008, e informar quais dos conteúdos denunciados continham indícios de crimes e/ou violação aos direitos humanos e fundamentais, conforme a lei brasileira. O MPF/SP notificou também empresa a informar quantos e quais casos de pornografia infantil foram reportados ao órgão americano National Center for Missing and Exploited Children (NCMEC).



CPI
– Amanhã, 8 de abril, às 9h, os procuradores da República Sergio Gardenghi Suiama e Luiz Fernando Gaspar Costa , coordenadores do Grupo de Combate a Crimes Cibernéticos do MPF/SP, vão depor à CPI da Pedofilia. No último dia 3, procuradores do grupo enviaram ofício ao presidente e ao relator da CPI, senadores Magno Malta e Demóstenes Torres, se colocando à disposição para colaborar com os trabalhos da comissão.


Criado em 2003, o grupo foca seu trabalho em dois crimes contra os direitos humanos muito cometidos na rede e cuja atribuição é federal: pornografia infantil e racismo. Os oito procuradores do grupo se dividem atualmente sobre cerca de 500 investigações e processos criminais que tramitam na Justiça Federal de São Paulo (o número de procuradores do grupo e de casos cresceu exponencialmente com o advento do Orkut).


Na esfera cível, o grupo atua junto aos provedores de serviços de internet, com a missão de assegurar que as empresas adotem medidas adequadas de prevenção e colaboração com as autoridades. Em 2005, os maiores provedores brasileiros, UOL, IG e Terra, assinaram termo de compromisso de integração operacional com o MPF/SP, que estabelece, entre várias medidas, prazo mínimo para preservação de evidências.


No documento enviado à CPI, os procuradores relatam que o Brasil não é um país produtor de pornografia infantil comercial, mas que “é certo afirmar que criminosos brasileiros têm se utilizado cada vez mais da Internet para distribuir e trocar pornografia infantil, bem como para assediar e aliciar crianças online”.


Entre 2006 e 2007, a ONG Safernet registrou um aumento de 126,03% nas denúncias de pornografia infantil na internet. De 121.358 denúncias, o patamar subiu para 267.470 em apenas um ano. Desse total de denúncias, 86% refere-se ao Orkut, que hoje é o principal serviço privado de internet acessado por brasileiros.


“Cerca de 30 milhões de usuários nacionais integram hoje a rede de relacionamentos mantida pela Google, o que justifica plenamente a atuação estatal no sentido de obrigar a empresa a engajar-se de forma mais efetiva no combate à pornografia infantil praticada em seus serviços”, afirmam os procuradores no documento enviado à CPI.



Ação
– Nesse sentido, o MPF/SP ajuizou em agosto de 2006, ação civil pública contra a Google Brasil para obrigar a empresa a preservar e encaminhar dados solicitados pela Justiça Brasileira, sob pena de multa diária de 200 mil reais por processo e indenização por danos morais coletivos no valor de 130 milhões de reais em caso de condenação.

 

Decisão liminar obrigou a Google a entregar os dados, mas a empresa obteve efeito suspensivo no Tribunal Regional Federal da 3ª Região.


A ação está relatada para sentença, mas o MPF/SP e a Google tentam uma solução amigável desde outubro de 2007, quando a empresa constituiu novos advogados e criou um departamento jurídico no Brasil, mas o diálogo não avança sobre cinco tópicos que o MPF considera fundamentais:


a) tempo de preservação de provas: o MPF/SP quer a preservação de dados por pelo menos três anos, a Google insiste em apenas 30 dias;
b) preservação e encaminhamento da provas (sobretudo das imagens de pornografia infantil postadas);
c) desenvolvimento de filtros para impedir a publicação de pornografia infantil;
d) implementação de um serviço efetivo de atendimento ao consumidor nacional, inclusive por meio de um serviço de telefone 0800;
e) acesso das autoridades públicas aos álbuns fechados.

 

Fonte: Procuradoria Geral da República (PGR) »

 

Revista Jus Vigilantibus, Terça-feira, 8 de abril de 2008

Jusvi

 

quarta-feira, março 12, 2008

Ministério Público da Paraíba promoverá fórum para debater o bullying. Promotor Lélio Calhau (MG) é um dos palestrantes confirmados. - Observatório da Criminologia (Prof. Lélio Braga Calhau)

 

Quarta-feira, 12 de Março de 2008

Ministério Público da Paraíba promoverá fórum para debater o bullying. Promotor Lélio Calhau (MG) é um dos palestrantes confirmados.

Promotora de Justiça Soraya Escorel, organizadora do Fórum e da campanha anti-Bullying


O Ministério Público da Paraíba lançará nos dias 28 e 29 deste mês uma campanha educativa para combater o bullying nas escolas privadas e públicas do Estado. O lançamento acontecerá durante o I Fórum Paraibano Sobre Bullying Escolar e Incentivo à Cultura de Paz, que será realizado no Centro de Convenções Cidade Viva, em João Pessoa e está sendo organizado pela Curadoria da Infância e Juventude.

 

Entre os palestrantes estão a doutora em violência, Cléo Fante, autora do livro "Fenômeno Bullying", Lélio Braga Calhau, Promotor de Justiça (MG) e criminólogo; Guilherme Shelb, Procurador da República e autor do livro “Violência e Criminalidade na Juventude” e José Augusto Pedra - presidente do Centro Multidisciplinar de Estudos e Orientação sobre o Bullying Escolar (Cemeobes).

 

Da Paraíba participarão do fórum, como palestrantes, a promotora de Justiça Fabiana Lobo, e o juiz da Infância e Juventude, Fabiano Moura de Moura. Durante o evento será lançada uma cartilha anti-Bullying, que foi elaborada pela Curadoria da Infância e da Juventude. De acordo a curadora da Infância e Juventude Soraya Escorel, organizadora do Fórum e da Campanha anti Bullying, a proposta do Ministério Público é envolver as escolas da rede particular e pública de ensino de João Pessoa.

 

Os temas a serem debatidos durante o I Fórum Paraibano Sobre Bullying Escolar e Incentivo à Cultura de Paz são “Bullying Escolar”, a “Construção da Cidadania, Causas e Consequências do Fenômeno do Bullying - Implicações Psicológicas”, e “Implicações Jurídicas e Legislação Pertinente”.

 

Juízes, promotores, advogados, estudantes de Direito, psicólogos e pedagogos do Brasil inteiro já manifestaram a intenção de estar presente ao evento, que servirá de exempl0o para o Brasil e para o mundo, pela dimensão e organização”, declarou Soraya Escorel. Ela observou que maiores informações poderão ser obtidas na Curadoria da Infância e Juventude da Capital através do telefone 2107-6124, no horário das 13h00 às 17h00.

 

A Promotora da Infância e Juventude Soraya Escorel, desde o ano passado, após o episódio ocorrido numa escola da Capital, passou a se dedicar ao estudo do assunto bullying. “Nós estamos cientes da responsabilidade que tem o Ministério Público com a prevenção à violência e de esclarecer a sociedade como um todo que o foco do problema não poderá ficar restrito a responsabilização, em face de uma conduta reprovável, mas alertar para a importância de se conhecer o problema e preveni-lo”, afirmou Soraya, acrescentando que “daí iniciou-se uma cruzada no enfrentamento da temática dos problemas decorrentes do bullyng, e, principalmente, na adoção de medidas preventivas ao seu combate”.

 

Observatório da Criminologia (Prof. Lélio Braga Calhau): Ministério Público da Paraíba promoverá fórum para debater o bullying. Promotor Lélio Calhau (MG) é um dos palestrantes confirmados.

 

quarta-feira, fevereiro 20, 2008

ECA. Hospedagem de menor em hotel ou estabelecimento congênere. Multa. Cabimento. :: Jurid Publicações Eletrônicas ::

 

ECA. Hospedagem de menor em hotel ou estabelecimento congênere. Multa. Cabimento.

Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul - TJRS.


Apelação cível. ECA. Hospedagem de menor em hotel ou estabelecimento congênere. Multa. Cabimento.


Comprovada a hospedagem de adolescente, desacompanhado dos pais ou responsável ou sem autorização escrita destes, em hotel, havendo inclusive indícios de exploração sexual de menor, é de rigor a fixação da multa, que vai mantida integralmente porquanto não há comprovação da alegada miserabilidade de apelante.


NEGARAM PROVIMENTO.
Apelação Cível
Oitava Câmara Cível
Nº 70022109987
Comarca de Porto Alegre
APELANTE: O.P.P.
APELADO: M.P.


ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos.
Acordam os Desembargadores integrantes da Oitava Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em negar provimento ao apelo.
Custas na forma da lei.
Participaram do julgamento, além do signatário (Presidente), os eminentes Senhores DES. CLAUDIR FIDÉLIS FACCENDA E DES. JOSÉ ATAÍDES SIQUEIRA TRINDADE.
Porto Alegre, 13 de dezembro de 2007.
DES. RUI PORTANOVA,
Relator.


RELATÓRIO
Des. Rui Portanova (RELATOR)
Apelação interposta por OSWALDO contra sentença que julgou procedente a representação que lhe foi oferecida pelo MINISTÉRIO PÚBLICO, aplicando-lhe a multa de 20 salários mínimos, que será revertida ao Fundo Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente.
O apelante pede a improcedência da representação, ou a redução do valor da multa.
Vieram contra-razões pela manutenção da sentença.
O Ministério Público manifesta-se pelo improvimento do recurso.
Registro que foi observado o disposto nos artigos 549, 551 e 552, do Código de Processo Civil, tendo em vista a adoção do sistema informatizado.
É o relatório.


VOTOS
Des. Rui Portanova (RELATOR)
Alegou o apelante que não permitiu e nem permite a hospedagem de criança ou adolescente em seu hotel. Aduz que há ordem expressa no sentido de ser proibida a entrada de crianças e adolescentes no estabelecimento, havendo inclusive placa de advertência constando tal proibição.
Disse que os policiais teriam armado um flagrante. Afirma que não foi omisso e não agiu com dolo, bem como não foi conivente com seu empregado, que, no momento do fato, era o garantidor da situação.
Adoto como razões de decidir o bem lançado parecer da lavra do eminente Procurador de Justiça, Dr. Antonio Cezar Lima da Fonseca, verbis:
O recorrente não nega que em 03 de abril de 2003, por volta das 17 horas, no quarto de n. 03 do Hotel Marechal Floriano, localizado Rua Marechal Floriano, n. 573, Centro, nesta cidade, o adolescente M. S. S., com 13 anos de idade, esteve sob exploração sexual comercial (sic, fl. 03).
Pretende o apelante, em resumo, ver-se exonerado da multa que lhe foi aplicada, ou, alternativamente vê-la reduzida, sob o argumento de que não permite ou permitiu que crianças ou adolescentes hospedem-se em seu estabelecimento comercial, bem como não teria ele se omitido ou agido com dolo relativamente ao fato descrito na representação, cuja responsabilidade atribui ao seu funcionário, Anápio.
O recorrente é o proprietário do hotel onde ocorreram os fatos, de sorte que sua linha de argumentação não tem o condão de afastar-lhe a responsabilidade, consoante previsão do art. 250 do Estatuto da Criança e do Adolescente, que estabelece que constitui infração administrativa:
Art. 250. Hospedar criança ou adolescente, desacompanhado dos pais ou responsável ou sem autorização escrita destes, ou da autoridade judiciária, em hotel, pensão, motel ou congênere.
Acerca do tema, ensina Wilson Donizeti Liberati(1) que o precitado dispositivo legal consiste em violação art. 82 do ECA, que proíbe a hospedagem de criança ou adolescente em hotel, motel, pensão ou estabelecimento congênere, salvo se autorizado ou acompanhado pelos pais ou responsável, cujos sujeitos ativos dessa infração são os proprietários ou dirigentes dos hotéis, motéis e pensões ou estabelecimentos que se destinam a hospedagem.
Ao seu turno, comentando o dispositivo legal em apreço, esclarecedora é a lição de José Luiz dos Reis: (2)
O disposto neste artigo faz com que o proprietário do estabelecimento se preocupe em agir em conformidade com o determinado na lei, pois sofrerá multa e, em caso de reincidência, poderá ser determinado o fechamento do estabelecimento por até 15 dias caso a criança ou adolescente seja hospedado sem as devidas medidas necessárias.
Essas disposições têm caráter intimidativo, pois agindo o proprietário de acordo com as mesmas, estará ele contribuindo para que não haja casos de violência em motéis (o estupro) e prevenindo a exploração física e moral (como exemplo, a prostituição).
Quando observadas essas determinações do artigo supra-referido, nota-se a preocupação do legislador em assegurar a integral proteção à criança e ao adolescente, fazendo com que os proprietários de hotel, pensão ou congênere não sejam negligentes quando da hospedagem, requerendo as formalidades necessárias.
Assim, a incidência da norma administrativa em exame não passa pela verificação do dolo ou da culpa do agente como sugere o recorrente, mas tão-somente pela voluntariedade da ação, tal como havia mencionado o juiz a quo na sentença das fls. 293/6 (autos em apenso).
E, na hipótese em exame, vê-se claramente que o apelante tenta atribuir a responsabilidade pelo ocorrido ao seu funcionário Anápio:
Como sabido, o empregado - ANÁPIO (que se encontrava no momento na portaria do hotel) tinha a OBRIGAÇÃO E O DEVER de não aceitar adolescentes no estabelecimento (como ele próprio confirma). NO MOMENTO DO FATO, ELE ERA O GARANTIDOR DA SITUAÇÃO. Pois, naquele momento era de sua responsabilidade a entrada de hóspedes e a proibição da hospedagem do menor. (sic,fl. 362).
Veja-se, nessas poucas linhas, que o próprio recorrente reconhece e tem perfeita ciência de sua responsabilidade quanto à entrada de hóspedes e a proibição de hospedagem de crianças e adolescentes no seu estabelecimento.
A tentativa de transferência desse dever de cuidado ao seu funcionário, o que não encontra razão de ser, porque se este de alguma forma descumpriu ou inobservou tais deveres, ainda assim, persiste a responsabilidade do proprietário, que foi negligente na escolha de seu subordinado, bem como não vigiou adequadamente o desempenho das tarefas e atividades que lhe atribuiu ou delegou.
Nessa esteira, as alegações do apelante no sentido de é impossível o proprietário do estabelecimento hoteleiro permanecer 24 horas na portaria (sic, fl. 362), não lhe socorrem, porque ele mesmo refere:....por isso possui empregados (remunerados), estes capacitados para função, orientados e sob as ordens do empregador. Os quais, diga-se, o representado confia suas ordens e obediência (sic, fl. 362).
Nesse contexto, só se pode concluir que o empregado do recorrente - Anápio - agiu porque estava sob as ordens e orientação do apelante, de sorte que a responsabilidade em enfoque permanece na esfera dos deveres e obrigações deste.
Quanto ao mais, não há nos autos nenhuma demonstração da condição modesta do apelado (sic, fl. 367) a ponto de lhe ser reduzida a multa aplicada - 20 SM - , que foi fixada com razoabilidade, já que quem praticar a conduta prevista no art. 250 do ECA, terá aplicada multa de dez a cinqüenta salários de referência. (3)
Enfim, se acolhermos o argumento recursal, raros os proprietários de hotéis que serão responsabilizados, uma vez que, nas grandes cidades, ditos proprietários não atendem pessoalmente seus estabelecimentos. Assim, o proprietário joga a responsabilidade sobre o empregado (como é o caso) e este poderá alegar que agiu "coagido e cumprindo ordens do proprietário".
Como se vê dos argumentos que fundamentam a presente decisão não há falar em violação do artigo 250 do Estatuto da Criança e do Adolescente, tal como supõe a parte apelante, quando prequestiona tal dispositivo legal.
ANTE O EXPOSTO, nego provimento ao apelo.
Des. Claudir Fidélis Faccenda (REVISOR) - De acordo.
Des. José Ataídes Siqueira Trindade - De acordo.
DES. RUI PORTANOVA - Presidente - Apelação Cível nº 70022109987, Comarca de Porto Alegre: "NEGARAM PROVIMENTO. UNÂNIME."
Julgador(a) de 1º Grau: JOSE ANTONIO DALTOE CEZAR


Notas:
1 - LIBERATI, Wilson Donizeti. Comentários ao Estatuto da Criança e do Adolescente. 5ª ed. São Paulo : Malheiros, 1999, p. 241. [Voltar]
2 - Estatuto da Criança e do Adolescente Comentado : Comentários Jurídicos e sociais. Coordenador Munir Cury. 6. ed. São Paulo : Malheiros, 2003, p. 817. [Voltar]
3 - Art. 250. Hospedar criança ou adolescente, desacompanhado dos pais ou responsável ou sem autorização escrita destes, ou da autoridade judiciária, em hotel, pensão, motel ou congênere.
Pena - multa de dez a cinqüenta salários de referência; em caso de reincidência, a autoridade judiciária poderá determinar o fechamento do estabelecimento por até quinze dias.

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