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São Paulo, 08/03/2006 – O editorial “Novas ações para velhas diferenças” foi publicado na edição de hoje (08) do jornal Gazeta Mercantil:
São Paulo, 08/03/2006 – O editorial “Novas ações para velhas diferenças” foi publicado na edição de hoje (08) do jornal Gazeta Mercantil:
“As diferenças de gênero - seja no aspecto que for - diminuíram no Brasil nas últimas décadas. E, sem dúvida, a tendência é que desapareçam. Porém, uma dessas diferenças, a da remuneração pelo mesmo trabalho, tem demonstrado especial resistência. Essa discriminação ocorre até no setor público. O Estado brasileiro paga, como mostrou pesquisa do IBGE, a média de R$ 1.545 aos seus servidores estatutários, enquanto a média da remuneração das servidoras cai para R$ 1.108.
No setor privado, a diferença salarial de gênero se agrava com a escolaridade. O valor médio pago pela hora de trabalho do empregado com até 4 anos de escolaridade, é de R$ 2,60 para os homens e de R$ 2,10 para as mulheres, uma defasagem de 24%. No grupo com 12 anos de escolaridade cada hora vale R$ 16,40 para o trabalhador e R$ 10,10 para a trabalhadora. Com o ensino médio concluído, a diferença salarial entre homens e mulheres para o mesma função sobe para 62%.
O esforço na busca por maior escolaridade na mulher não significa mobilidade salarial ascendente. O estudo Trajetória da Mulher na Educação Brasileira, elaborado pela Secretaria Especial de Políticas para Mulheres e pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep), vinculado ao MEC, mostrou que no mercado formal de trabalho as mulheres têm de um a dois anos a mais de estudo que os homens, na mesma função, mas isso não se reflete nos salários, em média 30% menores. No ensino superior, a presença feminina é cada vez mais intensa. Em 1996, na clientela universitária, as alunas eram 8,7% mais que os rapazes. Em 2003 elas já eram 12,3% a mais. Nas regiões Sul e Sudeste, 66% dos estudantes de medicina são moças. A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) revelou que, dos 514 mil profissionais registrados em 2005, 223 mil deles eram mulheres, mas elas obtinham 27% a mais de aprovação que eles nos concursos da magistratura. Os números do Ministério do Trabalho mostram que em 2004 a escolaridade média do trabalhador brasileiro era de 5,1 anos, enquanto a da trabalhadora já era de 6,2 anos. Nenhuma dessas conquistas educacionais, porém, significou redução na discriminação salarial que prejudica as mulheres.
Este fato tem forte reflexo no perfil de consumo no Brasil. A participação feminina na indústria de cartões de crédito cresceu, por exemplo, bem acima da média de mercado no ano passado. O volume de compras das mulheres com cartão subiu no ano 29,8%, enquanto o faturamento do setor expandiu 27,1%. Porém, em dezembro, os 33 milhões de cartões na mão das mulheres (50% do mercado) representavam só 45% do faturamento. Nesse mês, enquanto o valor médio de compra das mulheres com cartão foi de R$ 8,1 o dos homens alcançou R$ 88.
O crescimento no uso do cartão de crédito pelas mulheres refletiu o aumento da participação da mulher na População Economicamente Ativa (PEA). Em 2004, quando o PIB aumentou 4,9%, a participação da mulher na PEA aumentou 6,7% e a dos homens, 5,1%. Ou seja, mesmo com a maior presença feminina nos cartões e com o maior ritmo de presença delas na PEA, a renda menor que a dos homens funciona como fator inibidor para a expansão de consumo.
A discriminação concreta contra a ascensão econômica da mulher ocorre pela exclusão na hierarquia do trabalho e não por qualquer barreira para sua participação nesse mercado. Essa última luta já foi vencida por elas. Pesquisa do Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (Ibase) mostrou que, entre 2000 e 2004, enquanto o número de mulheres empregadas no setor formal passou de 28% para 32,5%, o número de mulheres exercendo função de chefia ficou parado na faixa de 14%. Mais mulheres trabalhando não significou maior presença feminina nos postos de comando.
A perversa discriminação salarial de gênero nasce dessa estática relação de poder. Enquanto formas injustas de acesso ao poder perdurarem, os salários entre homens e mulheres serão diferentes para trabalhos iguais. É essa diferença que constrói as formas mais odiosas de discriminação contra a mulher”.
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